Com inauguração prevista para novembro de 2015, o Museu do Amanhã faz parte, hoje, do Programa Porto Maravilha, projeto da Prefeitura do Rio de Janeiro de revitalização da região portuária. Mas não foi sempre assim. O projeto inicial do Museu já estava sendo traçado pela equipe da Fundação Roberto Marinho, e seria implantado em dois galpões próximos à área.
Em 2009, o Museu do Amanhã foi incorporado ao projeto de revitalização. Com isso, foi realocado para um ponto privilegiado: um píer cercado de água em frente à Praça Mauá, revitalizada e inaugurada no último mês de setembro, próximo ao Museu de Arte do Rio – MAR (inaugurado em 2013), e em uma paisagem livre do elevado da perimetral, demolido definitivamente em 2014.
“Com a derrubada da perimetral, possibilitamos uma visibilidade que já existia, mas estava velada. Ressignificou o olhar do carioca”, defende Lucia Basto, gerente geral da área de Patrimônio e Cultura da Fundação Roberto Marinho. Essa visibilidade da região foi um valor apropriado por todos os projetos do programa de revitalização, inclusive o Museu. “A Igreja e o Mosteiro de São Bento, tombados pelo Iphan, estavam cobertos pela perimetral por todos esses anos. Para não prejudicar sua visibilidade, a altura do Museu do Amanhã foi limitada”, explica.
Porém, a limitação em altura não foi uma restrição. Como o terreno não era confinado, e sim lançado sobre a água, trouxe muitas possibilidades arquitetônicas, exploradas pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, autor do projeto. “Permitiu desenvolver as quatro fachadas, além da cobertura, que é uma quinta fachada”, acrescenta Lucia. Calatrava se inspirou nas bromélias, plantas nativas da Mata Atlântica que ele conheceu no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, para conceituar o partido arquitetônico.
RESUMO DA OBRA
Museu do Amanhã
Área total: 33.000,77 m2
Área construída: 18.240,95 m2
Funcionários: 1.200 no pico das obras (diurno e noturno)
Espelho d'água: 9.200 m2
Tamanho da estrutura: 338,34 m de comprimento e 20,85 m de altura
Peso da cobertura metálica: 3.810 t
Placas fotovoltaicas: 5.492
As asas metálicas na cobertura são móveis, e a própria cobertura flui sobre a estrutura, criando dois balanços, um de 65 m outro de 70 m, que sombreiam a edificação.
Além da equipe do arquiteto espanhol, o escritório brasileiro Ruy Rezende Arquitetura participou detalhando e gerenciando o projeto. Ainda há mais 33 escritórios realizando assessoria e projetos complementares, e outros 20 escritórios desenvolvendo a museografia. “São muitas disciplinas, é um museu muito tecnológico, com automação que tem que funcionar perfeitamente. A compatibilização foi complexa, e por isso o projeto foi desenvolvido em BIM”, conta Fabíola Amaral, arquiteta da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP), que supervisiona as obras.
A arquiteta conta que mesmo luminárias embutidas no concreto precisaram ser detalhadas com precisão. “Não podia errar, porque não poderia quebrar o concreto”.
Para a estrutura da edificação, foram usadas fôrmas específicas, encomendadas sob medida. “Cada fôrma tem um desenho diferente, com os recortes para instalação de luminárias, e com formatos específicos”, diz Fabíola.
Arrojo metálico
Com comprimento superior a 330m, o formato da cobertura é Wl1 desafio técnico, principalmente os balanços do lado mar e lado terra, de 65 m e 70 m. “São ancorados em somente dois pontos fixos, enquanto todos os demais apoios são móveis”, explica Flavio D'Alambert, da Alpha Engenharia.
A estrutura foi testada no laboratório de vento do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT). “Foram 300 tomadas de pressão. Sabemos que, nos pontos no meio da edificação, o valor de carga positiva não muda; os pontos críticos são nas quinas, por conta das altas sucções”, explica Gilder Nader, responsável pelo túnel de vento do IPT.
Para executar esses grandes balanços e grandes vãos com poucos apoios, além dos elementos mecânicos incorporados, a especificação do material se voltou ao aço. “São 1,2 mil t de partes móveis girando durante o dia, conforme a orientação solar”, explica André Pestana, da Martifer, responsável pela fabricação e montagem da cobertura e caixilhos.
A empresa montou duas fábricas, uma em cada cabeceira da obra, para montar as peças, que tinham mais de 20 m, e compor os módulos, alguns com mais de 100 t cada. Um pórtico corria de ponta a ponta, distribuindo os módulos montados, e, uma vez posicionados, eram realizadas as soldagens de conexão.
As peças são todas únicas, e cada uma desenvolvida para aquela determinada posição de montagem. Mas pode-se falar em tipos de peças, e, nessa obra, foram adota- dos três tipos principais: os banzos, estruturas principais que traçam as linhas retas da obra; os painéis de chapas reforçadas; e as aletas, estruturas de seção variada, feitas a partir de perfis de chapa.
“Na cobertura há dois tipos de painéis. Os cônicos, que têm uma curvatura em uma direção, e os com dupla curvatura”, conta Pestana. Para as laterais, foram projetadas treliças inclinadas com altura variável. “Para um melhor resultado estrutural, trabalhou-se com perfis de aço tipo caixa com dimensões de 1 m x 1 m até 1 m x 1,5 m”, conta D' Alambert.
Projeto de arquitetura, museografia e conteúdo foram trabalhados em uma intensa compatibilização. Desenvolvido em BIM, o projeto especificou fôrmas únicas para a estrutura de concreto.
“Tentou-se desenvolver a estrutura mais padronizada e seriada possível, porém, devido às exigências inerentes do formato e do comportamento estrutural, houve a necessidade de muitos enrijecimentos localizados”, conta D'Alambert. Como as peças do tipo caixa podem sofrer flambagem devido à grande dimensão, foram soldadas chapas internas para o enrijecimento.
“Uma estrutura com mais de 300 m, formada por um monobloco treliçado, tem ligações principais desenvolvidas para serem soldadas”, explica o diretor da Alpha. Essa exigência demandou um rígido controle da execução das soldas, com teste de líquido penetrante nas soldas de filete e ultrassom nas soldas de penetração total.
Um ponto que exigiu extremo cuidado na obra, e que foi planejado desde o projeto, foi o descimbramento da estrutura metálica. “A estrutura é fabricada com uma contraflecha, para que, depois do descimbramento, o formato do museu tenha as linhas retas desde o ponto único onde ficam apoiadas”, explica Pestana.
Há, na cobertura do Museu, 5.492 unidades de painéis de células fotovoltaicas divididos em 24 módulos, que produzem 247,9 MWh/ano. Os painéis ficam sobre as 1.380 aletas, que têm de 2 m a 24 m de comprimento.
A estrutura principal é o veio da cobertura, que contém 48 asas, 24 na fachada e 24 na cobertura. Cada asa tem de 20 a 30 aletas, que carregam em sua face superior os painéis fotovoltaicos. “Nesse veio é montado o sistema de macacos hidráulicos, cerca de 200, que fazem girar por W11 sistema mecânico e elétricoautomatizado”, explica Pestana. As aletas giram em torno de dois eixos para acompanhar o posicionamento do sol, para otimizar a captação.
Para permitir menor absorção do calor, a estrutura metálica foi pintada de branco. “Com o revestimento térmico, seu desempenho se compara ao já consagrado uso de telhas de aço em grandes coberturas”, afirma Flavio D'Alambert.
O Museu também terá sistemas para redução do consumo de água. A água da chuva será aproveitada para irrigação e descarga nos vasos sanitários. A água do mar, que tem temperatura baixa, também será aproveitada no sistema de ar-condicionado. Ela passará por tratamento: utilização, depois segue para W11a cascata na área do Museu. A cascata auxilia no rebaixamento da temperatura, para a água voltar ao mar na temperatura original, além de limpa.
FICHA TÉCNICA
Arquitetura: Santiago Calatrava (concepção), Ruy Rezende Arquitetura (desenvolvimento do projeto de arquitetura e gerenciamento);
Detalhamento e projeto BIM: Fernandes Arquitetos Associados;
Construção: Consórcio Porto Novo;
Estrutura metálica: Projeto Alpha; Martifer (fabricação e montagem);
Estrutura de concreto: Engeti;
Manutenção de fachada: PB;
Consultoria de sustentabilidade Leed: Casa do Futuro;
Autor: CBCA