Reforma tributária e movimentação financeira

Por Marcos Cintra*

O portal UOL destacou em sua home que “Economista de Bolsonaro quer unificar alíquota do IR e recriar a CPMF”. A matéria reproduz a coluna de Mônica Bergamo publicada na Folha de S.Paulo em 19/9 onde ela diz que Paulo Guedes afirmou que eu o “convenci” a trazer de volta a CPMF para financiar o INSS.

Em primeiro lugar cabe esclarecer que a chamada no UOL dá a falsa impressão de que o projeto que apresentei para estudo de Paulo Guedes é simplesmente recriar a CPMF. Esse tributo foi rechaçado por mim ao longo de todos os anos de sua existência, pois implicou numa deturpação da ideia do imposto único, elevando a carga tributária sem os benefícios da eliminação de outros tributos. A proposta em discussão é substituir um tributo que pesa significativamente sobre o custo do trabalho no país, algo que compromete a competitividade doméstica e limita a geração de empregos. Hoje o ônus tributário sobre a folha de salários das empresas é de cerca de 35%, considerando o INSS patronal, Salário-Educação, Sistema “S”, Seguro de Acidente do Trabalho e FGTS. A troca do tributo previdenciário reduziria em mais da metade essa elevada incidência.

Um segundo aspecto que deve ser esclarecido é a falsa ideia disseminada de que tributos sobre movimentação financeira são um mal a ser extirpado da estrutura tributária. Antes vale lembrar que essa forma de tributação foi idealizada em 1990 para ser um substituto dos impostos declaratórios e não para ser um tributo a mais como foi feito. Tecnicamente, trata-se de um bom tributo. A experiência mostrou excelente produtividade quando comparada sua baixa alíquota com a arrecadação gerada, seu custo administrativo para o governo e para as empresas foi muito baixo quando comparado com os tributos tradicionais, foi eficiente no combate à sonegação e estudos mostraram que se trata de um tributo uniforme, não regressivo como se afirmava.

Um terceiro ponto a ser enfatizado é que criar e/ou aumentar tributos, quaisquer que sejam, inclusive sobre movimentação financeira ou IVA, deve ser rechaçado. Elevar a já alta carga tributária não deve ser opção para uma economia que precisa gerar empregos.

Finalmente, é indispensável conhecer o impacto que a substituição do INSS sobre a folha das empresas por uma Contribuição Previdenciária sobre a movimentação financeira (CP) teria na atividade produtiva, mais especificamente sobre os preços.  Para isto produzi simulações para apurar o efeito sobre 128 setores da economia brasileira. A metodologia consta no capítulo 2 do livro “Bank Transactions: Pathway to the Single Tax Ideal”, de minha autoria.

Supondo a substituição dos 20% do INSS patronal sobre a folha de salários por uma CP com alíquota de 0,33% faria com que o peso médio dos tributos sobre os preços dos 128 setores caísse de 14,10% para 1,68%. Comparando o que uma e outra contribuição provoca frente a uma situação hipotética de imposto zero constata-se um desvio de 1,99% no caso do INSS e de 0,40% com a criação de uma CP.

A substituição do INSS sobre a folha de salários pela CP é o ponto de partida para uma reforma estrutural de grande impacto para o crescimento econômico do país. Tal medida serviria de embrião para uma reforma tributária ampla mais à frente, contrastando com a proposta ultrapassada do IVA, que apenas maquia um sistema de impostos que limita severamente a produção do país e estimula a sonegação de tributos.

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Marcos Cintra* é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único.

Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV

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