O ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, participou de evento no Instituto de Engenharia, dia 29 de julho, para falar sobre a atual situação do agronegócio no Brasil e no mundo.
Os principais pontos discorridos por Rodrigues foram: a questão alimentar, etanol e biocombustíveis. Ele explicou o que está acontecendo na agricultura mundial e o espaço que esta crise abre ao Brasil, sob o ponto de vista de uma maior inserção internacional.
A primeira discussão de seu debate foi sobre a crise dos alimentos, que tem preenchido as capas dos jornais. Ele argumentou que não há crise de alimentos, mas sim um desequilíbrio entre a oferta e a demanda. A procura explodiu, porque nos países em desenvolvimento a renda per capta está crescendo 7,1% aa, enquanto nos desenvolvidos 2,2% aa. “Na nação desenvolvida, se um cidadão passa a ganhar mais, provavelmente ele não comerá nem um ovo a mais. Já em um país pobre, quando a renda aumenta de U$ 200 para U$ 400, o cidadão triplica o consumo em comida, roupas, sapatos e tudo o que vem da agricultura”, comentou.
A população, de acordo com dados da ONU, vai aumentar até 2030 em mais de dois bilhões de pessoas. “Sairemos de mais de seis bilhões para mais de oito bilhões, ou seja, 30% a mais de pessoas no mundo, precisando suprir suas necessidades básicas”, disse.
Destes dois bilhões, 85% crescerão na Ásia e na África, os continentes mais pobres do mundo. O mercado que está surgindo é gigantesco e levou a uma explosão de demanda, sem que a oferta acompanhasse, por várias razões. A primeira delas foi o período de secas, entre os anos de 2004 e 2006, no Brasil. Tal fato fez com que o país deixasse de produzir 40 mil toneladas de grãos.
No mesmo período, também houve seca na Europa Central, na Argentina e na Austrália. Os estoques de milho, arroz e trigo baixaram para 65%, em comparação há dez anos. O resultado foi uma reação rápida do mercado, com aumento de preços.
Rodrigues afirmou que, entre outras razões, para justificar a falta de alimentos estão: a subida dos custos de produção (petróleo, fertilizante e aço tiveram seus preços aumentados); os fundos de investimentos, que saíram da área imobiliária americana e passaram a investir em alimentos; a quarta parte do milho americano, que virou álcool ao invés de comida, fazendo com que os preços do milho aumentassem. “E jogaram a culpa no etanol”, brincou. Não se pode esquecer, ainda, do protecionismo dos países desenvolvidos, que resguardam seus produtores de crises mundiais. E para os americanos o tema principal atualmente é segurança energética.
Outro fato importante é que o etanol americano tem subsídio e protecionismo, diferente do brasileiro. “Não se pode misturar cana e milho no mesmo barril, são matérias-primas diferentes com custos diferentes. No Brasil, ao contrário do que se tentou afirmar, não há competição entre etanol e alimentos”, explicou. Tanto é verdade que, este ano, houve a maior safra de grãos de milho dos últimos tempos: 140 milhões.
Nos últimos dez anos, a produção agropecuária aumentou, sem acordos multilaterais e graças à eficiência dos agricultores brasileiros, que incorporaram a tecnologia de empresas como a Embrapa.
A FAO estabelece que, nos próximos 20 anos, a demanda de alimentos crescerá 42%. Rodrigues acha que este é um número conservador. “Vai crescer no mínimo 50%. Em termos mundiais, crescer 2,5% ao ano, é algo importante”.
Doha – Rodrigues falou sobre o fracasso da Rodada de Doha. “A grande prejudicada é a própria OMC, pois perde credibilidade e a capacidade de resolver problemas. A falta de acordos claros (porque mantém o protecionismo) que estabeleçam regras claras é um fator adicional para a crise de alimentos”, afirmou contundentemente.
Biocombustíveis – A Agência Mundial de Energia calcula que, nos próximos 30 anos, a demanda por combustíveis líquidos aumentará mais de 55%, ou seja, um número maior do que a demanda de alimentos. “Está óbvio que o petróleo não atenderá esta demanda. Ou pelo menos a preços compatíveis”.
Desta maneira, o biocombustível é uma alternativa importante, porque deriva de produtos renováveis, ambientalmente muito melhores. Também geram empregos, riqueza e renda, em países tropicais e sobretudo permitem mudança na geopolítica mundial, afinal a agroenergia, o biocombustível, o etanol e o biodiesel são diferentes de alimentos. “Porque alimento pode ser produzido em qualquer país do mundo, inclusive na Sibéria. E o biocombustível não é produzido sem sol”, explicou. Ou seja, apenas nos países entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio (América Latina, toda a Ásia pobre e alguns da África).
O ex-ministro afirmou que haverá um crescimento da produção de biocombustíveis, nas nações tropicais, à base de cana e de celulose, gerando emprego, riqueza e renda, financiado pelos países demandantes.
Segundo ele, o mercado de etanol não existe por razões consideradas gargalo. Primeiro, só há um país exportando, que é o Brasil. A segunda é a legislação: no Brasil o Pró-álcool só obteve sucesso quando houve a obrigação de misturar álcool à gasolina, fato que deveria ser feito em outros países. Terceiro, é necessário uma estratégia global. Há a discussão do milho americano, do trigo europeu e da uva sul-africana, mas nada avança. E o quarto e, talvez mais importante, é que a mudança geopolítica não vem sendo conduzida por nenhum país, nem pelo Brasil. “Ninguém sabe quanto álcool deve ser produzido, nem o setor privado, nem o público, como será a logística, entre outros. O Brasil não sabe para onde vai o álcool. Apesar de conhecer o assunto, não consegue liderar no mundo”, lamentou.
Importância do agronegócio no Brasil – O agronegócio representa 25% do PIB nacional; 37% dos empregos no país, 36% das exportações do Brasil e 112% do saldo comercial (porque os outros setores estão crescendo competitivamente). Nos últimos 15 anos, a área plantada com grãos cresceu 24% e a produção 127%. A produção de frango cresceu 201%. A suinocultura 130%.
Nenhum país no mundo fez a revolução tecnológica que o Brasil fez, o que ajuda na duplicação da produção de grãos (hoje o Brasil tem 72 milhões de hectares de área plantada)
“É preciso resolver alguns problemas, pois existem muitos mitos. Falar que vai faltar comida por causa do etanol é um absurdo”. Para Rodrigues, o que falta são políticas públicas que resolvam o problema do agronegócio. “Fazendo uma avaliação, tudo o que envolve o agronegócio está dividido entre os 11 ministérios. Para o Ministério da Agricultura sobram apenas os problemas. Achei ótimo quando o governo federal disse que o agronegócio agora é um problema de governo”, finalizou.
Autor: Viviane Nunes