Diante do esgotamento dos parcos mananciais próximos à Região Metropolitana de São Paulo, que aliás enfrenta atualmente uma crise sem precedentes de abastecimento de água, a solução natural adotada tem sido sistematicamente a busca por outras fontes de suprimento de água cada vez mais distantes das bacias do Alto Tietê que agregassem quantidade e qualidade de água requerendo para tanto vultosos recursos e obras complexas de engenharia para a sua efetivação.
Exemplo disso foi a implantação do sistema Cantareira, fruto da visão estratégica de eminentes sanitaristas, que vem proporcionado nos últimos 40 anos o aporte de quase 50% do suprimento total de água para uma região carente deste recurso que abriga mais de 20 milhões de habitantes.
Outro exemplo foi o início das obras para a transposição de água do rio Juquiá situado a mais de 100 km da zona oeste da Capital que trará a partir de 2018 pouco mais que os modestos 15% da água fornecida pelo Cantareira (poderia ter sido mais) o que desde já é considerado insuficiente para a demanda requerida pela RMSP.
É flagrante pois a vulnerabilidade que cerca a RMSP em termos de abastecimento de água, pois antes mesmo desta estiagem que nos assola, oferta e demanda praticamente se equivaliam e as soluções adotadas pela Sabesp, embora acertadas,(implantação do sistema produtor do Alto Tietê e São
Lourenço, gestão da demanda, controle de perdas e o estímulo ao reuso) estão de longe defasadas no tempo pois se desenvolvem em ritmo incompatível com as urgentes necessidades da metrópole.
Dada a vulnerabilidade do sistema de abastecimento de água cujo plano de expansão deveria ser mais acelerado com o aporte de maiores recursos financeiros é urgente que as autoridades sanitárias do Estado implantem um Plano B visando reduzir a insegurança hídrica a qual já se encontra no limite.
Este Plano B se baseia na adoção de tecnologias de tratamentos avançados para a purificação de águas de mananciais não protegidos localizados dentro da própria RMSP que por esta razão estão com qualidade de água incompatível com as técnicas convencionais ainda adotadas de tratamento de água.
Esta situação se configuraria na prática como um reuso indireto de água só que programado, ao contrário das práticas corriqueiras de reuso indireto na qual cidades a jusante captam e tratam por modo convencional as águas oriundas de mananciais afetados por descargas de esgotos nem sempre tratados configurando-se o reuso indireto não programado.
Nestas condições, tendo em vista a configuração hídrica da Bacia do Alto Tietê a nova tomada d’ água se daria na represa Billings em um ponto próximo ao Reservatório das Pedras de modo a se aproveitar dos efeitos de autodepuração deste manancial, cujas águas seriam acrescidas das do Rio Pinheiros com o reforço do efluente tratado da ETE Barueri e de parte das águas do Tietê a montante.Para que tal aconteça, no entanto, as seguintes condições devem obrigatoriamente ser observadas:
a) A reversão do esgoto tratado da ETE Barueri somente poderia ser realizada após um tratamento terciário do efluente secundário. Esta intervenção seria feita com a substituição dos decantadores secundários por membranas de ultrafiltração o que propiciaria também a liberação de áreas para expansão. Com tal grau de qualidade, esta reversão se daria por recalque com a tubulação
seguindo em sentido contrário pelas margens do rio Tietê em direção à embocadura do Pinheiros por onde adentraria a este rio através das estruturas hidráulicas já existentes;
b) Tratamento ao nível terciário das águas revertidas à Billings (rio Pinheiros + efluente da ETE Barueri), estimadas atualmente em 22 m3/s, antes da entrada naquele reservatório;
c) Captação na Billings próxima ao reservatório das Pedras submetendo-se a água a tratamentos avançados incluindo tecnologia de membranas complementada com eventuais processos oxidativos. A água tratada seria revertida preferencialmente aos reservatórios dos sistemas produtores
Rio Grande, Alto Tietê e Cantareira ou mesmo distribuída diretamente.
Esta solução traria como vantagens alem da elevação da segurança hídrica da metrópole a melhoria da qualidade das águas do rio Pinheiros, da Represa Billings e poderia ainda reforçar a geração em Henry Borden quando as condições hídricas forem favoráveis para o prioritário esforço de abastecimento de água à população.
Atente-se, entretanto, que a adoção desta solução tal como proposta ou suas variantes do mesmo naipe, como de resto todas as soluções de reuso potável e não potável devem ser antecedidas de exaustivos estudos de tratabilidade em escala técnica, procedimento entendido como aquele em que haja uma adequada representativa das condições de campo.
Só então, exauridos todos os testes necessários e suficientes e somente com a certeza da obtenção de uma água digna dos padrões de qualidade vigentes e complementares definidos pelo Ministério da Saúde é que se poderia iniciar a implantação desta alternativa. Estes cuidados, absolutamente necessários, normalmente são adotados quando está sob risco a saúde pública e não há certeza quanto a segurança de adoção de alternativas de tratamento heterodóxicas e de seus métodos empíricos de dimensionamento.
Para remate, assinale-se que esta proposta, de certa forma polêmica, é oferecida para discussão à comunidade técnica, bem como a todos aqueles que se interessam pela segurança hídrica da RMSP, tema de grande preocupação a nós moradores desta macro metrópole e de seu entorno cada vez mais populosos.
Engº José Eduardo W de A Cavalcanti
Membro do Conselho Deliberativo do Instituto de Engenharia e do Conselho Superior de Meio Ambiente da Fiesp. É autor do livro, Manual de Tratamento de Efluentes Industriais.
Autor: Folha de S.Paulo