Toda vez que um acidente ganha destaque — seja local ou em rede nacional — logo surgem os boatos sobre a velocidade na qual “o velocímetro travou”, fator suficiente para que os peritos em palpites declarem a velocidade exata em que o carro estava no momento do acidente. Mas quem falou que os velocímetros “travam” na velocidade da batida?
Em alguns acidentes os velocímetros travam simplesmente devido aos danos causados aos componentes do sistema, geralmente nos acidentes de maior monta, ocorridos em maior velocidade.
Mas isso também não indica que o carro estava na velocidade indicada pelo velocímetro danificado, pois a maioria dos carros modernos usa velocímetros mecânicos ou eletrônicos, e em nenhum deles há dispositivos capazes de travar o ponteiro.
O velocímetro mecânico mede a velocidade por meio de um cabo conectado ao eixo motriz e ao velocímetro. No velocímetro o cabo é ligado a um magneto, que gira livre dentro de uma campânula na mesma velocidade do cabo. A rotação do magneto produz uma corrente induzida que faz a campânula girar no mesmo sentido, porém sem contato com o magneto. A campânula é ligada a uma mola reguladora que, como o nome diz, regula sua rotação, fazendo-a girar mais lentamente. É o movimento desta campânula que move o ponteiro e indica a velocidade. Por ser um sistema eletromagnético e mecânico, independente de sensores, não há um modo preciso de travar o ponteiro na velocidade e no momento exatos de um acidente.
Para ilustrar melhor essa impossibilidade, vamos falar sobre os sistemas de segurança ativados em caso de acidente, apenas para referência.
Os sistemas de airbag e pré-tensionadores de cintos de segurança são ativados por pulsos elétricos enviados por um módulo de controle dotado de sensores de desaceleração. Caso a força de desaceleração seja superior a um nível pré-estabelecido pela programação da fábrica (por exemplo: uma desaceleração superior a 3 g por mais de 3 milissegundos), os pulsos elétricos são enviados e disparam os dispositivos de pré-tensionamento e inflação do airbag. Em resumo, para ativar um sistema no momento exato do acidente é preciso um sistema relativamente complexo de programação de módulos e sensores. Alguns sistemas mais primitivos usavam interruptores que, se acionados pela deformação dos para-choques, disparavam o air-bag. Nesse caso é melhor torcer para bater no ponto certo.
A única forma de travar um velocímetro mecânico seria usando um sistema paralelo ao eletromagnetismo atuante no velocímetro de cabo, acionado por um interruptor como este do airbag — algo complexo e possivelmente caro.
A única possibilidade de travar um velocímetro no momento exato da batida seria com os velocímetros eletrônicos, usados em praticamente todos os carros produzidos atualmente. Eles funcionam por sensores de rotação que enviam breves pulsos elétricos a um módulo eletrônico que calcula a frequência de envio dos pulsos e a converte em velocidade.
A velocidade pode ser mostrada em um LCD ou em uma escala analógica convencional. Nesse último caso o circuito eletrônico é ligado a um motor de passo, que gira o ponteiro no ângulo preciso. Como o sistema de medição é totalmente eletrônico, seria possível ligá-lo aos módulos dos sistemas de segurança ativa para travar o ponteiro no momento exato em que o airbag dispara, por exemplo.
Mas além de não haver demanda por um sistema como este é preciso levar em conta que em casos de acidente vários sistemas e componentes do carro acabam danificados.
Então por que eles travam?
Simples: por que eles são danificados no acidente e não há um sistema de segurança que mantenha o ponteiro imóvel, independente das condições do velocímetro. Alguns velocímetros eletrônicos têm uma mola de retorno do ponteiro, mas em geral o motor de passo trava assim que a alimentação do painel é interrompida.
Só que isso não significa que a velocidade indicada foi a mesma da batida, pois os velocímetros medem a velocidade por meio do movimento das rodas do carro. Se por algum motivo elas girarem no ar — em um capotamento ou salto — a velocidade indicada será superior à real, da mesma forma que em caso de travamento das rodas — por frenagem, derrapagem ou deformação da carroceria — a velocidade indicada pode ser zero, o que pela lógica dos peritos em palpite indicaria que o carro bateu parado…
Autor: Jalopnik