Uma parceria entre a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da Universidade de São Paulo (USP) de São Carlos, e a Embraer conseguiu reduzir em 20% o barulho emitido por aviões.
Estudando a origem do ruído e avaliando a estrutura dos aviões, os pesquisadores do Departamento de Engenharia Aeronáutica (SAA) da EESC chegaram a conclusão que as responsáveis pelo alto som são duas peças de sustentação da asa: os slates – abas móveis que ajudam a sustentar o avião – e o flap, na parte de trás que também auxilia na sustentação da aeronave, principalmente nas etapas de decolagem e aterrissagem.
“A forma como o ar passa por esses componentes acaba provocando o ruído”, disse o pesquisador João Paulo Eguea.
Os pesquisadores então fizeram algumas adaptações nas peças. Para isso usaram o protótipo de uma asa do jato E195-E2, o maior já desenvolvido pela Embraer no Brasil, que foi montada no laboratório da universidade.
Nos ensaios, foram feitas alterações no modelo da asa original para que, no momento em que o flap é acionado, uma espécie de borda perfurada fique exposta, resultando na redução de seis decibéis do ruído gerado.
Também foram propostas modificações na geometria dos slates, mudando levemente o formato de uma das peças.
“Essas modificações mudam a geometria dos componentes de forma a mudar o padrão que o ar passava e gerava o ruído”, explicou Eguea.
As mudanças baratas e de fácil aplicação fizeram com que a aeronave passasse pelos testes aeroacústicos com 10 decibéis abaixo do limite permitido.
Segundo os pesquisadores, as adaptações podem ser implementadas tanto em aviões que já estão em operação como em projetos de novas aeronaves que serão fabricadas.
Testes
Para comprovar a redução de ruídos, os pesquisadores da USP fizeram uma série de testes no Túnel de Vento do Laboratório de Aerodinâmica da EESC e na pista de pouso da Eembraer, em Gavião Peixto (SP).
O Túnel conta com ventiladores que produzem ventos de até 180 km/h e microfones ultra sensíveis que apontam qual a origem do barulho.
“Colocamos as peças dos aviões na câmara de ensaio e fizemos várias alterações até encontrarmos a geometria ideal para as asas”, explica o professor e coordenador do estudo, Fernando Catalano.
Outros testes ainda foram realizados por alunos da USP e técnicos da Embraer na Nasa, que também trabalha para diminuir o ruído dos veículos aéreos. Além disso, ensaios em túneis de vento de grande porte na Holanda e Alemanha foram realizados para a consolidação das propostas.
Os estudos do projeto, que foi criado em 2010 e está sendo concluído neste ano, foram financiados pela Embraer, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Os resultados obtidos no trabalho geraram três patentes internacionais.
Por que reduzir o barulho?
Apesar das aeronaves terem se tornado mais silenciosas com o passar dos anos, o barulho provocado, sobretudo durante as decolagens e pousos incomodam milhões de pessoas que moram ao redor de aeroportos.
De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o ruído excessivo pode provocar problemas de saúde, como o aumento dos batimentos cardíacos e pressão sanguínea, desencadeando complicações cardiovasculares. A perturbação do sono também é outro agravante, que pode aumentar as chances do aparecimento de distúrbios de saúde mental, como depressão e ansiedade. Até mesmo o desenvolvimento cognitivo de crianças pode ser comprometido.
Catalano explica que as principais fontes de ruído são o atrito da aeronave com o ar pelas asas e o trem de pouso, já que com o avanço da tecnologia os motores se tornaram mais silenciosos.
“Os ruídos provocados pela estrutura da aeronave ficaram em evidência. Durante o voo, o ruído é mais emitido no momento da decolagem e do pouso. É aquele barulho que a gente ouve quando o avião está se aproximando, principalmente no momento da descida”, descreve.
As aeronaves precisam atender a diversos critérios de segurança, dentre eles, a emissão de ruídos. Ao redor dos aeroportos existe uma área de controle de intensidade do som e, neste perímetro, as empresas responsáveis por aeronaves que ultrapassam o limite permitido de 60 decibéis podem ser penalizadas.
De acordo com o professor da USP, as soluções nessa área avançaram muito com base nas pesquisas realizadas em São Carlos e, são consideradas prioritárias. “O Brasil se tornou referência no assunto e espero que os engenheiros aeronáuticos possam estar cada vez mais preocupados com a acústica dos aviões”, afirma Catalano.