O processo de urbanização de muitas cidades brasileiras contribuiu para a impermeabilização do solo. Em São Paulo, por exemplo, houve a canalização de córregos e rios que impedem a vazão natural das águas. Desde 2012, grandes obras são previstas no Plano Diretor de Drenagem do Município de São Paulo para receber cheias.
Uma das principais prioridades da prefeitura, conforme atualização do documento em 2022, é a criação de piscinões. Para José Eduardo Cavalcanti, coordenador da Divisão Técnica de Águas e Saneamento, essa solução é uma das formas de conter grandes precipitações de chuva em cidades com pouca área verde, o caso de São Paulo e de grandes centros urbanos.
“Em cidades menores, ainda dá para fazer canais paralelos e não deixar que haja ocupação nas margens dos rios”, observa Cavalcanti. Em entrevista exclusiva à InfraFM, o especialista fala sobre possíveis alternativas diante das mudanças climáticas, com destaque para o conceito de cidades-espoja.
Quais são os desafios das cidades-esponja no Brasil?
José Eduardo Cavalcanti – Bom, o termo Cidades-Esponja foi cunhado há algum tempo e propõe como as cidades podem pensar meios de escoar melhor as águas, seja superficialmente ou através da infiltração no solo, por isso se chama cidade-esponja, no sentido de que as águas seriam absorvidas como esponja. Isto é, uma forma de você reter as águas para que elas sejam controladas e lançadas de uma forma que não cause inundações, alagamentos, deslizamentos, movimentação de massa, como ocorreu em São Sebastião ou no Rio Grande do Sul. Agora, essas cidades-esponja teriam que ser em cidades menores.
Uma cidade como São Paulo, que é uma cidade totalmente impermeabilizada, não dá para você fazer infiltrações na área urbana. A infiltração é uma das providências que o criador do conceito, o arquiteto Kongjian Yu, preconiza para essas cidades esponjas, mas não é só infiltração, afinal o solo não tem tanta capacidade assim de absorver água porque ele acaba saturando. É natural, não há como o solo aguentar. Se você botar água na esponja cheia, a esponja não absorve mais.
Mas esse arquiteto chinês, criador do conceito de cidades-esponja, propõe uma coisa mais ampla: ele propõe espaço para as águas ficarem estocadas enquanto não são lançadas nos rios maiores ou nos mares, né? Que são uma espécie de piscinões.
Todo rio, na realidade, tem dois leitos. O leito menor, que é o leito que você vê quando não está chovendo, e o leito maior, também conhecido como águas espraiadas. Por exemplo, no Rio Grande do Sul, temos o Guaíba e ele se espalhou numa área que é o leito maior dele. Nesse leito maior, foram construídas habitações e até cidades. Com grandes chuvas, o rio ocupa o espaço dele e inunda tudo. O Kongjian Yu propõe que se faça canais paralelos aos rios para que essas águas se espraiem nesses canais e depois, com calma, sejam lançadas. Essa é a realidade do que ele está propondo.
Assim, um dos maiores desafios no Brasil é a nossa educação sanitária e ambiental, pois se joga muito lixo nas ruas. Os piscinões de São Paulo, por exemplo, ficam atolados de lixo. Em países como o Japão, que também tem piscinões, eles são feitos em túneis subterrâneos e as águas são bem mais limpas e depois podem ser aproveitadas. Lá na França, foi construído um piscinão enorme junto ao Rio Sena, justamente para pegar as primeiras águas de chuva e depois, através de bombeamento, essa água ser lançada no Rio Sena com calma.
As cidades-esponja podem ser alternativas diante dos fenômenos climáticos? Se sim, por quê?
José Eduardo Cavalcanti – Podem. Numa cidade que tem carência de água e de repente cai uma tremenda chuva, esses reservatórios podem ser utilizados depois como reservatórios urbanos e depois ser realizado o reuso dessa água. No Brasil, no entanto, é preciso primeiro olhar para a educação sanitária e ambiental da população. Se você olhar os piscinões aqui na região metropolitana de São Paulo, você vê que ele está cheio de lixo, porque as pessoas aproveitam para jogar nas enchentes, por exemplo, o sofá que não serve mais.
Esses piscinões, de qualquer forma, têm quebrado o galho para algumas enchentes não serem piores, mas não têm muito deles. Em São Paulo, como falei, o solo tem uma limitação.
Como São Paulo poderia se preparar para as mudanças climáticas?
José Eduardo Cavalcanti – A construção de mais piscinões é uma alternativa, mas também seria necessário aumentar a capacidade de bombeamento do Rio Pinheiros para jogar uma parte das águas na Represa Billings. Aqui em São Paulo existe uma série de providências que podem ser tomadas, mas as mais fáceis e urgentes são os piscinões. Uma enchente, como aconteceu lá no Rio Grande do Sul, certamente vai causar muito prejuízo aqui em São Paulo.