Sinto-me imensamente honrado em vir aqui para proferir algumas palavras, como um dos 100 homenageados.
De início, apressamo-nos em agradecer as palavras de saudação do Sr. presidente da Casa, recepcionando-nos de forma muito significativa nesta cerimônia inédita de homenagem aos engenheiros nikkeis de São Paulo.
Agradecemos também ao professor Marcel Mendes, diretor da Escola de Engenharia Mackenzie, a sua rica alocução em que igualmente nos homenageia, revelando um notável conhecimento de temas ligados à comunidade nikkei do Brasil.
Assistimos, ao longo deste ano, ao ano do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, inúmeros eventos para lembrar a presença nikkei no Brasil, nos mais variados campos de atividades: na agricultura principalmente, mas também no comércio e na indústria, nos serviços públicos, no magistério, nas profissões liberais e ainda nas manifestações culturais, científicas, esportivas, gastronômicas e de lazer.
E hoje somos nós que estamos aqui sendo alvos desta calorosa recepção, representando simbolicamente os milhares e milhares de engenheiros nikkeis formados no Estado de São Paulo.
Numa tentativa de falar algo sobre nós mesmos, começaria por dizer, repetindo dados e fatos já citados pelo prof. Marcel Mendes. Só em 1931 que se formou o primeiro engenheiro nikkei, o respeitado Takeo Kawai.
Mais que isso, ele foi o primeiro descendente que se formou no Brasil numa autêntica faculdade brasileira. Nos cinco anos seguintes, ainda na década de 30, formaram-se três outros engenheiros. Vale lembrar que os engenheiros foram os nikkeis pioneiros em ter uma formação universitária, uma vez que os primeiros advogados descendentes só se formariam em 1936 e o primeiro médico apenas em 1939.
Esses primeiros engenheiros nikkeis, formados na década de 30, eram nascidos no Japão. Aliás, de todo o nosso grupo dos 100 pioneiros, cerca de 40% nasceram no Japão. Naturalizaram-se brasileiros após terem atingido a maioridade.
Todos eles chegaram ao Brasil ainda crianças, acompanhando seus pais, que vieram como imigrantes para trabalhar nas fazendas de café. Embora menores de idade, tiveram que ajudar no duro trabalho da lavoura, dia após dia, de sol a sol, submetendo-se aos rigores do clima, alimentando-se de comida simples e sempre igual e morando em habitações toscas, destituídas de qualquer conforto.
Mesmo os que nasceram no Brasil, nos primórdios da imigração, brasileiros, portanto, tiveram que passar a infância por idêntica situação de sacrifícios e lutas.
Nessa ocasião, havia como sempre houve, por parte dos pais japoneses, uma grande preocupação com a educação dos filhos. Queriam que eles estudassem para serem pessoas instruídas e se tornassem alguém mais do que eles próprios, mais do que simples trabalhadores da roça.
No entanto, não havia escolas onde eles moravam. Os imigrantes construíram, então, comunitariamente, suas próprias escolas onde eram ensinadas a língua e a cultura japonesas e noções de matemática. Esses conhecimentos, todavia, não serviam de base para estudos mais adiantados.
Foi, então, que se iniciou a corrida de grande número de jovens nikkeis para as cidades maiores e para a própria capital.
A história de grande parte dos colegas que compõem o nosso grupo, em sua juventude, confunde-se com essa fase. Eles foram encaminhados para onde existiam escolas, que eram sempre distantes da casa. Inicialmente, tiveram que andar diariamente quilômetros e quilômetros para cursar o grupo escolar.
Depois, tiveram de deixar suas casas para fazer o ginásio numa cidade maior próxima e, por fim, fazer o colégio ou a escola profissional e o curso de engenharia em São Paulo ou em outras cidades como Piracicaba, São José dos Campos e São Bernardo do Campo.
Há histórias e mais histórias, por todos conhecidas, dos imensos sacrifícios que tiveram que fazer tanto os pais como os próprios estudantes nessa difícil e árdua trajetória em busca de instrução.
Quando nós chegamos aos cursos de engenharia, mais de meio século atrás, nós, nikkeis, éramos em número reduzidíssimo. Tanto é que foram necessários 24 longos anos, ou seja, de 1931 até 1955, para compor este grupo dos 100 primeiros nikkeis graduados em engenharia.
É interessante notar que nós não tínhamos nenhuma preocupação de sermos ou não os primeiros descendentes de japoneses a freqüentar os cursos. Éramos simplesmente iguais em tudo aos outros alunos, nada de especial e nada de meritório. Tínhamos apenas uma fisionomia diferente, denotando uma ascendência oriental.
Por esse motivo, o fato de estarmos hoje sendo lembrados e da homenagem que estamos recebendo, nos enche de orgulho e satisfação. É o reconhecimento que estamos tendo, como aqueles que decidiram trilhar um caminho inteiramente desconhecido na nascente comunidade nipo-brasileira.
Depois de formados, fomos trabalhar nos mais variados setores da profissão, no imenso Brasil do pós-guerra que começava a crescer num ritmo acelerado. Fomos reconhecidos em nossas atividades porque procuramos ter sempre presente em nossas mentes aquilo que aprendemos em casa de nossos pais e avós: a honestidade, a disciplina, o esforço incansável e a dedicação e a seriedade no trabalho.
Hoje, os estudantes nikkeis enchem as salas de aula das escolas de engenharia. São centenas numa única série. E, é bem possível que o caminho que nós trilhamos nas faculdades e na profissão tenha sido uma luz para muitos deles.
E, se pudermos dizer algumas palavras aos estudantes nikkeis de engenharia de hoje, diríamos o seguinte: tenham sempre presente a grande responsabilidade dos engenheiros no crescimento ainda maior do Brasil.
Do Brasil como o grande celeiro do mundo, do Brasil do petróleo abundante extraído de grandes profundidades sub-oceânicas, da avançada indústria aeronáutica, da tecnologia espacial, do trem de grande velocidade cortando o vasto território nacional e de tantos outros empreendimentos de vulto e de ponta. Estudem sempre, não se acomodem, mantenham-se atualizados e, sobretudo, sejam corretos em tudo e sempre.
Ao finalizar, queremos dizer que sentimo-nos imensamente honrados pela homenagem que recebemos. Externamos ao Instituto de Engenharia, na pessoa do seu ilustre presidente Eng. Edemar de Souza Amorim, os nossos profundos agradecimentos.
Ao vice-presidente do Instituto, Eng. Paulo Ferreira, que supervisionou de modo brilhante e com eficácia a marcha dos trabalhos da comissão; ao Eng. Mario Saito que se mergulhou integralmente no projeto durante meses seguidos, numa dedicação sem paralelo; e também a todos os incansáveis membros e colaboradores da comissão queremos dizer um muito obrigado por tudo que fizeram por nós.
Em derradeiro, cumpre-nos nos referir, com emoção e saudades, os colegas que deixaram o nosso convívio, no decurso da vida profissional, mas que estão aqui simbolicamente presentes por meio de seus representantes.
Eles foram nossos grandes amigos, companheiros de ideais e de sonhos, de lutas e de angustias, e de muitas alegrias também. Foram o orgulho de suas famílias e exemplos de vida a serem seguidos. A eles rendemos aqui as nossas respeitosas homenagens.
Muito obrigado.
Autor: Paulo Soichi Nogami