ENIAC (Electronic Numerical Integrator and Computer) foi o primeiro computador digital e eletrônico programável do mundo. A sigla, que significa “integrador e computador numérico eletrônico”, representa um marco na história da computação. O que pouca gente sabe é que a máquina foi desenvolvida por uma equipe majoritariamente feminina: seis mulheres foram principais programadoras do computador que mudou os rumos da informática. No entanto, sua participação foi bastante ofuscada ao longo da história, e começou a ser reconhecida várias décadas depois.
Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, conheça a história do ENIAC e de Kathleen Antonelli, Jean Bartik, Frances “Betty” Holberton, Marlyn Meltzer, Frances Spence e Ruth Teitelbaum, mulheres pioneiras que ajudaram a abrir caminho para tantas outras no mercado da tecnologia.
Uma breve história do ENIAC
O ENIAC foi o primeiro computador eletrônico de grande escala do mundo. O projeto foi idealizado por engenheiros da Escola de Engenharia Eletrônica da Universidade da Pensilvânia. O objetivo era criar uma máquina capaz de realizar cálculos complexos em uma fração do tempo que levaria um ser humano.
Para programar o ENIAC — trabalho feito pelo grupo de seis mulheres —, era necessário utilizar fios e interruptores para definir as operações a serem realizadas, o que tornava o processo extremamente demorado e propenso a erros. Além disso, a programação do computador precisava ser completamente refeita sempre que uma tarefa diferente era executada. Para salvar as informações, eram utilizados cartões perfurados.
Interessado em melhorar sua inteligência de guerra, o Exército dos Estados Unidos decidiu patrocinar o projeto e investiu, na época, cerca de US$ 500 mil na invenção. A ideia era que o ENIAC pudesse ajudar nos cálculos balísticos necessários para a fabricação de munições e bombas durante a Segunda Guerra Mundial, mas a invenção só ficou pronta depois de terminado o conflito. Sua primeira apresentação pública aconteceu em 1946 e, no ano seguinte, o ENIAC foi ligado pela primeira vez. Em 1955, a máquina foi desativada, depois de ter sido usada para diversos projetos de pesquisa e desenvolvimento.
O computador era enorme. Ocupava um espaço de mais de 150 m², pesava mais de 30 t, e tinha mais de 17 mil válvulas de vácuo e cinco milhões de juntas soldadas a mão. Sua estrutura consumia cerca de 200.000 W de energia e permitia que o ENIAC realizasse cálculos em velocidades muito mais rápidas do que as máquinas mecânicas anteriores.
Pouco depois de participar do projeto do ENIAC, Betty Holberton e Jean Bartik foram contratadas pela Eckert-Mauchly Computer Corporation (EMCC), empresa focada no desenvolvimento de computadores para uso comercial e militar. Elas estiveram na equipe de criação de outra máquina que marcou a história da computação, o UNIVAC (Universal Automatic Computer), considerado o primeiro computador moderno comercial do mundo.
O papel das mulheres no projeto ENIAC
Desde a sua criação até muitas décadas depois, o papel das mulheres no projeto ENIAC foi ofuscado. As seis mulheres envolvidas no projeto não foram convidadas ao jantar comemorativo depois da primeira demonstração da máquina em 1946, que foi um sucesso, nem participaram da celebração de 50 anos da invenção.
Frances Bilas (que mais tarde passou a se chamar Frances Spence) e Jean Jennings (mais tarde Jean Bartik), foram as primeiras mulheres a programar o ENIAC, um trabalho complexo à época, mas que foi desempenhado com precisão. Outras quatro integraram o time de programadoras do ENIAC: Kathleen McNulty Mauchly Antonelli, Frances “Betty” Snyder Holberton, Marlyn Wescoff Meltzer e Ruth Lichterman Teitelbaum.
Na época em que se juntou à equipe, Bartik chegou a dizer: “Eu não tinha ideia de qual era o trabalho ou o que era o ENIAC. Tudo que eu sabia era que poderia estar iniciando algo novo e acreditava que poderia aprender e fazer qualquer coisa tão bem quanto qualquer outra pessoa”.
Durante a primeira apresentação do ENIAC à imprensa, foi utilizado um complexo cálculo de trajetória de míssil elaborado por Bartik e Holberton. Nem o sucesso da apresentação ou os resultados obtidos com o uso do ENIAC foram suficientes para que as mulheres programadoras integrantes do projeto ganhassem o devido reconhecimento à sua época. Isso só foi acontecer décadas depois.
Como tudo começou
Durante a Segunda Guerra Mundial, havia uma escassez de trabalhadores, já que a maioria dos homens em idade laboral era convocada para atuar como soldados. Então, em 1942, um anúncio no jornal Philadelphia Evening Bulletin promovido pelo exército americano buscava mulheres graduadas em matemática para trabalhar na Escola Moore de Engenharia Eletrônica da Universidade da Pensilvânia.
Kathleen McNulty Mauchly Antonelli, Jean Jennings Bartik, Frances Elizabeth Snyder, Frances Bilas Spence, Marlyn Wescoff Meltzer e Ruth Lichterman Teitelbaum foram as mulheres contratadas, além de cinco homens.
Todos eles foram contratados pelo exército para trabalhar na seção de computadores da Filadélfia, e receberam o título de Assistente de Computador. Isso significava que sua principal tarefa seria desenvolver longos cálculos em máquinas mecânicas antiquadas. As mulheres recebiam um salário inicial de US$ 1.620, o dobro do que qualquer secretária ganharia na época. Isso não necessariamente implicava em um reconhecimento, já que elas costumavam ser classificadas como “subprofissionais” ou “subcientíficas” simplesmente por seu gênero.
Por isso, cada uma das mulheres envolvidas no projeto precisou ser excepcional para alcançar o sucesso. Marlyn Meltzer é um exemplo, pois nunca errou nenhum dos cálculos solicitados a ela. O desenvolvimento delas não veio sem obstáculos sexistas, como o caso de um médico que realizou um exame físico de admissão em Jean Bartik, e a convidou para completá-lo em sua casa.
Legado e o Projeto ENIAC Programmers
A contribuição das mulheres para o projeto do ENIAC e para o desenvolvimento da tecnologia de computadores em geral foi essencial. Elas ajudaram a abrir caminho para a participação feminina nos campos da tecnologia e da engenharia, e inspiraram muitas outras mulheres a seguir carreiras semelhantes.
No livro “Proving Ground”, a autora Kathy Kleiman conta a história das seis mulheres pioneiras, encarregadas de descobrir como programar o primeiro computador totalmente eletrônico do mundo, sem códigos de instrução ou uma linguagem de programação, já que naquela época só existia a linguagem de máquina.
Kathy Kleiman se deparou com a história das programadoras do ENIAC durante sua graduação em programação em Harvard. Ela buscava por modelos que pudessem a inspirar em seu campo de trabalho e encontrou na história esquecida das mulheres uma motivação de pesquisa. A partir daí, Kathy produziu, em parceria com a PBS, o documentário “The Computers: The Remarkable Story of the ENIAC Programmers”, em que as próprias programadoras do ENIAC contam a sua história.
A partir do documentário e do livro Proving Ground, foi fundado o Projeto ENIAC Programmers, cujo objetivo é resgatar e divulgar as histórias de mulheres pioneiras nas áreas da tecnologia e da computação. O projeto, liderado por Kleiman, atualmente se dedica a buscar as histórias das mulheres que trabalharam no desenvolvimento do UNIVAC. Também são promovidas palestras, leituras coletivas e exibições das obras que tratam da história das programadoras do ENIAC.
Com informações de The Guardian, CHM, Britannica, Penn Today, Odetta e ENIAC Programmers Project