Por Paulo Sergio Lanzarotto
Colapsos em obras sempre causam grandes tragédias, sejam quedas de edifícios, rupturas de barragens, desabamentos de passarelas e viadutos. Uma série inimaginável de desastres poderiam ser evitados a partir de um bom processo de Engenharia. O caso mais recente do colapso estrutural, com a consequente queda e total destruição do edifício Wilton Paes de Almeida, é mais um infeliz capítulo de catástrofes que ocorrem pelo descaso com as boas práticas e recomendações técnicas.
O edifício em questão era o ícone do modernismo da década de 60, tendo adotado soluções arquitetônicas e estruturais extremamente vanguardistas para a época, como peles de vidro nas fachadas, com a consequente ausência de pilares estruturais, provendo ao edifício uma iluminação e transparência até então inexistentes nas obras desse tipo no centro de São Paulo.
Esta leveza e transparência das fachadas resultou na necessidade da transferência dos elementos de sustentação (pilares) para o centro do edifício, o que resultou numa concepção estrutural totalmente inédita para a época. Sua altura em número de pavimentos superou os limites usuais para a década (22 pavimentos) o que gerava sobrecargas muito grandes nos pilares de sustentação, principalmente nos andares mais baixos (1.º ao 5.º pavimentos).
O infeliz evento foi associado a um sistema de combate a incêndio ultrapassado (e provavelmente desativado devido às condições de abandono edifício), composto basicamente de extintores e hidrantes com mangueiras. Essa era a exigência para a época de construção, mas seria insuficiente para extinguir o incêndio, mesmo que estivesse funcionando, devido à alta flamabilidade apresentada, vista na intensidade, tamanho, coloração e duração das chamas.
Assim, o calor gerado no interior do edifício, algo em torno dos 700 graus centígrados, proveu uma energia térmica que afetou a resistência do aço e do concreto dos pilares (principalmente do aço), gerando um decréscimo considerável na resistência desses pilares. Essa situação, aliada à tensão de compressão existente sobre a estrutura, provocou uma condição limite, na qual qualquer esforço extra, por menor que fosse, causaria um colapso.
Esse esforço provavelmente veio da dilatação térmica das lajes de concreto (devido ao incêndio) que gerou deslocamentos no topo dos pilares, forçando-os para fora de sua posição inicial, como se empurrássemos os pés de uma mesa para fora do seu tampo. Esse desequilíbrio da estrutura fez com que uma laje caísse sobre a outra, causando um efeito dominó, até a queda total do edifício.
Esse processo é empregado em implosões, quando há o desejo de que o edifício caia sobre ele mesmo: ao destruir os pilares de sustentação dos andares mais baixos (primeiro ao quinto andar), o restante do imóvel cai pelo seu peso próprio. Um evento similar ocorreu na queda das Torres Gêmeas, nos atentados de 11 de setembro de 2001, com o incêndio que fragilizou os pilares.
O trabalho do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo foi exemplar. Todos os protocolos de segurança e combate foram seguidos e não houve baixa entre os seus integrantes. Além disso, é importante destacar a postura correta da Corporação, que já havia vistoriado o edifício e recomendado procedimentos de engenharia para a segurança da edificação. É, ainda, elogiável a posição da área de Engenharia dos Bombeiros, em relação às exigências legais para a aprovação do projeto técnico de proteção e combate a incêndio das novas edificações. A aplicação desses preceitos técnicos no caso do edifício Wilton Paes de Almeida exigiria a instalação de chuveiros automáticos de combate a incêndio – os conhecidos “sprinklers” – que certamente seriam capazes de combater o incêndio com altíssima efetividade, evitando que se alastrasse e causasse a tragédia que provocou.
Diante de tudo isso, é possível concluir que, do ponto de vista técnico, não existe receita mágica. A aplicação correta das normas de Engenharia, a fiscalização por parte das autoridades e a obediência às diretrizes de instituições sérias como o Corpo de Bombeiros constituem o único caminho para que tragédias como a que assistimos não se repitam e coloquem em risco a segurança e a vida de inocentes.
Paulo Sergio Lanzarotto é engenheiro civil e de segurança, arquiteto, urbanista e professor da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP)