As Universidades de Harvard e de Stanford, nos Estados Unidos, iniciaram nos últimos anos uma reforma curricular de seus programas de graduação com o intuito de flexibilizar os currículos dos cursos e propiciar aos estudantes uma formação mais sólida e diversificada, entre outros objetivos.
Já no Brasil esse processo enfrenta alguns obstáculos, como o conservadorismo das instituições e a resistência dos docentes em mudar a forma tradicional de suas aulas.
O assunto foi discutido por especialistas reunidos no simpósio Excelência em Educação Superior, organizado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e pela Academia Brasileira de Ciências (ABC).
“Há um grande conservadorismo das universidades brasileiras em promover a reforma do currículo de seus cursos de graduação que faz com que as instituições novas, com programas de graduação recém-criados, tenham mais sucesso do que as instituições mais antigas nesse aspecto”, disse Luiz Davidovich, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ) e diretor da ABC.
“Em outros países, contudo, são as instituições tradicionais que têm liderado as mudanças”, afirmou Davidovich, na palestra que proferiu durante o evento.
As mudanças no currículo dos cursos de graduação da universidade norte-americana de Harvard, por exemplo, fizeram com que estudantes da área de Ciências Humanas passassem a ser incentivados a visitar laboratórios e conhecer o que ocorre em outras áreas.
Além disso, passou-se a exigir que os estudantes da instituição tenham de frequentar, pelo menos, um curso como “Cultura e credo” e “Estética e interpretação”, entre outros.
O exemplo de Harvard foi seguido por outras instituições norte-americanas, como a Universidade de Stanford, cuja revisão curricular está em andamento.
Outros países, como a China, também trilharam o mesmo caminho, promovendo mudanças nos currículos dos cursos de graduação das universidades do país, para torná-los mais flexíveis e adiar a especialização dos estudantes.
Em 1998, o número de especializações oferecidas no país oriental foi reduzido de 504 para 249 e os estudantes que ingressam em universidades como a de Xangai, por exemplo, podem selecionar em que área vão se especializar após um ou dois anos de estudo, contou Davidovich.
“As propostas do documento Subsídios para a reforma da educação superior, que a ABC lançou há mais de dez anos, seguem essa mesma linha de pensamento”, disse Davidovich.
De acordo com o professor, algumas das propostas do documento são a introdução de ciclos de dois a três anos para cursos de graduação, com a possibilidade de transferência entre diferentes tipos de instituições, e a redução do número de horas em sala de aula e de disciplinas obrigatórias, para estimular o trabalho fora da sala de aula e dar mais tempo aos professores para lidar com alunos excepcionais ou com problemas de aprendizagem.
O documento também propõe o atraso da decisão de especialização dos estudantes e a maior flexibilidade no currículo, em vez de introduzir novos cursos de graduação.
“A introdução de novos cursos de graduação é uma praga no Brasil”, afirmou Davidovich. “Se surge uma área importante do conhecimento, como nanotecnologia, logo se cria um novo curso de graduação com esse foco no país.”
“Nanotecnologia é uma disciplina do curso de graduação em Física do MIT, assim como Filosofia e História da Ciência”, disse o especialista. “Esse eixo fundamental enxuto dos cursos permite acrescentar essas disciplinas eletivas e diversificar a formação dos alunos”, apontou.
O currículo dos cursos de graduação oferecidos pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology – EUA) é composto por um conjunto de disciplinas básicas e uma série de outras eletivas, apontou Davidovich.
Experiências no Brasil
No Brasil, uma das instituições que apostaram nesse tipo de currículo diferenciado foi a Universidade Federal do ABC (UFABC). O currículo do curso de Bacharelado em Ciência e Tecnologia oferecido pela universidade fundada em 2005 é composto por um ciclo básico de disciplinas fundamentais.
Após concluir o número requerido de créditos, o aluno obtém o diploma de Bacharel em Ciência e Tecnologia, habilitando-se a prosseguir os estudos de graduação em Engenharia, Ciências da Natureza, Matemática ou Ciência da Computação.
Também há a possibilidade de o aluno fazer o mestrado na própria universidade ou de se transferir para cursos de formação superior em outras instituições nacionais e internacionais.
“Os currículos dos cursos de graduação oferecidos pelas universidades brasileiras precisam ser flexibilizados porque o estudante não sabe exatamente o que quer quando entra na universidade e um currículo mais flexível permite que eles sejam livres para fazer suas próprias escolhas”, avaliou Luiz Bevilacqua, ex-reitor da UFABC.
A estrutura curricular dos cursos de Engenharia da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) também foi flexibilizada nos últimos anos, contou José Roberto Cardoso, diretor da instituição.
Atualmente, os ingressantes nos cursos de Engenharia têm a possibilidade de realizar até 15% do curso onde desejarem. Além disso, a instituição tem discutido a possibilidade de diminuir a carga horária de 28 horas por semana de hora-aula que os estudantes enfrentam atualmente.
Autor: Agência Fapesp