Asfalto e político costumam trafegar juntos na mesma faixa de rodagem em ano eleitoral. Há pico de consumo do produto nos anos pares quando prefeitos, governadores e presidente liberam verbas do orçamento para obras de pavimentação e a manutenção de ruas, avenidas e estradas.
A forte demanda deste ano acabou sendo reforçada pela agenda de investimentos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e investimentos da iniciativa privada nos programas de concessões de rodovias, como Rodoanel paulista, Fernão Dias (São Paulo-Belo Horizonte) e Régis Bittencourt (São Paulo-Curitiba).
O impulso por mais asfalto também vem dos Estados. Minas Gerais obteve empréstimo de R$ 2 bilhões no Banco Mundial (Bird) e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para asfaltar 225 rodovias. São Paulo investirá cerca de R$ 1 bilhão entre 2007 e 2009 para recuperar cerca de 4,5 mil quilômetros de estradas vicinais.
O resultado é que o consumo de asfalto está provocando a escassez e o racionamento do produto em certas regiões. O problema já tem atrasado a conclusão de algumas obras de pavimentação de rodovias, necessárias para o escoamento de produtos e mercadorias.
“Há equipes de trabalho que ficam dias esperando o asfalto, o que causa um prejuízo ao construtor”, diz o consultor Armando Morilha Júnior, da Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor), que reúne empresas construtoras de infra-estrutura.
O consumo de asfalto em 2008 deve voltar a atingir o maior nível dos últimos dez anos, com 1,85 milhão de toneladas, segundo dados da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfalto (Abeda), que reúne duas dezenas de empresas, com 60 usinas de industrialização de asfalto no país.
A Petrobras, única fabricante de asfalto no país e dona da BR e agora da Ipiranga Asfaltos, duas das maiores distribuidoras do setor, bateu o recorde de produção em julho, quando processou 236 mil toneladas nas nove refinarias que produzem o derivado do petróleo no país. O recorde anterior era de setembro de 1998, quando a estatal fabricou 211,5 mil toneladas.
“Se a demanda de julho se repetir nos próximos 12 meses, o mercado brasileiro passará a ser de quase 3 milhões de toneladas por ano”, diz Morilha Júnior, da Aneor. Atualmente, a estatal possui capacidade de produção de asfalto de 2,5 milhões ao ano, suficiente para atender o consumo brasileiro.
Mas o investimento que a Petrobras tem realizado para modernizar e ampliar o seu parque de refino tem afetado o abastecimento das distribuidoras de asfalto. Obras de expansão da refinaria da Petrobras no Paraná, que paralisaram as atividades da unidade por um mês, limitaram a oferta de asfalto, segundo distribuidores.
“Isso fez com que grande parte do mercado do Sul do país fosse atendido pelas refinarias de São Paulo”, diz o presidente da Abeda, Éder Vianna. “Um caminhão que trafegava 500 quilômetros (para levar o asfalto) passou a circular por 1,5 mil quilômetros. Isso acaba tendo um custo.” Refinarias da Petrobras chegaram a fixar cotas de vendas às distribuidoras.
A previsão é que a refinaria de São José dos Campos (SP) pare em outubro para obras de expansão e manutenção, o que deve provocar transtornos, segundo os distribuidores. Os especialistas avaliam que o risco de falta de produto só será eliminado com a operação das novas refinarias – quatro delas no Nordeste e uma no Rio de Janeiro – previstas para a próxima década.
Mas isso não eliminaria o nó logístico no transporte de asfalto para a região Oeste, segundo especialistas do setor. Isso porque o produto é distribuído a partir da base da refinaria de Betim (MG), gerando um alto custo no frete. Procurada, a Petrobras não retornou o pedido de entrevista.
A retomada das obras de infra-estrutura tem mostrado os gargalos também na rede de distribuidores. Faltam desde caminhões a tanques. Os distribuidores estão esperando até seis meses para receber um caminhão novo. Encomendas de tanques especiais, que custam cerca de R$ 120 mil para manter o produto aquecido a temperatura de 180 graus centígrados para evitar que o asfalto se perca, entram em lista de espera.
Embora alguns técnicos indiquem a necessidade de importação de asfalto, não há no país um terminal especializado nem tanques e dutos aquecidos para acomodar o asfalto quente. “A logística para importação é muito complicada e cara”, diz Vianna, da Abeda.
No setor desde 1959, ele conta que a única importação de asfalto no país foi realizada para a construção da rodovia Rio-Bahia, em 1962. “Foi um desastre. O navio se perdeu em alto mar”, conta.
Temeroso de que o problema se agrave nos próximos anos, um grupo de entidades ligadas ao setor está pedindo ao governo um inventário das futuras obras de pavimentação e manutenção das rodovias federais. A intenção é estimar a quantidade necessária para atender a demanda de um dos maiores consumidores de asfalto de modo a programar os investimentos das empresas de distribuição, construtoras de infra-estrutura e fabricantes de máquinas e equipamentos para o setor.
“A idéia é elaborar uma programação das obras federais em cada Estado e atender melhor a demanda do setor”, diz Morilha Júnior. As rodovias federais somam cerca de 175 mil quilômetros no país.
Segundo Vianna, o melhor planejamento das obras evitaria a falta do asfalto em momentos pontuais.
“Como não há um consumo linear e existem períodos de picos que levam a falta do produto, o setor precisa ser muito cauteloso para investir”, diz. A previsão do setor, que deve faturar R$ 3 bilhões este ano, é investir cerca de R$ 180 milhões em 2008.
Autor: Valor Econômico