Por José Eduardo Cavalcanti – Tratamento por flotação das águas dos rios dos poços/queimados para proteção da tomada d’água da ETA Gruandu, RJ

Introdução

Tendo em vista melhorar a qualidade da água da lagoa Guandu, (formada pelo represamento dos rios Poços, seu afluente Queimados e Ipiranga, seu afluente, Cabuçu, além do rio Guandu), utilizada pela CEDAE como tomada d’água para a Estação de Tratamento de Água do Guandú foram previstos dois sistemas de tratamento (UTR), um deles para depurar as águas poluídas dos rios Poços / Queimados, e o outro, de menor porte, para os rios Ipiranga/ Cabuçu.

Estes cursos de água urbanos, banham áreas densamente povoadas dos municípios de Japeri, Queimados e Nova Iguaçu com baixa infraestrutura sanitária, razão pela qual encontram-se bastante poluídos.

O sistema de tratamento selecionado utiliza flotação a ar dissolvido por meio de flotadores instalados nas próprias calhas do rio dos Poços (e previsto no rio Ipiranga) com suas águas previamente condicionadas por meio de coagulação seguida de floculação com sais de ferro e polímeros. Como sub produto emerge um lodo físico-químico misturado ao material orgânico originariamente presente na água, em suspensão ou em estado coloidal.

Em 2023, o INEA contratou o maior destes sistemas –  Poços/Queimados capacitado a atender uma vazão em tempo seco de 2000 L/s. A contratação deste sistema foi feita por inexigibilidade de licitação em consonância com o caput do artigo 25 da Lei Federal nº 8.666/93, tendo em vista a inviabilidade de competição, materializada pelo fato de apenas uma única empresa estar técnica e legalmente habilitada para executar o objeto pretendido.

O investimento para a implantação das UTR’s foi a preço global, conforme previsto no art. 10º, inciso II, alínea “a” da Lei n 8.666/1993, uma vez que a contratada detém propriedade intelectual, patenteada e o know-how do processo de tratamento, restando a comparação com contratações similares.

Este projeto foi selecionado em detrimento à outra alternativa também estudada pela CEDAE representada pela construção de um dique associado a uma estrutura hidráulica, de modo a impedir que as águas poluídas dos rios Poços/Queimados e Cabuçú/Ipiranga se misturem com as águas do Rio Guandu antes da captação da água. Esta estrutura hidráulica dotada de barragem, bombeamento ou de sifão conduziria estas águas para um deságue a jusante da barragem principal. Edital a respeito chegou a ser publicado em março de 2021 pela CEDAE.

Premissas adotadas

Segundo o detentor do processo, e responsável pela implantação dos sistemas, UTR’s FLOTFLUX®, as principais vantagens esperadas no tratamento dos rios contribuintes da Lagoa do Guandu seriam:

· Operação com vazões, níveis e poluições variáveis;

  • Prazo e custo de implantação e operação reduzidos, se comparados com outras alternativas;
  • Redução significativa dos problemas operacionais e custo de operação de tratamento de água na ETA Guandu, principalmente os relacionados com a geosmina;
  • Expressiva redução dos nutrientes, principalmente o fósforo, inibindo o processo de eutrofização da Lagoa do Guandu;
  • Saturação de oxigênio dissolvido na água, permitindo o retorno da macro-vida aquática;
  • Redução da mancha de poluição a jusante da Lagoa do Guandu, proveniente do esgoto sanitário não coletado e da carga difusa;
  • Devido à instalação de caixas de areia e de cerca de lixo a montante das UTR’S, os sedimentos e o lixo poderão ser removidos antes de chegarem à Lagoa do Guandu, evitando o seu assoreamento e consequentes problemas hidráulicos;
  • Redução dos processos corrosivos decorrentes da emanação de gás sulfídrico, em especial nas pontes, elevatórias, equipamentos, tubulações e infraestrutura urbana;
  • Redução do nível de toxicidade da água, o que beneficia diretamente o ecossistema aquático;
  • Redução significativa da quantidade de UFC de E.coli;
  • Alta eficiência na remoção de matéria orgânica e outros compostos que eventualmente possam ser lançados nos rios, como fenóis, óleos e graxas;
  • Alta eficiência na remoção de bactérias, vírus, oocistos de cryptosporidium, dentres outros vetores que pode causar riscos à saúde pública, sem a utilização de qualquer agente oxidante;
  • Inibição das reações bentônicas anaeróbias, devido à expressiva concentração de oxigênio dissolvido na água tratada;
  • Não utilização de compostos prejudiciais ao meio ambiente, são os mesmos produtos químicos utilizados para tratamento de água potável.”

 

Principais características do sistema implantado

Vazões

  1. UTR Rio dos Poços e Queimados: 2000 L/s

Investimento total (03/21)

R$ 74 394 705,75

OPEX (03/21)

R$ 878 529,58

Neste valor estão incluídos: custos de geradores elétricos, produtos químicos, mão de obra, energia elétrica e manutenções preventivas e corretivas.

 

Eficiências esperadas

Apesar do sistema já estar operando há cerca de 2 anos, não foram divulgados até agora dados de monitoramento, consumo de reagentes, volume de geração de lodos e sua destinação, bem como dados de performance e os impactos no tratamento de água da ETA Guandú.

Contudo, diante da indisponibilidade dos dados da CEDAE, e com base nos resultados de performance de processo semelhante implantado no rio Pinheiros em São Paulo pela própria FlotFlux, de acordo com monitoramento da Cetesb-SP, pode-se, pelo menos, antever a performance média esperada do sistema implantado nos rios Poços/Queimados.

Nestas condições, comparativamente ao que ocorreu no rio Pinheiros, as eficiências médias esperadas (%) seriam tipicamente as seguintes:

  • DBO: 42%
  • Turbidez: 68%
  • Nitrogênio amoniacal: 13%
  • Fósforo total: 89%
  • Concentração de sólidos no lodo flotado: 2%
  • A toxicidade, avaliada pelo Sistema Microtox, não foi totalmente removida, quando a água que entrava no sistema se mostrava fortemente tóxica.

Segundo o Relatório de Águas Interiores de Cetesb para o ano de 2008, “a qualidade das águas do Rio Pinheiros em São Paulo, foi intimamente afetada pelos testes do Sistema de Flotação. Como a Cetesb monitorou pontos a montante e a jusante das estações de flotação, foi possível fazer uma análise da eficiência do sistema, acima apresentada, para alguns indicadores de qualidade de água segundo os dados obtidos”. Ainda de acordo com o Relatório da Cetesb, “as amostragens realizadas em janeiro, fevereiro, março, abril e setembro no rio Pinheiros ocorreram quando o sistema não estava em operação. Portanto, o cálculo da eficiência média de cada variável de qualidade, foi realizado considerando os dados da estação em operação”.

Entretanto, somente com os resultados analíticos e operacionais, ainda não divulgados pela CEDAE, será possível fazer uma avaliação do cumprimento das premissas adotadas, incluindo gastos energéticos, consumos de reagentes, volumes e destinação dos lodos produzidos, intermitência operacional, OPEX, bem como dos reais efeitos observados na operação da ETA Guandú em decorrência do tratamento na UTR Poços/Queimados.

Fontes: DT ENGENHARIA – FLOTIFLUX – PROPOSTADE IMPLANTAÇÃO (2021), COMITÊ GUANDU www.comiteguandu.org.br/planodebacia; https://sanearioabes.com.br/wp-content/uploads/2022/04/13.04-Mesa-01.03-Joao-.pdf e FCTH – USP – AVALIAÇÃO DO SISTEMA PINHEIROS-BILLINGS COM O PROTÓTIPO DE FLOTAÇÃO – Volume 1 – Sumario_.pdf

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José Eduardo Cavalcanti é engenheiro consultor, diretor do Departamento de Engenharia da Ambiental do Brasil, diretor da Divisão de Saneamento do Deinfra – Departamento de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), conselheiro do Instituto de Engenharia, e membro da Comissão Editorial da Revista Engenharia. E-mail: [email protected]

*Os artigos publicados com assinatura, não traduzem necessariamente a opinião do Instituto de Engenharia. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo

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