Por José Eduardo W. de A. Cavalcanti – Os primórdios do sistema de esgotos no Rio de Janeiro, segundo Saturnino de Britto

*José Eduardo W. de A. Cavalcanti

O opúsculo abaixo, creditado ao Engenheiro Saturnino de Britto discorrendo sobre o sistema de esgotos existente na então Capital Federal, foi transcrito da publicação “Os Esgotos do Rio de Janeiro”, memória apresentada pelo médico, Doutor Carlos de Campos para o 4º Congresso Médico Latino-Americano, realizado no Rio de Janeiro em 1909, no qual o autor discorreu sobre os projetos existentes para resolver os problemas dos esgotos do Rio de Janeiro que já àquela época já se revelava crônico.

Dizia, à época, o ilustre engenheiro, patrono da Engenharia Sanitária nacional (na grafia original):

“O primeiro acto do governo, relativo a esgotos do Rio de Janeiro, data de 1853. Em 1862 a Comissão passou à actual companhia inglesa The Rio de Janeiro City Improvements Company, Limited. N’esse mesmo anno se iniciaram os trabalhos, e actualmente os esgotos servem, pouco mais ou menos, 60 000 casas.

O contrato inicial estabeleceu que o systema de esgotos seria semelhante ao adoptado em Leicester e outras cidades inglesas.

Aplicou-se, então, o princípio de water –carriage, com o systema separativo incompleto (separate system); os collectores recebem as águas meteóricas dos telhados e das áreas calçadas ou não calçadas; as águas das ruas e uma parte da contribuição dos telhados são recolhidas por um outro systema de collectores e galerias diretamente dirigidas para a bahia.

Os trabalhos foram executados por districtos, cada um completamente independente dos outros; com sua rede própria, sua usina de elevação e seus tanks ou reservatórios de ferro batido, de precipitação chemica, antes do lançamento do efluente na bahia.V^-se, então, aqui, o systema radial de Berlim, mas o systema, no Rio, é o separativo e o lançamento se faz na mesma peripheria, em logar do systema unitário de Berlim e seu recalque para os campos de apuração.

A superfície total é dividida em oito districtos independentes. O VIII districto de Copacabana (1908) está ainda em execução e,adoptou-se o systema separado absoluto (absolutely separate system), com estações de lançamento seccional pela distribuição do ar comprimido (systema Chone).

O segundo systema comprehende duas usinas, uma, a do Mangue, interior e subsidiária a da Gamboa, situada no litoral. Esta sub-divisão seccional adotada ainda nos VII e VIII Districtos, deve ser generalizada para corrigir a insuficiência de declive ou resolver algumas dificuldades locaes.

Os ingredientes pra tratamento chimico são, pouco mais ou menos, por metro cúbico de sewage são : um litro de cal, uma gramma de sulfato duplo de alumínio e de ferro.
Depois deste tratamento, que de longe está para satisfazer as exigências sanitárias modernas, o efluente é lançado na bahia, continuamente, com uma descarga efluente exatamente igual à descarga affluente.

A media diária total de águas de esgotos lançada na bahia depois da precipitação, é de 129 100 metros cúbicos e o cubo aproximado das lamas (sludge), retiradas durante o ano de 1904 dos tanks atingiu a 18 980 metros cúbicos.

As galerias que se dirigem aos poços onde vêm actuar as bombas, se prolongam até a bahia por uma grande galeria, normalmente fechada por um penstock, que se não póde abrir sem quebrar o sello oficial.

Quando chove e que as bombas não podem elevar mais o efluente, abrem-se as bombas em plena secção: este lançamento na bahia, in natura, dura algumas vezes mais de um dia, e mesmo mais de dois dias”

(Fonte: Os Esgotos do Rio de Janeiro de Carlos Sampaio: “Memória apresentada no IV Congresso Médico Latino-americano realizado no Rio de Janeiro”- 1909)

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*José Eduardo W. de A. Cavalcanti

É engenheiro consultor, diretor do Departamento de Engenharia da Ambiental do Brasil, diretor da Divisão de Saneamento do Deinfra – Departamento de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), conselheiro do Instituto de Engenharia, e membro da Comissão Editorial da Revista Engenharia

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*Os artigos publicados com assinatura, não traduzem necessariamente a opinião do Instituto de Engenharia. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.