A necessidade de construção de garagens subterrâneas no meio urbano decorre da conjugação entre a carência de espaços livres na superfície, em especial nas áreas centrais das grandes cidades, com a crescente (e já grande) demanda por espaços para estacionamento. Mais recentemente, a valorização da humanização dos espaços urbanos se juntou aos dois fatores anteriores para justificar a construção de garagens subterrâneas como parte da solução do problema da mobilidade.
O crescimento da frota de veículos particulares, de impressionante dimensão nos últimos anos, é agravante de um problema que, no limite, é consequência da histórica falta de uma política racional de uso do solo, além da inversão de prioridade relativa à mobilidade, que privilegiou o transporte individual. Parte significativa dos edifícios da região central de São Paulo foi construída sem áreas compatíveis para estacionamento, reflexo da pouca importância relativa dos espaços privados para estacionamento de veículos. Como os espaços públicos são limitados, estamos agora a buscar a forma menos traumática para pagar esta conta…
Neste contexto, as garagens subterrâneas podem contribuir efetivamente para a solução do problema da mobilidade – localizadas em baixo de praças, ruas ou avenidas, normalmente sob espaços públicos, acomodam a demanda por estacionamento em áreas centrais ou polos geradores de tráfego; diminuem a poluição pela redução na circulação em busca de vagas e aumentam a fluidez no viário de superfície (pela substituição das vagas em vias públicas pelas garagens). Adicionalmente se tem a melhoria no aspecto visual resultante da remoção dos veículos estacionados junto ao meio fio e a valorização do comércio e serviços locais.
Mas aqui em São Paulo esta contribuição ainda não se concretizou como esperado (e necessário).
O primeiro programa estruturado para implantação de garagens subterrâneas em áreas públicas na cidade é de 1988, feito na gestão do Prefeito Jânio Quadros. Das inicialmente 12 garagens previstas, duas foram construídas – Clínicas e Trianon. Desde então, a combinação entre a resistência de ambientalistas e parte dos urbanistas com a falta de uma administração municipal comprometida com a solução do problema transformou a questão das garagens subterrâneas em uma novela sem fim.
Os capítulos mais recentes elucidam a trapalhada geral que tomou conta do assunto: em 2009 a Prefeitura lançou um programa para a construção de 64 edifícios-garagem, que foi abandonado com base em estudos do setor privado que apontavam o alto custo de construção como fator de inibição dos empreendedores. Foi então preparada uma nova proposta, desta vez com apoio do setor privado, da EBP (Estruturadora Brasileira de Projetos) e do BNDES. Como resultado desta nova tentativa, a Prefeitura apresentou, agora em 2012, um programa para a construção de três garagens – Mercado Municipal, Praça Roosevelt e rua 25 de Março.
O programa atual prevê a disponibilização de 1.390 vagas (contra as 1.167 vagas de zona azul existentes nas regiões onde se localizariam as garagens), sendo obras (estimadas em R$ 118 milhões) e administração por 30 anos de responsabilidade do setor privado. Havia, quando da audiência pública do projeto (julho do corrente), a expectativa de se lançar o Edital ainda neste ano de 2012.
Sobre esta proposta cumpre comentar: (1) praticamente substitui as atuais vagas da zona azul por espaços subterrâneos, sem nenhuma previsão para atender ao crescimento da demanda; (2) comparada aos 64 edifícios-garagem anunciados em 2009, evidencia a ciclotimia que caracteriza o Poder Público no tratamento da questão; e (3) o aspecto positivo de se prever a implantação e operação das garagens pela iniciativa privada.
Os escassos recursos para investimento da Prefeitura devem ser utilizados prioritariamente na melhoria da infraestrutura de apoio ao transporte coletivo. Transferir a responsabilidade dos investimentos e gestão das garagens subterrâneas para a iniciativa privada é, certamente, a melhor forma para solucionar este problema.