Em dezembro do ano de 2014, o jornal Folha de S. Paulo, em sua coluna “Tendências e Debates” publicou um artigo de minha autoria relativo à crise do abastecimento de água da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) cujo auge já se avizinhava.
Na ocasião, o artigo alertava que era urgente que as autoridades sanitárias do Estado implantassem um plano B visando reduzir a insegurança hídrica. Plano este que se basearia na adoção de tecnologias de tratamentos avançados para a purificação de águas de mananciais não protegidos localizados dentro da própria RMSP que, por esta razão, estavam com qualidade de água incompatível com as técnicas convencionais ainda adotadas de tratamento de água.
O meu artigo de 2014 propunha também a implantação de uma nova captação no corpo da Represa Billings, próximo ao reservatório das Pedras de modo a se aproveitar dos efeitos de autodepuração daquele manancial, cujas águas agregariam também as do Rio Pinheiros, requalificadas com o reforço do efluente tratado da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Barueri e excepcionalmente (como procedido atualmente) de parte das águas do Tietê a montante.
Naquelas condições, o reaproveitamento das águas do Rio Pinheiros seria feito de modo perene, situação impensada nos dias de hoje dadas à péssima qualidade de suas águas, o que ensejou as restrições sanitárias e ambientais por força das Disposições Transitórias da Constituição paulista promulgada em 1988.
A requalificação do Rio Pinheiros se daria em um primeiro momento por diluição através do reforço da vazão do canal do Rio Pinheiros por meio da introdução, na embocadura do Tietê, do efluente tratado da ETE Barueri da Sabesp, a qual seria tratada a nível terciário segundo uma vazão de cerca de 16 metros cúbicos por segundo (vazão referente à estação de tratamento de esgoto, ETE, ampliada).
Esta vazão corresponderia a um acréscimo de cerca de 150% na vazão do rio em tempo seco o que garantiria uma melhoria significativa na qualidade da água, que, no entanto, seria ainda imprópria para contato primário ou para fins de abastecimento de água, mas apropriada para fins estéticos contribuindo para melhor emolduramento das margens do rio em todo o seu curso, aspiração almejada pela população paulistana que quer se orgulhar de seu rio.
Para se atingir um grau de depuração adequado à reversão do esgoto tratado da ETE Barueri somente poderia ser realizada após um tratamento terciário do efluente secundário, indispensável também para evitar a formação de espuma e restringir ao concentração de Fosfato menor que 0.025 mg/l como exagera a Cetesb. Esta intervenção seria feita no mínimo com a adoção de processos de micro filtração do efluente tratado e futuramente com a substituição dos decantadores secundários por membranas de ultrafiltração o que propiciaria também a liberação de áreas para expansão daquela ETE.
Com tal grau de qualidade, esta reversão se daria por recalque com a tubulação seguindo pelas margens do Rio Tietê, porém em sentido contrário, em direção à embocadura do Rio Pinheiros por onde adentraria evoluindo ao longo do canal através das estruturas hidráulicas já existentes até a Represa Billings.
O tratamento ao nível terciário das águas revertidas à Represa Billings acrescentaria pelo menos 22 metros cúbicos por segundo, àquela represa de forma contínua.
Por sua vez, a água captada na Represa Billings naquele local seria submetida a tratamentos avançados incluindo tecnologia de membranas, complementada com eventuais processos oxidativos.
Esta solução traria como vantagens além da melhoria da qualidade das águas do Rio Pinheiros a elevação da segurança hídrica da metrópole podendo ainda reforçar a geração de energia em Henry Borden quando as condições hídricas forem favoráveis, sem esquecer, todavia do caráter prioritário que se reveste o abastecimento de água à população.
Focando-se, entretanto, na requalificação apenas do Rio Pinheiros, como foi desejo do governo do Estado de São Paulo no chamamento frustrado da iniciativa privada em 2017 por meio de concessão ou sociedade de propósito específico (SPE), as intervenções hidráulicas, após a validação técnica desta proposição por meio de simulações, se limitariam à captação e à reversão por bombeamento do efluente tratado na ETE Barueri através de linhas de dutos ao longo da margem esquerda do Tietê em uma extensão de cerca de 11 quilômetros sob baixa altura manométrica.
A Sabesp retomou a implantação dos coletores-tronco na bacia do rio Pinheiros no bojo do Projeto Tietê, interrompido enquanto perdurou a recente crise hídrica. Mas essa intervenção por si só não é suficiente para revitalizar o rio Pinheiros sendo necessárias ações no próprio rio e em seus afluentes conforme aqui sugerido. Mas, sem a participação da iniciativa privada isso seria impossível.
*JOSÉ EDUARDO W. DE A. CAVALCANTI
É engenheiro consultor, diretor do Departamento de Engenharia da Ambiental do Brasil, diretor da Divisão de Saneamento do Deinfra – Departamento de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), conselheiro do Instituto de Engenharia, e membro da Comissão Editorial da Revista Engenharia
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