A educação em Engenharia passa por um momento de revisão. Adiciona-se à formação técnica a necessidade de um perfil de profissional mais completo e versátil. Esta visão é reforçada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do Curso de Graduação em Engenharia, que indicam a formação de profissional capaz de “realizar a avaliação crítico-reflexiva dos impactos das soluções de Engenharia nos contextos social, legal, econômico e ambiental” e que “tenha uma visão holística e humanista”.
Nas palavras de Vanderli Fava, presidente da Associação Brasileira de Educação em Engenharia (ABENGE): “O engenheiro que as universidades precisam formar hoje tem que saber empreender, tomar decisões, comunicar-se e liderar equipes. E deve buscar sempre a inovação”. Esta perspectiva dialoga com os chamados grandes desafios da Engenharia, que considera que “os grandes desafios atuais são interdisciplinares e multidisciplinares, e nenhum campo de ciência ou engenharia superespecializado poderia resolver sozinho nenhum deles”.
Nesta toada, as Ciências Sociais atestam esta multidisciplinaridade, contribuindo com uma dimensão mais aprofundada na formação destes “novos” engenheiros e engenheiras. Assim, a Sociologia aparece, por exemplo, como recurso analítico para o entendimento de contextos sociais complexos e conflituosos. Afinal, a Engenharia é parte desta complexidade, já que indústrias, tecnologias e processos não se criam em um cenário neutro, desprendido de valores coletivos.
Para organizar estas novas demandas na área da Engenharia, uma lista com catorze desafios, que serve como guia de atuação e pesquisas na atualidade, foi elaborada pela Academia Nacional de Engenharia dos Estados Unidos em 2008. As principais áreas destes desafios são meio ambiente, saúde e infraestrutura urbana. Elas vivificam a ideia de que educação em Engenharia não deve focar apenas na produção de pessoas tecnicamente neutras e insensíveis em relação ao seu papel de definição do futuro, mas visar à promoção da sensibilidade e crítica éticas.
A aposta nessa formação é forte e busca que a produção da engenharia propicie mais impactos sociais. Em âmbito internacional, por exemplo, Harvard traz, em suas engenharias, disciplinas como “Projetos de design humanitários” e “Solucionando dilemas tecnológicos públicos”. Nacionalmente, o Insper oferece a disciplina “Grandes desafios da engenharia”, em que o pensamento crítico, propiciado pelas ciências humanas, favorece maior compreensão dos efeitos da tecnologia em relação à complexa realidade social brasileira. Além destes, novos cursos, como a Engenharia da Complexidade da Unicap, em Recife, contribuem também com “Relações Internacionais” e “Autonomia, arte e cultura” em sua grade curricular alinhada às novas DCN.
São abordagens interdisciplinares como essas que possibilitaram, por exemplo, que engenheiros recém-formados elaborassem como projeto final de curso o estudo “Reciclagem em comunidade vulneráveis: o caso da vila nova esperança”. O trabalho desenvolveu uma metodologia de inovação social com objetivo de gerar melhor qualidade de vida aos moradores, por meio da gestão da cadeia de resíduos, transformando-os em alimentação e renda, além de aprimoramentos na situação ambiental local.
Desse modo, aguardamos que projetos assim sejam cada vez estimulados nas engenharias para que seu ensino, para além de reconhecer a sofisticação e eficiência de softwares, máquinas, modelos e materiais, também estimule a cultura de impactos sociais positivos em realidades diversas e complexas.