Imagine uma lente de contato biossensitiva que pode dizer quando o nível de açúcar no seu sangue está baixo, ou se está acontecendo algo de errado com algum dos seus órgãos. Ao potencializar o poder da tecnologia de transistores ultrafinos, pesquisadores da Universidade do Estado do Oregon deram um passo nessa direção.
Uma equipe de pesquisadores liderados pelo professor Gregory Herman, da Universidade do Estado do Oregon, desenvolveu um biossensor transparente que, quando adicionado a lentes de contato, poderia ser utilizado para detectar sintomas de uma variedade de problemas de saúde. Atualmente, um protótipo testado em laboratório consegue identificar os níveis de glicose no sangue, mas o time acredita que, no futuro, a tecnologia poderia detectar outras condições, até mesmo o câncer. Precisaremos de mais alguns anos até que tenhamos essas lentes de contato futurísticas nas prateleiras das farmácias, mas as tecnologias necessárias para desenvolver esse dispositivo não-invasivo de diagnóstico já existem nos dias de hoje. A pesquisa será apresentada na última terça (4), no 253º National Meeting & Exposition of the American Chemical Society (Encontro & Exposição Nacional da Sociedade Química Americana, em tradução livre).
Quando embarcou no projeto, Herman estava buscando uma maneira melhor de ajudar pessoas com diabetes. Hoje, diabéticos podem monitorar os níveis de açúcar no sangue de forma contínua, utilizando eletrodos implantados debaixo da pele. O problema é que essa forma de monitoramento pode ser dolorosa e causar irritações e infecções à pele. Uma lente de contato biossensitiva descartável seria muito mais prática, segura e muito menos intrusiva.
Para começar, Herman pegou uma ideia que ele e sua equipe haviam tido alguns anos atrás – um semicondutor feito de um composto de óxido de gálio e zinco (IGZO). É o mesmo semicondutor que revolucionou eletrônicos, permitindo resoluções maiores em televisores, smartphones e tablets. Herman quer agora aplicar uma tecnologia similar a diagnósticos médicos.
Para fazer o protótipo das lentes de contato, os pesquisadores fabricaram um biossensor contendo uma camada transparente de transitores IGZO e glicose oxidase – uma enzima que quebra a glicose. Quando esse biossensor entra em contato com a glicose, a enzima oxida o açúcar sanguíneo. Isso altera os níveis de pH da mistura, causando mudanças mensuráveis na corrente elétrica que flui nos transistores IGZO. Pequenas nanoestruturas são incorporadas dentro do biosensor IGZO, permitindo que o dispositivo transparente detecte concentrações de glicose da lágrima.
Herman estima que mais de 2.500 biossensores possam ser incorporados a um remendo quadrado de um milímetro de uma lente de contato IGZO, cada um deles projetado para medir uma função corporal diferente.
“Existem muitas informações que podem ser monitoradas a partir de uma lágrima. Claro, tem a glicose, mas também lactato (sepse, doença hepática), dopamina (glaucoma), ureia (função renal) e proteínas (cânceres). Nosso objetivo é expandir de um único sensor para múltiplos sensores”, disse Herman ao Gizmodo. Como notado, o modelo atual pode testar apenas a glicose, então apenas o tempo dirá se a tecnologia pode ser alavancada para identificar esses outros químicos.
O sensor ainda está em fase de desenvolvimento e precisa ser colocado numa lente de contato. Futuramente (e idealmente), uma versão melhorada desse dispositivo irá transmitir dados por frequência de rádio para um dispositivo. Como bônus, os sinais de rádio irão oferecer energia ao dispositivo; no futuro, uma pequena antena será utilizada para carregar um capacitor. Atualmente, os protótipos não transmitem dados para fora do sensor, e os cientistas leem as informações ao medir a corrente elétrica que flui pelo dispositivo.
Herman diz que a solução da sua equipe é bem parecida com aquela proposta pelo Google em 2014, mas acredita que sua equipe pode fazer todos os componentes completamente invisíveis. Em vez de um transistor IGZO transparente, as “smart lens” do Google usam um pequeno chip wireless e um sensor de glicose em miniatura que são incorporados entre duas camadas da lente de contato macia.
Pelo fato de essas lentes de contato serem descartáveis, os dispositivos precisam ser baratos. Mas Herman não vê isso como um problema. “Estamos utilizando uma tecnologia muito parecida com a que foi usada para aparelhos celulares, os transistores IGZO. Cem transistores em uma tela de celular custam menos que dez centavos”, afirmou. Herman e sua equipe desenvolveram um método barato de fabricar eletrônicos IGZO, mas ele mesmo admite que “existem outros custos que precisarão abaixar”. A acessibilidade desses dispositivos hipotéticos ainda é uma questão aberta.
No cenário ideal, os pesquisadores esperam começar a testar as lentes de contato biossensitivas em animais dentro de um ano. Como foi notado, a equipe de Herman está apresentando as descobertas numa conferência nesta terça, mas a pesquisa já apareceu nas revistas científicas Nanoscale e Applied Materials & Interfaces.
[American Chemical Society]