Asteroides, ataques de robôs e pandemias virais: esses são apenas alguns dos possíveis fatores que poderiam acabar com a humanidade. A maioria de nós prefere não pensar muito sobre o fim dos tempos, mas para a equipe do Instituto Global de Risco Catastrófico, o apocalipse é só mais um dia de trabalho.
Falamos com o diretor do Instituto Global de Risco Catastrófico, Seth Baum, e com o pesquisador Dave Denkenberger para descobrir como a humanidade poderá desaparecer. Nós também falamos sobre o que pode ser feito para impedir o apocalipse. Abaixo, segue uma versão resumida e levemente adaptada da nossa entrevista.
Gizmodo: O que seriam esses “riscos catastróficos”, e como o Instituto Global de Risco Catastrófico os avalia?
Baum: Em poucas palavras, um risco catastrófico é algo que poderia destruir permanentemente a civilização humana. Muitos desses riscos são coisas óbvias, como supervulcões, asteroides, guerras nucleares, certas biotecnologias ou o aquecimento global.
Para ser um pouco mais específico, meu interesse é saber se a civilização humana poderia sobreviver ao fim do planeta Terra. Em alguns bilhões de anos, nosso Sol irá ficar tão quente que a Terra não será mais um lugar propício à vida. Eu me interesso especialmente por catástrofes que podem impedir que os humanos saiam da Terra antes que isso aconteça.
No Instituto Global de Risco Catastrófico, nossa missão é compreender os riscos à sobrevivência humana e ajudar a humanidade a fazer escolhas adequadas frente a essas ameaças. Nós usamos uma abordagem de pesquisa baseada na análise de riscos, o que significa que nós analisamos a probabilidade de diferentes cenários catastróficos e a severidade de seus impactos. Em seguida, nós usamos essas informações para identificar as melhores formas de minimizar esses riscos.
Muitos de nós possuem formação em engenharia, incluindo eu e Dave, e também Tony Barrett, que me ajudou a fundar o Instituto há alguns anos. Nossa formação em engenharia nos ensinou a analisar todos os detalhes técnicos de cada risco catastrófico. Isso faz parte do nosso trabalho.
Vivemos em uma sociedade obcecada com o apocalipse. Você acha que isso indica um aumento real nas chances de aniquilação da raça humana?
Denkenberger: O que importa é que quando não tínhamos tecnologia, só existiam os riscos naturais: coisas como asteroides, supervulcões e pandemias. Mas agora que vivemos em uma civilização tecnológica, existem uma série de novos riscos, como a guerra nuclear e a manufatura molecular. Se criássemos, digamos, um monte de robôs minúsculos que podem se replicar, poderíamos perder o controle e sofrer grandes danos. Nós não tínhamos essa ameaça há dez mil anos.
Outra observação importante é que nossa sociedade é muito mais integrada do que costumava ser. Um exemplo é o comércio global. De certa forma, isso nos torna mais resilientes, porque uma catástrofe local com uma seca não tem, necessariamente, consequências graves, já que podemos mandar comida de outro lugar.
Mas essa integração também pode ser uma desvantagem. As viagens internacionais nos deixam mais suscetíveis a uma pandemia global. De certa forma, somos mais resistentes a desastres locais, mas estamos mais vulneráveis a desastres globais.
Baum: Gostaria de acrescentar um ponto: conforme nossa civilização se torna mais moderna, urbana e especializada, nós temos cada vez menos pessoas capazes de se sustentarem sozinhas. Poucas pessoas sabem plantar, e poucas sabem como limpar água ou construir máquinas — conhecimentos básicos que são necessários na ausência de uma civilização moderna e funcional.
Mas hoje nós temos os preppers, os adeptos do movimento sobrevivencialista. Muitos pensam que esses preppers são loucos, mas eu fico feliz por eles existirem. Fico feliz por existirem pessoas que estão aprendendo a cultivar, pessoas que querem sobreviver da terra. Essas habilidades podem não ser úteis em todos os cenários catastróficos, mas eu sinto que a humanidade é mais resiliente graças a eles.
Na sua opinião, qual é a maior ameaça à humanidade?
Baum: Isso depende de qual período nós estamos falando. No próximo ano, eu diria que o primeiro item da lista é, de longe, a guerra nuclear — a crise na Ucrânia pode piorar, por exemplo — ou uma epidemia. Essas são as coisas que poderiam acabar com a humanidade no espaço de um ano. Se estivermos falando de 20, 30, 40 anos no futuro, os cenários que envolvem novos tipos de tecnologia são mais prováveis.
Denkenberger: Eu concordo. Eu também incluiria outros riscos ainda não citados, incluindo coisas que poderiam causar uma queda de 10% na produção agrícola, como uma erupção vulcânica do tamanho da erupção de 1815, que resultou num ano sem verão; mudanças climáticas abruptas e falhas de abastecimento simultâneas em vários países. Uma queda de 10% pode não parecer tão ruim, mas o preço da comida aumentaria drasticamente e bilhões de pessoas passariam fome. Isso poderia gerar pânico e conflitos, o que poderia dar início a uma guerra nuclear. Algumas catástrofes de porte médio poderiam desencadear crises muito maiores.
Uma grave mudança climática parece ser um risco maior do que um asteroide gigantesco; mas este teria repercussões enormes, imediatas e devastadoras. Em qual desses riscos devemos nos focar?
Baum: Um ponto que eu gostaria de levantar é que nós não precisamos escolher. Muitas medidas específicas que nos protegem de um risco podem também nos proteger de outros. O trabalho de Dave sobre a proteção contra catástrofes alimentícias é um ótimo exemplo. Nós seguiríamos os mesmos passos para solucionar a crise alimentícia decorrente de uma erupção vulcânica ou de um impacto de asteroide, por exemplo.
Dave, você pode nos falar um pouco mais sobre sua pesquisa?
Denkenberger: O foco original do meu trabalho era analisar as catástrofes que poderiam bloquear a luz do sol e destruir a agricultura convencional. Nós só temos alguns meses de estoque de comida global, o que significa que a maioria das pessoas morreria e a humanidade entraria em extinção. Eu estava lendo um artigo científico sobre como os fungos dominaram o planeta após uma extinção em massa. O artigo concluía que, quando os humanos entrarem em extinção, talvez o mundo seja dominado mais uma vez pelos cogumelos. Enquanto eu lia isso, só conseguia pensar “espera aí, e se nós comermos cogumelos para sobreviver?”
Aí eu pensei, como poderíamos conseguir comida sem luz? Nós precisaríamos de coisas que crescem rápido e se alimentam de fontes de energia das quais nós não podemos nos alimentar. Cogumelos que digerem madeira são uma das possíveis respostas. Também existem bactérias que se alimentam de gás natural. Eu descobri que existe uma empresa que usa gás natural como fonte de energia para certas bactérias, que em seguida são transformadas em ração de peixe.
Durante minha pesquisa, escrevi um livro chamado Feeding Everyone No Matter What. Eu e um colega fizemos alguns cálculos, e nós acreditamos que é possível estabelecer essas fontes de comida alternativas em apenas um ano, isso se todos os países colaborarem. Essas medidas não custariam muito dinheiro, especialmente se nós reutilizarmos equipamentos já existentes, como alguns países fizeram durante a Segunda Guerra Mundial. [Nota do editor: Durante a Segunda Guerra Mundial, as empresas automobilísticas se uniram às forças militares para produzir peças de aviões, ajudando os EUA a produzir centenas de milhares de aviões em apenas alguns anos.]
Também vale mencionar que, se bilhões de pessoas estivessem passando fome, nós não ligaríamos para a preservação de outras espécies. Estimo que, para preservar 100 espécimes de todas as 5.000 espécies de mamíferos, seria necessário um milésimo da comida necessária para alimentar todos os 7 bilhões de humanos. Se nós podemos alimentar humanos, nós também podemos proteger a biodiversidade.
Se você tivesse a atenção do Congresso americano, o que você pediria?
Denkenberger: Eu pediria dinheiro para planejar, pesquisar e desenvolver alimentos alternativos. Na verdade, se nós tivéssemos uma verba de US$ 100 milhões, talvez o envolvimento do Congresso não fosse necessário. Eu planejo pesquisar o quão eficiente essa medida seria, e também avaliar a sua urgência. A cada dia, o risco de extinção aumenta.
Baum: Eu evitaria pensar nisso em termos de uma solução mágica que pode resolver tudo. Se eu tivesse a atenção do Congresso, eu promoveria um esforço mais amplo para avaliar todos os aspectos desses riscos. Nós podemos fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo!
Por exemplo, nós temos certeza de que o risco de asteroides é um pouco menor do que o risco de, digamos, uma guerra. Mas ao mesmo tempo, quando se trabalha na NASA, descobrir como impedir que um asteroide atinja a Terra é uma ótima forma de gastar seu tempo. Creio que o ideal seria ter uma rede de programas tomando conta de tudo que precisa ser feito de forma coordenada, para que não dupliquemos nossos esforços.
Pensar na destruição da humanidade todos os dias deixa vocês meio deprimidos?
Denkenberger: Os otimistas tendem a ignorar os riscos. Os pessimistas tendem a levar esses riscos a sério demais, e por isso deixam de pensar nas possíveis soluções. Os dois lados são contraproducentes. Eu diria que estou mais para um otimista: embora eu leve os riscos a sério, acredito que nós podemos nos prevenir.
Baum: Sim, tenho momentos em que sinto exatamente isso que você descreveu. Mas no dia a dia, esse é só um trabalho, e você acaba se acostumando. Uma boa comparação são os médicos. Eles passam por situações de vida e morte todos os dias, e muitas dessas situações são muito mais exaustivas emocionalmente do que as análises que fazemos em nossos computadores. Mesmo assim, eles são capazes de se distanciar emocionalmente de tudo aquilo. Se você não fizer isso, você simplesmente se esgota. Além disso, este é um trabalho muito fascinante.
Autor: GizModo