O governo federal estuda a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incide sobre os veículos elétricos dos atuais 25% para 7,5%, a mesma alíquota dos veículos flex, conforme declarações aos jornais do Ministro Fernando Coelho Filho das Minas e Energia. A notícia é muito boa porque nunca ocorreu qualquer iniciativa governamental significativa para incrementar os veículos elétricos, ou melhor, veículos cuja emissão de poluentes é zero. A poluição do ar nas cidades brasileiras de hoje é resultante, principalmente, da queima de combustíveis fósseis, sendo mais de 80 % das emissões produzidas pelo sistema de transporte.
O incentivo fiscal é importante, mas não basta. Muitas outras ações são necessárias para impulsionar o uso de veículos elétricos. Uma medida complementar seria o governo fomentar a produção de baterias mais baratas e que garantam maior autonomia aos veículos elétricos, assim como estimular a criação de pontos de recarga ao longo das cidades e até em estradas. Se as medidas estimularem o crescimento súbito do consumo de energia, o governo precisaria inovar em produção e distribuição de energia para não sofrer impacto de demanda no setor elétrico. Uma opção em outros países – por exemplo, no Japão – seria difundir a instalação de placas captadoras de energia solar para carregar as baterias. Se houvesse um excedente de energia, ele poderia até ser vendido para a rede de distribuição. No Brasil já existe legislação, regulamentando essa atividade. O proprietário de veículo elétrico poderia carregar seu carro em casa, ou no local do seu negócio, com energia solar e, ainda, vender o excedente produzido pelo seu carregador.
A redução de imposto, complementada pelos avanços tecnológicos, no abastecimento do veículo elétrico, são importantes para crescimento da frota de veículos elétricos, mas não são suficientes para a melhoria da qualidade do ar das cidades. Precisamos de ações mais amplas sobre toda a frota a combustão que opera tanto no sistema de transporte quanto no âmbito da gestão das cidades, tais como: programas de substituição das frotas de ônibus e de táxis por veículos elétricos, ou ainda, englobar as frotas de prestadores de serviços públicos que circulam pelas ruas. Na cidade de São Paulo, poderiam ser utilizados veículos zero emissão por entidades prestadores de serviços, como: Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), SPTrans, Sabesp, Eletropaulo, Congas, Corpo de Bombeiros, Ambulâncias, Polícia Militar e Civil, Empresas de Telefonia, Empresas de Seguro Veicular, Correios, transportadoras de cargas, veículos escolares fiscalização e vários outros. E muito mais, as empresas de Car-sharing, ou ainda o transporte por aplicativo, que só em São Paulo conta com mais de 50 mil veículos, deveriam aderir ao sistema elétrico.
Uma ação benéfica para intensificar os veículos elétricos seria a reativação de programas já iniciados em nosso país e que não tiveram continuidade pelas administrações que se sucederam. Há alguns anos, mais precisamente em junho de 2012, a Prefeitura de São Paulo foi a primeira cidade das Américas a implantar um programa com dez unidades de táxis elétricos, complementado por outros 116 táxis híbridos. Na época, ainda foram noticiadas as instalações dos postos de recarga lenta (e rápida) em revendedoras de automóveis e nas frotas de táxis e até em estacionamento de shoppings centers. Embora o número desses táxis com energia limpa seja insignificante, em face da frota de táxis que supera 35 mil veículos, seriam importantes como semente.
Excluindo o transporte coletivo sobre trilhos, poucos avanços ocorreram em termos de energia limpa. Em São Paulo, houve um esforço do legislativo através da Lei de Mudanças Climáticas de 2009 que determinava que a frota de transporte coletivo utilizasse apenas energias não fósseis, até 2018. Porém, a poucos meses de expirar o prazo legal, os resultados do Programa Ecofrota – criado para atender as metas da lei das mudanças climáticas – estão muito distantes de serem alcançados. Acho até que o programa foi desativado. E pior: foi apresentado um projeto na Câmara Municipal de São Paulo que empurra as medidas de redução de combustível fóssil para 2037 e, ainda assim, com uma substituição apenas parcial: 7.125 ônibus com biodiesel B100 e 1.500 elétricos, numa frota atual de 14.700 veículos. Mas, as notícias estão um pouco contraditórias. A Secretaria da Mobilidade e Transportes (SMT) de São Paulo estuda uma alternativa para a nova licitação do sistema de transporte coletivo que inclui metas claras para a adoção de energias renováveis na frota.
A realidade é que os transportes eletrificados tiveram avanços insignificantes em nosso país e quase todas as redes de tróleibus do país foram extintas. A rede de trólebus da cidade de São Paulo, inserida no programa EcoFrota da SPTrans, foi renovada há seis anos, mas conta com apenas 203 unidades em circulação, frente a uma frota com mais de 14 mil ônibus a diesel. Há, ainda, dois ônibus híbridos (diesel/energia elétrica) em teste. No município de São Bernardo do Campo, existe um corredor de tróleibus que acrescenta uma inovação: testes com três ônibus a hidrogênio. Já em Campinas, há 12 ônibus elétricos em circulação e a intenção é chegar a uma frota de 150, após a instalação de uma montadora de veículos elétricos na cidade. Em Curitiba, foi apresentado um modelo inédito de ônibus elétrico híbrido “plug-in”, ou seja, permite a recarga de bateria em pontos de embarque e desembarque de passageiros. Outras iniciativas estão em andamento em cidades brasileiras, mas carecem de um volume expressivo que cause impacto nas emissões, mais do que o da simples inovação.
O principal argumento que serve de obstáculo para o uso dos veículos elétricos é a baixa autonomia de carga da bateria, que gira em torno de 80 a 120 quilômetros. Isso, porém, já foi superado. Mais recentemente, baterias de íons de lítio e de ferro-lítio já alcançam 240 km de autonomia por dia. Além dessa limitação, muitos apontam o alto custo de aquisição dos modelos elétricos como empecilho à adoção do sistema. Realmente, o preço de um elétrico é pelo menos o dobro do a diesel, ou mais. Contudo, a vida útil de um trólebus ou do ônibus elétrico a bateria é de 30 a 40 anos. Já os veículos a combustão, além de poluir mais, têm vida útil de cerca de 8 a 10 anos. Com o aumento da produção, com certeza, haverá uma redução nos valores. É a lei de mercado.
Contornando tecnologicamente os empecilhos relativos à autonomia das baterias, já existem em operação modelos de ônibus, que usam baterias recarregáveis ao longo do percurso, ou supercapacitores, em que o veículo recebe a energia por contato ou indução magnética. Os carregadores ao longo do percurso recarregam em 15 a 20 segundos, quando o veículo estaciona ou durante embarque e desembarque de passageiros. Os trólebus modernos, os ônibus elétricos a bateria, os híbridos e o modelo de indução magnética, ou melhor, todos os elétricos, tanto automóveis quanto ônibus, usam a frenagem ao mesmo tempo para produzir energia. Existe muita evolução teconológica.
O número de veículos elétricos aumenta a cada ano no mundo devido às contínuas inovações dos modelos e ao empenho dos fabricantes no desenvolvimento das infraestruturas de recarga. Além dos usuários estarem satisfeitos, os incentivos governamentais são fatores que motivam o crescimento da produção mundial. Faltam incentivos no Brasil, enquanto o uso desse tipo de sistema vem crescendo no mundo inteiro – França, EUA, Japão e China, especialmente. Nesse contexto, a iniciativa inovadora do Ministro de Minas e Energia, que até se propõe a utilizar um veículo elétrico (Renault – preto) como carro oficial e instalou um eletroposto para recarregá-lo em frente ao prédio do ministério, merece apoio e precisa ter continuidade.
Está mais do que na hora do governo brasileiro adotar políticas que enxerguem os benefícios para a população com a redução da poluição do ar em nossas cidades.
*Por Ivan Metran Whately – Engenheiro especializado em planejamento de transporte e Diretor do Departamento de Mobilidade e Logística do Instituto de Engenharia.
Autor: * site ANTP