A três meses do início da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (RIO+20), os participantes ainda não chegaram a um acordo sobre os objetivos do encontro mundial.
Enquanto os organizadores brasileiros afirmam que a Rio+20 é um encontro para debater o desenvolvimento sustentável, como, a propósito, está expresso no nome do evento, um grande número de participantes de peso afirma que virá ao Brasil discutir questões ambientais e nada mais.
Ambas são questões essenciais, mas um encontro sem foco corre o risco de seguir a esteira de fracassos recentes dos debates tanto sobre um quanto sobre outro tema.
Economia verde
Para os organizadores brasileiros, a RIO+20 poderá alcançar um impacto planetário de magnitude semelhante ao da ECO-92, contanto que consiga superar o desafio de integrar de forma equânime os três pilares do desenvolvimento sustentável: as dimensões ambiental, econômica e social.
Ocorre que a ECO-92 foi essencialmente uma conferência ambiental. Seu sucesso deu-se sobretudo ao mostrar que o assunto estendia-se além das questões estritamente ambientais, mas isto não a tornou uma conferência sobre uma nova ordem econômica mundial.
E parece que o mundo não chegou ainda a um acordo sobre se é necessário realmente realizar uma conferência de cunho tão amplo, ou se apenas precisamos continuar discutindo o meio ambiente, questões econômicas postas à parte.
“A RIO+20 é uma conferência sobre desenvolvimento sustentável e não apenas um debate sobre meio ambiente. A intenção da presidência da conferência é que as dimensões ambiental, social e econômica tenham o mesmo peso no debate. O governo brasileiro, por sua vez, entende que, se os desafios do século 21 não forem vistos de maneira integrada, jamais conseguiremos atingir níveis de sustentabilidade”, defende defende o embaixador brasileiro Luiz Alberto Figueiredo Machado.
De acordo com o embaixador, o mundo atravessa uma época de crise internacional e os atuais modelos de desenvolvimento demonstram uma erosão em sua capacidade de dar respostas aos novos desafios.
“Os modelos atuais produzem crises em todos os pilares do desenvolvimento sustentável: a crise climática, a perda acelerada da biodiversidade, a degradação social e a crise energética demonstram isso. Estamos fazendo algo errado”, disse.
Questão ambiental
O esboço do documento que servirá de base para a declaração final da Rio+20, o chamado “Esboço Zero”, por sua vez, não avança tanto nesta questão, e tem sido criticado pelos defensores de uma conferência que mergulhe diretamente na questão do desenvolvimento sustentável.
Mas o documento tem sido mais criticado ainda pelos opositores, que dizem que o documento saiu demais da questão ambiental, que deveria ser o foco da conferência.
Autoridades ambientais da Europa criticaram publicamente o documento, atribuindo “falta de foco” ao texto, já que ele estabelece temas como economia verde e desenvolvimento sustentável entre as prioridades do encontro.
Segundo os europeus, a conferência deveria ter mais foco na questão ambiental propriamente dita e na reorganização institucional dos órgãos internacionais voltados ao tema, sobretudo ao IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas).
O IPCC vem sendo duramente criticado no próprio meio científico, devido a alguns escorregões que colocaram em dúvida sua credibilidade frente à opinião pública e aos políticos.
A comunidade científica formalizou um estudo propondo mudanças científicas e gerenciais no IPCC, mas o presidente da instituição, Rajendra Pachauri, agarrou-se ao cargo e não se sentiu constrangido o suficiente para sair.
A expectativa é a de que um encontro mundial como a Rio+20 tenha peso suficiente para garantir a adoção das medidas sugeridas no órgão.
A ministra francesa do Meio Ambiente, Nathalie Morizet, por exemplo, afirmou que falar muito sobre crescimento verde e pouco sobre governança significa perder o foco.
Jean Jouzel, vice-presidente do IPCC, também afirmou que a RIO+20 precisa ser “mais conclusiva e menos filosófica”.
Queremos mudanças
O Brasil lidera uma visão diferente.
Na época da ECO-92, segundo o embaixador brasileiro, os países desenvolvidos acreditavam que haviam resolvido suas questões econômicas e sociais e dirigiam o foco das discussões para os temas exclusivamente ambientais.
Enquanto isso, os países em desenvolvimento tinham o foco no desenvolvimento econômico apoiado no contexto da sustentabilidade.
“Vinte anos depois, o mundo virou de cabeça para baixo: os países desenvolvidos estão lidando com uma profunda crise econômica e social, enquanto os países como o Brasil são líderes na área em tecnologias verdes, em investimentos em energia limpa e avançaram na inclusão social”, disse.
Nesse novo contexto, segundo Machado, a RIO+20 não tem mais uma agenda que olha o econômico, o ambiental e o social separadamente.
Por isso, a comissão brasileira da conferência tem utilizado o termo “economia verde inclusiva”, a fim de remeter ao trinômio “crescimento”, “inclusão social” e “proteção da natureza”.
“A decisão política do século 21 é a de integrar essas três dimensões. Esse é um desafio para todos os países e para a RIO+20. Se conseguirmos essa integração, finalmente poderemos, depois de duas décadas, realizar as promessas da ECO-92”, afirmou Machado.
Promessas à parte, o fato é que a situação da Rio+20 se parece cada vez mais com um hoje esquecido “Debate Norte-Sul”, um debate que a rigor nunca existiu porque, por mais que o Sul tenha gritado, o Norte sempre fez-se de surdo.
Autor: Agência Fapesp