Complexo com espaços de dança e ópera que ficará em frente à Sala São Paulo vai ocupar espaço de antiga rodoviária
Projeto é da renomada dupla suíça Herzog & De Meuron, que fez a Tate Modern, em Londres, e tem influências de Lina Bo Bardi
É o oposto da Sala São Paulo. Enquanto a mais famosa sala de concertos do país é indevassável para quem anda na rua, o complexo cultural que o governo paulista planeja construir do outro lado da praça, onde ficava a antiga rodoviária, será transparente: ensaios de dança e de música poderão ser vistos da rua, como mostram os primeiros desenhos do prédio, obtidos pela Folha.
Foi esse ponto de vista, o da transparência, que os arquitetos suíços Jacques Herzog e Pierre de Meuron adotaram no primeiro projeto que fazem na América Latina. Herzog e De Meuron, ambos de 59 anos, são a dupla mais famosa da arquitetura mundial e criaram, entre outros ícones, o Ninho de Pássaro, em Pequim, e a Tate Modern, em Londres.
O complexo abrigará um teatro de dança e ópera com 1.750 lugares, outro para peças e recitais com 600 lugares e uma sala experimental de 400 lugares. Terá 95 mil m2 de área construída, o equivalente a quatro vezes o Pavilhão da Bienal (que tem 25 mil m2).
Vai ocupar duas quadras, cujos imóveis serão desapropriados e demolidos: a da antiga rodoviária e a contígua. A região da Luz já tem uma das maiores concentrações de espaços culturais da cidade. Lá ficam a Pinacoteca, a Estação Pinacoteca, o Museu da Língua Portuguesa e a Sala São Paulo.
A abertura total do complexo cultural não é para já, segundo o secretário de Cultura, João Sayad. Para ele, os problemas de violência na Cracolândia tornam inviáveis esse ideal.
“A Sala São Paulo é de fato um bunker. O teatro começa como um bunker para, quando houver condições, se abrir para o público. Se deixar aberto agora, vem gente dormir aqui. É irreal colocar mesinha na praça porque há risco de assalto”, diz.
Quatro escritórios internacionais de arquitetura foram convidados para apresentar projetos -o do britânico Norman Foster, o holandês OMA, o do americano Cesar Pelli e o de Herzog e De Meuron.
Só a dupla suíça não apresentou nenhum esboço prévio. Diziam que não fazia sentido imaginar algo sem conhecer a cidade. Vieram a São Paulo e ficaram encantados com duas características, segundo Sayad: as árvores e a arquitetura de Lina Bo Bardi, Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha. “Eles me disseram uma coisa que me surpreendeu: para eles, São Paulo é uma cidade verde.”
As duas características estão presentes no projeto. As árvores ficarão num bosque na entrada do complexo. Referências à arquitetura modernista brasileira podem ser vistas numa rampa de 14 metros de largura, que tem um porte similar ao da rampa do Palácio do Planalto de Niemeyer.
A transparência do prédio parece ser uma evocação da Casa de Vidro que Lina Bo Bardi construiu para ela e para o marido, Pietro Maria Bardi, no meio de um bosque no bairro do Morumbi.
Sandra Rodrigues, gestora do projeto do complexo cultural, relata que Herzog e De Meuron diziam o tempo todo que adoravam a arquitetura brasileira: “É muito evidente no projeto a referência à casa de Lina Bo Bardi. Eles ficaram encantados com a Casa de Vidro”.
Mais de R$ 300 mi
A construção do complexo deve consumir R$ 311,8 milhões, segundo a Secretaria de Cultura. Desse valor, o governo entra com R$ 78,1 milhões e os R$ 233,7 milhões restantes serão pedidos como empréstimo ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Herzog e De Meuron devem receber entre 6,5% e 8,5% do valor da obra -algo entre R$ 20,3 milhões e R$ 26,5 milhões.
A obra está prevista para começar em julho do ano que vem e deve durar três anos. As desapropriações da primeira quadra já alcançam 70% dos imóveis e a da segunda devem começar em três meses, de acordo com Rodrigues.
Sayad diz que o governo optou pelo empréstimo internacional para que, caso o PSDB seja derrotado em 2010 nas eleições para o governo do Estado, haja uma garantia de continuidade para a obra.
Hoje responsável por obras da magnitude do Rodoanel (orçada em R$ 3,5 bilhões), o governador José Serra prega a valorização dos projetos na área de Cultura. Citando o exemplo de Mário Covas (1930-2001), governador morto em 2001, Serra repete que, por mais que invistam em infraestrutura, é na cultura que os governantes deixam sua marca.
Autor: Folha de S.Paulo