A construção civil é o setor que deve liderar a corrida para a sustentabilidade entre os diversos segmentos produtores. A afirmação é de Hamilton de França Leite Júnior, diretor de Sustentabilidade do Secovi-SP.
Segundo ele, diante das alterações climáticas do planeta, o novo modelo econômico mundial deverá estar pautado em ações cada vez mais sustentáveis e a indústria imobiliária, como um dos principais agentes na formação das cidades, terá papel decisivo nessa questão.
No entanto, esse processo não deverá ser tão simples. Para o diretor do Secovi, somente a partir do momento em que os consumidores, devidamente informados, reconhecerem o problema e demandarem por produtos e serviços realmente sustentáveis, é que haverá uma mudança consistente na maneira com que empresas e governos abordarão o assunto.
Confira, a seguir, artigo de Hamilton de França Leite Júnior sobre o tema:
Um novo modelo EConômico
Está a humanidade diante da migração do modelo capitalista vigente para um novo modelo econômico? Ou seria mais adequado batizá-lo “Modelo ÉCOnômico”, pois será orientado pela necessidade de sobrevivência de nossa raça, que está caminhando a passos largos rumo à extinção, decorrente das alterações climáticas que começamos a experimentar?
O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) aponta para um aumento de temperatura entre 2ºC e 4,5ºC, podendo chegar a 6ºC, comparados às temperaturas médias do período pré-industrial. Uma elevação de 4ºC significaria, por exemplo, um aumento do nível do mar em 59 cm, originando 313 milhões de exilados ambientais, além da ocorrência de fenômenos climáticos severos com graves consequências, principalmente para as populações mais pobres.
Em trabalho publicado pela Revista Nature (ed. 458, de 5/03/09) o cientista Malte Meinhausen mostra que, para mantermos o aumento da temperatura em até 2oC, que seria o limite máximo para não entrarmos numa condição de instabilidade climática extremamente preocupante, precisaríamos cortar as emissões pela metade até 2050. Este também é o limite de aquecimento que a comunidade internacional pretende formalizar na Conferência de Mudanças Climáticas da ONU a ser realizada no final do ano em Copenhagen, pois caso esta marca seja ultrapassada, como acreditam vários outros cientistas, precisaríamos reduzir 80% das emissões atuais!
Assim, por conta de pura necessidade de autopreservação, a humanidade alcançará em breve sistemas onde não haverá mais espaço para o desenvolvimento insustentável, que é o cerne do modelo econômico em vigor. Talvez a crise econômica global, cuja gênese reside no consumo exacerbado pelo povo mais consumista do mundo, seja um primeiro sinal concreto dessas transformações.
Infelizmente, a maior parte da população, dos governantes e dos empresários ainda não se conscientizou desse fato, principalmente os atuais representantes da geração economicamente dominante. E não há mais muita esperança de que nos próximos anos sejamos capazes de realizar mudanças significativas.
Porém, muitos de nós esperamos que essa realidade tome outro rumo dentro de poucas décadas, quando os cidadãos da geração dos “Echo-boomers” (os nascidos entre 1980 e 2000) assumirem o controle, para quem sabe evitar a sexta extinção em massa no nosso planeta e permitir que nossos bisnetos possam ainda contemplar esta natureza espetacularmente bela. Podemos prever esta guinada pelas expressões dessa geração, como no desabafo de uma jovem de 15 anos registrado numa pesquisa contratada pela MTV (Dossiê Universo Jovem 4 – 2008): “Em dez anos, a gente vai sobreviver nessa droga de mundo que estragaram para a gente.” As organizações que vislumbrarem mais cedo este novo cenário, e tomarem ações eficazes nesta direção, serão aquelas que dominarão num futuro próximo seus próprios mercados.
A indústria imobiliária, atividade que mais consome recursos naturais do planeta – se considerado ciclo de vida completo das edificações -, bem como agente mais importante na formação das cidades (que, em 2025, vão concentrar 60% da população mundial), possui um papel decisivo nessa questão, pois conta com profissionais com imensa capacidade criativa e empreendedora e tem, portanto, alto potencial para liderar esta corrida entre os diversos segmentos produtores.
Os meios de comunicação têm relevância fundamental nesse processo, já que os cientistas realizam seu papel muito bem, porém não são treinados para transformar todo o conhecimento produzido num assunto tão complexo em linguagem adequada para toda a diversidade de pessoas pelos confins da Terra.
Portanto, somente a partir do momento em que os consumidores, devidamente informados, reconhecerem o problema e demandarem por produtos e serviços realmente sustentáveis, é que haverá uma mudança consistente na maneira com que empresas e governos abordarão o assunto.
É preciso ponderar sobre um lugar para se viver totalmente diferente do atual, onde não mais haverá espaço para os hábitos que temos hoje. É necessário projetar uma comunidade global, na qual o consumo terá de ser drasticamente reduzido – até por conta da escassez de bens essenciais à vida, e conseqüentemente todo tipo de produção terá de obedecer a novos paradigmas.
Nossos descendentes herdarão um “modus vivendi” que certamente não se encaixa no estilo de vida que temos adotado desde a revolução industrial. De onde se conclui o inevitável: temos de criar um novo padrão sustentável e o Brasil tem um grande potencial para assumir a liderança na construção desta nova “ÉCOnomia”.
Autor: PINI