Repleto de dúvidas e incertezas, o governo lançou o edital da obra de maior valor do PAC. Trata-se do Trem de Alta Velocidade (TAV), conhecido como trem-bala, que vai interligar as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Seu custo foi fixado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) em R$ 33,1 bilhões.
A Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016 foram usadas para justificar o investimento no TAV. Mas, a expectativa de início das obras em 2011 descarta sua utilização para o mundial de futebol.
Para os jogos olímpicos, o presidente Lula afirmou que será “plenamente possível” seu aproveitamento. Porém, com base no estudo Trens de Alta Velocidade: Experiência Internacional, de Sander Lacerda, economista do BNDES, essa é uma meta difícil de cumprir quando se vê que na Coréia do Sul a primeira fase de implantação do trem-bala, com 224 quilômetros de extensão, precisou de dez anos para ser concluída. O governo pretende construir 511 quilômetros em cinco anos, sendo que projetos dessa magnitude no Brasil encontram forte resistência de ambientalistas, o que costuma atrasar e encarecer as obras.
O TCU limitou o custo do projeto em R$ 33,1 bilhões, mas há estimativas apontando que ele custaria pelo menos um terço mais caro. Outras projeções calculam que pode chegar a R$ 50 bilhões, dependendo das características dos terrenos, condições de financiamento, número de estações etc. No caso dos 224 quilômetros da Coréia do Sul foram gastos US$ 16 bilhões, equivalente a R$ 28 bilhões.
Um terceiro item a ser considerado é que o TAV seria uma alternativa ao transporte aéreo, podendo desafogar o superlotado aeroporto de Congonhas. Ocorre que em 2008 estimou-se que seu tráfego se reduziria apenas 8,8% com o TAV. Trata-se de um mega projeto que em realidade não atende a uma demanda bem definida.
O TCU estipulou tarifas econômicas máximas entre R$ 149,85 para os horários normais e R$ 199,73 nos horários de pico. Mas, como ficaria sua viabilidade se a procura for muito aquém da esperada? Provavelmente, a demanda mais significativa encontra-se no trecho compreendido entre São Jose dos Campos, São Paulo e Campinas. Com certeza haverá aumento de preços, e é importante chamar a atenção para o fato do TAV existir apenas em países com renda bem mais alta que a brasileira como Alemanha, França, Japão, Coréia do Sul e outros.
Por fim, cabe citar que o TCU limitou em até 60% o uso de recursos públicos para o financiamento do TAV. O BNDES será a principal fonte de recursos, cerca de R$ 20 bilhões. Aqui a questão que se coloca é a seguinte: não geraria maior benefício para o País se esse dinheiro financiasse obras do metrô nas principais capitais? Só na cidade de São Paulo, que precisa investir em transporte público de alta capacidade, daria para construir pelo menos mais 180 quilômetros, o que multiplicaria por quatro a atual malha metroviária.
O TAV cria uma imagem de modernidade para o País, mas a relação custo-benefício do projeto é duvidosa. Mais à frente, o contribuinte pode se dar conta que ele foi mais um caso de desperdício de dinheiro público, como tantos outros no Brasil.
*Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. É secretário municipal do Trabalho e Desenvolvimento Econômico de São Paulo. É autor da proposta do Imposto Único.
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Autor: *Marcos Cintra