A era do fazer

Apesar de no calendário indicar que estamos em plena primavera, o céu, com tonalidades lusco-fusco e cara de chuva, nos remetia a uma daquelas manhãs modorrentas de outono. Apesar disso, o domingo (11/12) guardava surpresas bastante agradáveis, e nada convencionais, para quem deu um pulo na última edição do ano da Maker Fest Brasil, realizada no Instituto de Engenharia, no bairro do Ibirapuera na Zona Sudoeste de São Paulo.

O evento promovido pelo Engenho Maker, espaço de coworking e co-criação, reuniu empreendedores com perfil bastante eclético, muitos curiosos e gente disposta apenas a socializar. Na área externa era possível curtir um jazz de primeira qualidade ou então degustar um sanduíche ou outro acepipe regado a cervejas artesanais de diversas marcas. Dentro do galpão, feito de lona, rolava muita interação entre os makers e os convidados, inclusive inúmeras crianças.

“É neste momento que aproveitamos para testar a aceitação de produtos”, conta Renato Prado, sócio e idealizador do espaço colaborativo inaugurado em julho. “O processo de validação acontece num cenário de utilização efetiva”.

E isso vale desde itens prosaicos como um equipamento para a produção de churros até produtos para jardinagem, passando por mesas e bancos de madeira feitos para crianças, além de bolos e tortas servidos no pequeno café. Mas, peraí, cadê a tecnologia. Bem, ela está presente em todo as etapas, mas fica claro que a parte mais importante no processo são as pessoas.

Apesar de ser graduado em engenharia, Prado aposta num segmento maker mais ligado à corrente que valoriza a produção artesanal e a reciclagem, como elementos que viabilizam a produção de peças únicas. “A tecnologia massifica”, critica.

É neste contexto que surge a Easy Bike concebida pelo publicitário Wanderley Balsalobre. A magrela, ainda em fase de ajustes, chama a atenção de todos com seu quadro feito de madeira e o design que faz com que o ciclista fique de pé. “A ideia nasceu a partir de uma foto enviada por um amigo publicitário”, explica.

E por falar em madeira, foi na marcenaria do Engenho Maker que nasceu a linha de móveis infantis da grife Jasmim Manga. As peças são assinadas pela design Paula Prado. O acesso a um espaço maker deu-lhe a possibilidade de atuar no desenvolvimento de produtos, nicho que ela enxerga como sendo sua verdadeira vocação. “Tinha algumas ideias em mente, mas não sabia muito bem o que fazer, tampouco dispunha das ferramentas”, conta.

Os nerds também estavam por lá. Nenhum deles vestido de personagem de mangá ou de herói de série de TV. Mas nem por isso deixavam de chamar a atenção. Especialmente o grupo liderado por Wellington Rodrigues, estudante de sistemas de informação na FIAP e sócio da Lightning Wasp 3D. Com sua coleção de drones, que sobrevoavam as mesas fazendo acrobacias e enviando as imagens para um telão, Nagato, como ele é mais conhecido, chamava a atenção da galera.

Pois é graças as máquinas de corte, as fresadoras e as impressoras 3D que todas estas inciativas saíram do campo da ideação para se tornar realidade. Mesmo sendo um entusiasta da tecnologia, Prado valoriza a intuição. “Gosto do método crazy dog (cachorro louco) de fazer as coisas, no qual vamos aprendendo ao longo do processo de produção”, destaca. Foi neste contexto que nasceram, em apenas três dias, a cafeteria Engenho Baker e um balcão para produção e venda de churros.

“Entre a ideia, a construção do mobiliário, a concepção do logotipo e o teste para validação das receitas precisamos de apenas três dias”, conta. O mesmo esquema crazy dog tem se mostrado acertado em objetos, digamos, mais prosaicos, como o balcão usado pelo projetista e empreendedor de gastronomia Fernando Veronesi, sócio do food truck Verona´s Grill. “Percebi que a venda de sobremesa poderia acrescentar valor ao meu negócio, mas não sabia como fazê-lo”, diz. “O carrinho de churros resolveu o problema.”

Apesar do sucesso obtido com o modelo de negócios, Prado enxerga um futuro ainda mais brilhante para o imenso jardim do Instituto de Engenharia. Hoje, o Engenho Maker funciona como um espaço de coworking no qual profissionais e estudantes de diversas áreas podem alugar uma das 40 estações de trabalho, pagando por hora ou por mês. Os valores variam de R$ 100, por hora, a R$ 500, para planos mensais, e inclui a utilização dos equipamentos.

PARQUE TECNOLÓGICO

O empreendedor diz que ele e os três sócios (José Michel, Juliana Glasser e Renato Valle) investiram muito mais suor do que dinheiro para tirar a ideia do papel. Todos são crias da cultura maker. Michel, graduado em engenharia, estava pensando em montar um Maker Space com a Juliana, especialista em programação. Para isso, ele viajou para os Estados Unidos para conhecer as experiências e os modelos existentes por lá.

“Boa parte das máquinas que você vê aqui estavam em nossas garagens. Outras, foram doadas por empresas ou cedidas por empréstimo”, explica Prado, porta-voz da turma e responsável pela parceria com o Instituto de Engenharia, assinada em novembro de 2015.

O próximo passo do quarteto será ainda mais ambicioso: transformar o local num moderno e acolhedor Parque Tecnológico. Para acelerar a ideia e torná-la mais factível, as empresas atuariam dentro de contêineres espalhados pelo gramado, numa atmosfera bastante inspiradora e propicia à inovação. Mas nada disso deve ser implantado no curto prazo. “Ainda estamos na fase de desenvolvimento do conceito e da definição dos equipamentos”, justifica o empreendedor.

Apesar do pouco tempo de atividade, a Engenho Maker já tem muitas história para contar: integrou o circuito da SP TechWeek e abrigou uma startup que conseguiu vender uma estação meteorológica para uma vinícola do Vale do Sonoma, na Califórnia. “A cultura maker é o que vai movimentar a economia global daqui para a frente”, aposta o otimista Prado.

Autor: Papo Reto