Governos são a chave para sonhos elétricos de Ghosn .

Quando Carlos Ghosn assumiu a presidência executiva da Nissan Motor Corp., ele fez uma aposta ao erguer uma fábrica nos Estados Unidos para produzir picapes e utilitários esportivos grandes. Agora, dez anos depois, ele está guiando na direção contrária, aumentando a produção de pequenos carros elétricos.

Ghosn apareceu em Washington na segunda-feira, junto com o presidente do conselho da FedEx Corp., Fred Smith, e outros executivos reunidos na Coalizão da Eletrificação, para pedir que o governo americano adote políticas que ajudariam a colocar milhões de veículos total ou parcialmente elétricos nas ruas. Até 2040, 75% do uso de carros nos EUA deveria ser feito usando energia elétrica em vez de combustão de petróleo, afirmou o grupo.

Ghosn, diretor-presidente tanto da Nissan quanto de sua sócia francesa, a Renault SA, diz que as empresas vão lançar quatro veículos elétricos no mundo. “Nossa previsão é que as vendas de veículos elétricos serão 10% do mercado total (…) até 2020”, diz.

Mais uma vez, Ghosn está respondendo à demanda. A diferença é que quando ele investiu em grandes utilitários para o mercado americano, ele estava seguindo os consumidores — de fato, tirando o atraso em segmentos nos quais as montadoras de Detroit haviam sido pioneiras e nos quais prosperaram durante boa parte dos anos 90.

Desta vez, Ghosn está respondendo a um mercado criado e sustentado em grande parte por políticas governamentais.

Na Europa Ocidental, no Japão e nos EUA, líderes políticos preocupados com os efeitos das emissões de automóveis no clima mundial, e inquietos com a volatilidade do preço do petróleo, estão oferecendo bilhões aos consumidores e fabricantes para estimular a demanda por veículos elétricos. Eles estão oferecendo benefícios regulamentares às montadoras também. A Nissan e a Renault estão determinadas a aproveitar isso.

Nos EUA, o governo está oferecendo créditos fiscais de US$ 7.500 para compradores de veículos elétricos e bilhões em empréstimos e dotações do programa de estímulo para dar início à produção de carros elétricos no país. A Nissan recebeu a aprovação para um empréstimo de US$ 1,6 bilhão do Departamento de Energia americano para reformar parte de sua fábrica de Smyrna, no Tennessee, e adequá-la à montagem de elétricos.

A Nissan também receberá ajuda de um empréstimo de US$ 100 milhões do Departamento de Energia à ECOTotality Inc., uma empresa do Arizona que planeja desenvolver os postos de recarregamento e o equipamento relacionado para dar apoio a uma frota de 4.700 elétricos Leaf da Nissan. 

“Não vamos colocar carros elétricos em mercados onde não há incentivo para os consumidores” os comprarem, diz Ghosn. Por isso, um Nissan elétrico para a China terá de esperar, ainda que o mercado chinês possa ser o maior da montadora em 2011 ou 2012, afirma.

Os riscos associados com um mercado criado por política governamental são muitos. Isenções fiscais e empréstimos para veículos elétricos estão aqui hoje, mas podem desaparecer amanhã se cortar o déficit tornar-se uma prioridade maior do que subsidiar a indústria automobilística.

O presidente americano Barack Obama e alguns líderes de seu partido, o Democrata, no Congresso do país são a favor de fortes medidas para reduzir o consumo de combustíveis fósseis como parte de uma estratégia para cortar as emissões de dióxido de carbono e outros gases ligados às mudanças climáticas nos EUA. Limites às emissões de gases do efeito estufa no país poderiam aumentar a demanda por veículos elétricos no longo prazo.

Mas parece improvável que o Congresso aprove em breve um projeto de lei sobre o clima que aumentaria o custo da gasolina o suficiente para provocar uma corrida dos consumidores para alternativas mais econômicas em termos de uso de combustível, que normalmente são mais caras.

No âmbito global, uma reunião de cúpula sobre o clima da Organização das Nações Unidas em Copenhague, no mês que vem, não deve produzir nenhum novo acordo mandatório para que se limitem as emissões de gases do efeito estufa. “Você se desapontará se tiver quaisquer expectativas” para Copenhague, diz Ghosn. Mas as empresas vão precisar de clareza sobre quais serão as regras. “O que gostaríamos é que algo fosse estabelecido”, diz.

A aceitação em massa de veículos elétricos também exigirá uma grande mudança na relação das pessoas com os carros — sentimentos que a indústria automobilística passou décadas inculcando por meio de propaganda e design de produto.

Nos EUA, os consumidores gostam de veículos versáteis, de pouca manutenção, que podem percorrer até 600 km entre os reabastecimentos. Mesmo com tecnologia de baterias muito aprimoradas, os elétricos oferecem de um quarto a metade dessa autonomia.

Um relatório divulgado na segunda-feira pela Coalização para Eletrificação mapeou o problema. As pessoas no típico lar americano fazem cerca de seis viagens em seu carro por dia, para o trabalho ou algum outro lugar. Essas corridas são em média de uns 15 km. Praticamente qualquer veículo convencional alimentado a gasolina que comece o dia com um tanque cheio pode facilmente dar conta disso sem precisar reabastecer. Mas os elétricos não têm a mesma margem para erro — especialmente porque há, pelas contas da coalizão, apenas 1.000 postos de recarregamento públicos.

Como o estudo da coalizão observa, “não se demonstrou de maneira confiável um modelo de negócios lucrativo para a infraestrutura pública de recarregamento”. É por isso que a coalizão propõe créditos fiscais equivalentes a 75% do custo de instalação dos postos de recarregamento.

Ghosn diz que quer que a Nissan seja uma líder em tecnologia de veículos elétricos, inclusive baterias. Ele cortou muitos projetos enquanto liderava a recuperação da montadora, que esteve à beira da falência no fim dos anos 90, mas manteve um programa de baterias avançadas que ela havia promovido durante anos no cerne da empresa.

Ainda assim, Ghosn não está apostando a empresa apenas em carros elétricos. A Nissan e a Renault estão concentradas nas oportunidades de motorizar as enormes populações da China e da Índia. Ghosn esteve recentemente na Índia para avançar um acordo com a Bajaj Auto Ltd. para o desenvolvimento de um carro superbarato que possa competir com o Nano, de US$ 2.500, oferecido pela indiana Tata Motors Ltd. O carro será econômico, afirmam Renault e Nissan, mas não elétrico.

Os veículos elétricos serão por ora adições ao portfólio da Renault e da Nissan, diz Ghosn, não substitutos para os modelos básicos.

Autor: The Wall Street Journal