Ainda sob o impacto da destruição dos planos e sonhos de 200 famílias, começam as discussões sobre quem será escolhido o bode expiatório da vez, em mais uma operação de salvamento dos verdadeiros culpados da tragédia do vôo 3054.
Antes de mais nada se deve reconhecer que a execução das ranhuras no pavimento (grooving), que se dá 45 dias após o término do pavimento, está rigorosamente dentro do prazo, sendo necessária apenas em tempo chuvoso.
A decisão de manter a pista aberta para pousos e decolagens após dois dias de chuvas em São Paulo, não é da engenharia, nem tão pouco das companhias aéreas. É da Infraero, da aeronáutica, do ministro da defesa, do Presidente da República, enfim dos responsáveis pela aviação brasileira.
Por isto que o acidente do Vôo 3054 não é decorrente de problema técnico. É uma conseqüência gravíssima da má gestão pública, pois se a pista não reunia condições de pouso, porque os investimentos em infra-estrutura são insuficientes, os gestores não reúnem competência mínima para realizar as obras necessárias e a corrupção impede que o pouco dinheiro disponível seja utilizado da melhor forma.
Mas que o cidadão comum não se engane ao acreditar que esta é uma situação excepcional. É apenas mais uma tragédia diária comum que marca a vida dos brasileiros. Sua notoriedade se dá pela concentração de vidas envolvidas em um só episódio. Pois, dos 56 mil brasileiros – o equivalente a 280 acidentes como o de terça-feira – que morrem anualmente nas estradas, ou das 1336 pessoas (6,5 vezes mais que o vôo 3054), que foram mortas a tiros na cidade do Rio de Janeiro nos últimos seis meses, nada é dito ou feito.
É hora de se encarar os fatos e aceitar a verdade nua e crua. O culpado é o poder público e todos aqueles eleitos para cuidar do patrimônio público e dos serviços aos cidadãos, que não conseguem cumprir com suas obrigações, não atendem as necessidades de uma nação de 200 milhões de habitantes, ou sequer honram seus mandatos conquistados à custa do mais puro populismo.
Porém, enquanto os gabinetes dedicam seus dias discutindo as vaias recebidas nas solenidades, o cidadão comum arrisca sua vida num país que cai aos pedaços porque seu dinheiro é gasto em atitudes eleitoreiras e irresponsáveis.
Autor: Edemar de Souza Amorim