Decorrido um ano desde o início do projeto-piloto denominado “Resolva aqui suas Dúvidas de Matemática” de iniciativa do Instituto de Engenharia com o apoio do Metrô e do Instituto Mauá de Tecnologia destinado à alunos do ensino médio, usuários do Metrô, já é o momento de tecermos algumas considerações sobre esta experiência inédita.
A ideia deste projeto surgiu dentro do Instituto justamente quando se discutia no âmbito do Governo Federal a reforma do ensino médio. Como se sabe, o Novo Ensino Médio, implementado em 2022 gerou muitos pontos de descontentamento, dentre os quais a redução da carga horária da formação geral básica que engloba matérias como a matemática.
A matemática, como todos sabem, é o principal pilar da Engenharia e está presente em suas diversas especialidades fazendo parte do cotidiano do profissional. Quando mal absorvida, provocam nos jovens estudantes do ensino médio frustações e horror à matéria a ponto de desestimula-los a seguir carreiras técnicas, notadamente a engenharia.
O IE, não poderia se furtar a contribuir, mesmo que de forma tímida, na mudança deste cenário, na esperança de que esta iniciativa se amplie com a participação de outras instituições e do próprio Governo.
Nossa participação neste projeto-piloto, ao longo deste ano, se consolidou na instalação em um nicho da estação Sacomã do Metrô, em frente às catracas, de uma sala de aula individual onde instrutores, engenheirandos da Mauá, de forma voluntária, todas as segundas feiras, no período da tarde, atendem aos interessados, usuários do metrô, que queiram dirimir suas dúvidas de matemática.
Afluem ao local, não só os alunos do ensino médio de escolas públicas, mas principalmente pessoas comuns que trabalham e que já concluíram esta etapa, mas que continuam a serem perseguidos pelas dúvidas de matemática não sanadas no período escolar.
Ao longo destes 12 meses, pudemos constatar que tais dúvidas se relacionaram à matemática elementar, diferentemente daquilo que supúnhamos inicialmente em que as dificuldades recairiam em conceitos matemáticos típicos do ensino médio como limites, equações, derivadas, trigonometria e outros que exigem raciocínio lógico.
Mas a realidade foi outra. Maior parte das dúvidas eram oriundas do desconhecimento da aritmética ministrada no ensino fundamental, como, por exemplo, a resolução de problemas que envolvem a utilização das quatro operações básicas da matemática e o desconhecimento da tabuada.
Este fato tem acarretado dificuldades, por parte de nossos instrutores, na tarefa de dirimir dúvidas como o cálculo de percentagem (solicitação mais comum dentre os solicitantes), uma vez que o desconhecimento de “regra-de-três” e da simples tabuada tem impedido chegar lá… O que se tem feito é passar uma espécie de “lição de casa” para que decorem pelo menos a tabuada para depois avançarem.
Com relação ainda à tabuada estivemos visitando uma escola estadual de ensino fundamental e ouvimos da diretora que a Secretaria da Educação proíbe terminantemente que os professores obriguem os seus alunos a decorar a tabuada (Tem que só entender…!),(Esta diretora, embora siga esta determinação, não concorda com ela e também com a obrigatoriedade da progressão continuada que impede a reprovação de alunos).
Ainda com relação a este assunto, indagamos de alguns alunos do ensino médio e os egressos de escolas públicas da Capital de como estão sendo ministradas as aulas de matemática., As respostas, apontam para um “circo de horrores” na medida em que professores, inertes e desestimulados, sem poder exercer sua autoridade, se limitam a apenas “cumprir tabela” dando aula para uma classe em um ambiente tumultuado onde muitos alunos, em prejuízo de outros, se ocupam de afazeres extracurriculares como falar alto em conversas paralelas e até usar o celular para jogar free fire em plena sala de aula sem serem admoestados neste “novo normal”.
Em suma, esta tem sido nossa experiência com este projeto-piloto levado a cabo no Metrô. Por conta disso, apesar dos pesares, somos estimulados a prosseguir com o projeto aspirando expandir para outras estações do Metrô e também da CPTM.
De qualquer forma, sem a ação do poder público, notadamente das secretarias da educação estadual e municipal, pouco avanço haverá particularmente no ensino da matemática
Finalizando, exortamos que os alunos do ensino fundamental pelo menos não sejam privados em aprenderem tabuada de cor e salteada sob pena de a chamada geração Z constituída por alunos egressos do ensino fundamental e básico terem tardiamente de ser apresentados à matemática para conseguirem melhores empregos.
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José Eduardo Cavalcanti, coordenador do projeto, é engenheiro consultor, diretor do Departamento de Engenharia da Ambiental do Brasil, diretor da Divisão de Saneamento do Deinfra – Departamento de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), conselheiro do Instituto de Engenharia, e membro da Comissão Editorial da Revista Engenharia. E-mail: [email protected]
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