Se não chega a impedir, atrapalha. Esta é a lógica das conseqüências que uma ação civil pública com pedido de liminar para suspender o leilão da Usina Hidroelétrica de Jirau pode trazer. Programado para acontecer na próxima segunda-feira, dia 19, o leilão de Jirau, que faz parte do Complexo do Rio Madeira, em Rondônia, é a aposta do governo federal para evitar um apagão em 2010. Ontem, porém, o Instituto de Proteção e Defesa dos
Consumidores e Cidadãos do Brasil (IPDCB) entrou na Justiça Federal com uma ação civil pública, que pede a suspensão do leilão.
O Instituto defende na ação movida contra a União e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que há no edital “limitações que oneram em demasia o consumidor final”. Seu principal argumento é o de que, para se receber a outorga, as regras do leilão determinam a criação de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), modelo que se mostra desnecessariamente oneroso.
“Por ser uma empresa nova e autônoma, a estruturação do negócio em SPE provocará custos tributários e contábeis mais elevados que os de um consórcio de empresas previamente existentes”, explicou Fernando Rocha Filho, advogado do Instituto. “Essa imposição cria um entrave enorme na competitividade do leilão, porque aumenta os custos do investimento e afasta os grandes alto produtores de participar”, completou Rocha Filho.
O mesmo modelo, com exigência do SPE e que foi usado no edital para o leilão de Santo Antônio, inibe a concorrência, diz o advogado. Segundo estudos do Instituto, a taxa interna de retorno do investimento a ser obtido por uma SPE alcançará, no máximo, 15%. No modelo de consórcio empresarial, a taxa de retorno alcançará 30%. Rocha Filho defende na ação que a modalidade “consórcio de empresas” terá melhores condições para oferecer deságios maiores ao consumidor final.
“Menor concorrência significa encarecimento das tarifas para o consumidor”, afirmou o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que esta semana solicitou ao Ministério de Minas e Energia e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a suspensão do leilão da Usina de Jirau. Ao justificar o pedido, Dias denunciou que o edital para a habilitação dos consórcios de empresas interessadas na construção da obra contém regras que contrariam a lei de livre mercado e favorecem somente um grupo já habilitado – Furnas-Odebrecht. “Ele exclui a participação de um maior número de empresas e parece um edital direcionado”, afirmou o senador tucano.
Em um ensaio matemático elaborado pelo Instituto, ao longo de 30 anos de concessão, se for trocado o modelo por outorga de SPE, cada centavo maior no preço da tarifa gera, ao término do período, um prejuízo de R$ 3,5 milhões para o consumidor. “É uma diferença grande entre os dois modelos. Isso restringe a competitividade, é comum pelo menos 5 a 6 consórcios participarem de um leilão como esse”, contou. Ontem, a Aneel confirmou a participação de dois grupos de empresas (Furnas-Odebrecht-Cemig e Suez-Eletrosul-Chesf-Camargo Corrêa).
Rocha sabe, no entanto, que a corrida agora é contra o tempo, mas é otimista. “Temos um prazo curto, mas é possível apreciar a liminar e, se aceita, fazer uma readequação no edital”, completou. A preocupação com o tempo deve ser também a do governo, que precisa estar blindado para as ações que ainda podem surgir.
Quanto ao relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), que aprovou os estudos de viabilidade econômica e técnica da obra, o advogado diz que a corte não analisou o aspecto da SPE. “Não tem um parágrafo sobre o fato de ser SPE”, contou.
Diante da possibilidade de haver uma enxurrada de ações contra a realização do leilão e pedidos de liminar ajuizados por empresas e órgãos oficiais de proteção ao consumidor, o senador Álvaro Dias disse que seria melhor uma solução administrativa por parte do governo, o que, a seu ver, teria efeito mais imediato para a suspensão do leilão eletrônico. “O ideal é alterar a data do leilão, fazer uma nova análise do edital e, se houver razão, alterar o texto”, explicou Dias.
Para o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), titular da Comissão de Minas Energia na Câmara, o modelo de edital com a exigência de SPE é o melhor. “É isso que dá transparência à contabilidade das empresas, é justamente a vantagem do edital”, afirmou. Jardim defende ainda a emergência do tema.
“É mais do que compreensível a urgência em razão do risco de escassez de energia. É preciso pisar no acelerador, mas não estou dizendo com isso para abrandar as exigências ambientais, por exemplo”, disse.
Autor: DCI – Patrícia Acioli e Bruno Deiro