Trecho sul do Rodoanel vai custar R$ 4 bilhões

O Rodoanel Mario Covas, rodovia perimetral com 170 quilômetros de comprimento que ligará a Região Metropolitana de São Paulo às principais rodovias estaduais e federais, está saindo do papel. O traçado, elaborado depois de muitas mudanças em 1992, é dividido em quatro trechos – norte, sul, leste e oeste – e prevê modificações profundas no trânsito de São Paulo. O objetivo da obra é retirar caminhões e carretas das marginais dos rios Pinheiros e Tietê, que cortam a cidade todos os dias. “O plano do Rodoanel inteiro prevê uma melhoria de 60% no trânsito de São Paulo”, afirma Mauro Arce, secretário de Transportes do Governo do Estado de São Paulo.

Por enquanto, apenas o trecho oeste, com 32 quilômetros, está em operação. Ele interliga as rodovias Raposo Tavares, Castello Branco, Anhanguera, Bandeirantes e Régis Bittencourt. Concluído em 2002, é administrado sob regime de concessão, desde março de 2008, pela CCR Rodoanel, empresa de propósito específico do grupo CCR, que pagou R$ 2 bilhões pela outorga do trecho. No ano passado, a operadora investiu R$ 95 milhões na operação, segundo seu presidente, José Braz Cioffi. O dinheiro foi usado para construir 13 praças de pedágio e instalar sinalização.

Neste ano, mais R$ 50 milhões serão empregados na pavimentação de vias e tratamento antirruído. Braz conta que a rodovia tem recebido uma média diária de 200 mil veículos, o que garante uma receita média de R$ 10 milhões por mês. A cifra está um pouco abaixo do esperado, mas o executivo está otimista. “Com o trecho sul em operação, nosso movimento irá crescer entre 25% e 30%”, calcula.

Com cerca de 70% a 80% das obras concluídas, o trecho sul liga a Régis Bittencourt à Anchieta, com quase 60 quilômetros. A entrega, por contrato, está prevista até o final de março de 2010. O trecho foi dividido em cinco lotes para a execução das obras, cada um a cargo de um grupo de construtoras. A preços de dezembro de 2005, o trecho foi orçado em R$ 2,4 bilhões. Mas, segundo Arce, levando-se em consideração desapropriações, recuperação de matas e outras ações mitigatórias, deve chegar a R$ 4 bilhões. Desse total, o governo federal participa com R$ 1,2 bilhão, dividido em quatro parcelas de R$ 300 milhões. Para bancar sua parte, o governo paulista conta com os recursos da venda da folha de pagamento dos servidores ao banco Nossa Caixa em março de 2007, por R$ 2,1 bilhões, além dos R$ 2 bilhões pagos pela CCR.

A licitação para a escolha da concessionária do trecho sul deverá ser decidida ainda neste ano. O que está em discussão é o modelo de transferência para o setor privado. Ou será uma concessão para a operação simplesmente ou se fará uma licitação para o restante da obra, que inclui a construção dos trechos leste e norte, além da operação do sul. De qualquer forma, a possibilidade de exploração já atrai a atenção das empresas.

“O interesse da CCR pelo trecho sul é natural, uma vez que a empresa acompanha de perto as oportunidades de licitações no setor de concessões de rodovias em São Paulo e, além disso, administra o trecho oeste do anel viário desde 2008. “Acreditamos que a experiência que estamos conquistando com a gestão do trecho oeste do Rodoanel será também um importante diferencial competitivo no processo”, afirma Renato Vale, presidente da CCR.

As construtoras que participam do trecho sul também pretendem continuar no negócio. A Construtora Norberto Odebrecht, em parceria com a Constran, é responsável pelas obras do lote 2 em construção. Roberto Cumplido, responsável pelo consórcio Arconsul, que une as duas companhias, lembra que seu lote é de sete quilômetros, mas “muito acidentado”, com cerca de 20 pontes e viadutos.

O contrato com o consórcio rendeu R$ 495 milhões, em valores de 2006. Para a conclusão da obra foram usados três “túneis falsos”, importados e montados em Taubaté, no interior do Estado, e instalados na estrada. Segundo Cumplido, a Odebrecht aguarda a definição do governo para saber se será concessão ou obra pública. “Estudaremos de uma forma ou outra.”

O trecho leste irá ligar a cidade de Mauá, no ABC paulista, à rodovia Presidente Dutra, numa via de mais de 43 quilômetros. Mauro Arce diz que o processo está em fase de audiência pública. Os custos devem girar em torno de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões. “Já foram retiradas 1.400 famílias do local”, afirma o secretário. O programa todo prevê 99 medidas compensatórias, entre desapropriações, criação de parques para a população e para preservação ambiental. Já foram canalizados mais de R$ 400 milhões em recursos. “Ao implementar uma rodovia, um pedaço da mata ou do campo é afetado. Mas esse é o preço que tem de ser pago”, avalia Clara Kaiser, professora do departamento de projetos de transportes da Universidade de São Paulo. Para ela, a obra está “atrasadíssima” no sentido de resolução dos problemas de transporte da cidade. “Em 1971, quando saí da faculdade, meu primeiro estágio foi em um projeto ligado ao Rodoanel”, revela. Há quem tenha críticas mais ácidas aos efeitos da nova via.

“As medidas não são mitigatórias o suficiente. É apenas um pouco de maquiagem verde”, dispara Carlos Bocuhy, presidente do Proam (Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental), ONG que trabalha pela sustentabilidade do meio ambiente. “Cada vez mais se está trabalhando para priorizar o transporte por automóveis. No futuro, haverá uma saturação dessa via e a explosão da ocupação. Teremos a necessidade de um outro Rodoanel”, afirma Bocuhy.

O governo do Estado espera entregar a obra completa do Rodoanel até maio de 2014. Para isso, terá de vencer a parte mais polêmica do projeto – a construção do trecho norte. A expectativa é que as obras consumam algo como R$ 5 bilhões, em 18 quilômetros de rodovia. Segundo Arce, o primeiro traçado proposto previa que a via passasse pelo meio da Serra da Cantareira, considerada a maior floresta em área urbana do mundo. As discussões, diz o secretário, levaram a um segundo traçado, posterior à serra. “Agora, estamos discutindo um traçado que passe no final da mancha urbana da cidade, na parte baixa da Cantareira, o que exigirá um grande número de túneis e viadutos para afetar o mínimo o meio ambiente e as desapropriações.”

Autor: Valor