Primeiras Leituras do PDUI

ORIGEM DO PDUI 

O PDUI tem origem na Lei Federal nº 13.089 – Estatuto da Cidade, aprovada em 2015, da qual surgiu a obrigatoriedade de que as regiões metropolitanas e aglomerados urbanos devam aprovar, em até três anos (2018), o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado. 

Documento recentemente distribuído pela PMSP explica, em rápidas palavras, o conceito que preside a elaboração do PDUI: “segundo a lei, o Plano deverá instituir diretrizes para a formulação de políticas e gestão públicas integradas, para o desenvolvimento sustentável e integrado dos distintos municípios, princípios para a preservação ambiental e critérios para a aprovação ou revisão dos distintos Planos Diretores Estratégicos – PDEs – municipais. Não se trata, portanto, de um plano apenas de diretrizes, mas visa a estruturação dos meios interfederativos de implementação do desenvolvimento urbano integrado da Metrópole. Fará parte desse sistema de gestão a constituição de uma Instância Colegiada Deliberativa, com participação da Sociedade Civil”. 

O Fórum Interfederativo, composto por representantes dos 39 municípios que compõem a Região Metropolitana de São Paulo e por representantes do Governo do Estado, trabalha desde 2015 na elaboração de um Caderno de Propostas para o PDUI, que deverá ser encaminhado, no final de 2016, sob forma de um Projeto de Lei, à Assembléia Legislativa do Estado. 

PROCESSO LEGISLATIVO 

O Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de São Paulo (CDRMSP), composto por representantes dos 39 municípios da RMSP e de 17 representantes do Governo do Estado, é responsável, tanto pela gestão metropolitana como pelo PDUI. A composição dos fóruns de elaboração e de aprovação do PDUI foi definida pelo Conselho em janeiro de 2015. Sua composição, em traços gerais, contempla:
• Comitê Executivo, responsável pela coordenação dos trabalhos de elaboração e aprovação do PDUI.
• Comissão Técnica, como apoio aos trabalhos do Comitê.
• Grupos de Trabalho, criados pela Comissão Técnica nas sub-regiões da RMSP.
• Secretaria Executiva do Comitê Executivo, exercida pela Emplasa.

CALENDÁRIO DE ELABORAÇÃO DO PDUI
Nove (9) Etapas foram estabelecidas para o processo de elaboração e aprovação do Plano.
Etapas já cumpridas:
• Criação do Comitê Executivo – agosto de 2015
• Reuniões Regionais com os Municípios para esclarecimentos – setembro de 2015
• Estruturação da Comissão Técnica e dos Grupos de Trabalho – outubro de 2015
• Reunião dos Grupos de Trabalho – janeiro a agosto de 2016
Etapa em processo:
• Audiências Municipais Mobilizadoras – maio a julho de 2016
Etapas Futuras:
• Oficinas Regionais I (Poder Público) – de julho a agosto de 2016.
• Oficinas Regionais II (Sociedade Civil) – setembro a novembro de 2016.
• Audiências Públicas Regionais (Sociedade Civil) – de novembro a dezembro de 2016.
• Instância Colegiada Deliberativa, com a incumbência de instaurar a Instância e analisar a minuta do Projeto de Lei – de 2015 a 2017.

INSTÂNCIA COLEGIADA
A estrutura da Instância Colegiada foi definida pelo Estatuto da Cidade, em seu artigo oitavo.
Art.8º – A governança interfederativa das regiões metropolitanas e das aglomerações urbanas compreenderá em sua estrutura básica:
I – Instância Executiva composta pelos representantes do Poder Executivo, dos entres federativos integrantes das unidades territoriais urbanas;
II – Instância Colegiada Deliberativa, com representação da sociedade civil;
III – Organização Pública com funções técnico-consultivas;e
IV – Sistema integrado de alocação de recursos e de prestação de contas.

ESTRUTURA DO CADERNO DE PROPOSTAS
Cinco Eixos Estruturais foram adotados pelo Comitê Executivo para montagem do Caderno de Propostas que embasarão o documento final do Plano.
1. Habitação e Vulnerabilidade Social
2. Desenvolvimento Econômico, Social e Urbano
3. Meio Ambiente, Saneamento Básico e Recursos Hídricos
4. Mobilidade, Transporte e Logística
5. Governança e Fundo Interfederativo.
Foram excluídos alguns temas que, apesar de sua importância, foram considerados como já estruturados de forma regionalizada.

PROPOSTAS DO PODER PÚBLICO E DA SOCIEDADE CIVIL AO PLANO
Até o momento 144 propostas foram apresentadas pelo Poder Público e 26 pela Sociedade Civil.
A maioria das propostas da Sociedade Civil é de enfoque pontual; as dos Poderes Públicos são mais regionalizadas. 

Agrupadas as propostas do Poder Público por entidade promotora – Prefeituras, Conselhos Intermunicipais e Empresas do Governo do Estado – tem-se o seguinte quadro:
• 29 são da cidade de São Paulo, 27 de Cotia, 26 de Embu das Artes, 21 de Mogi das Cruzes, 14 de Guarulhos, 10 de Osasco, 6 da região do Grande ABC, 5 de Ferraz de Vasconcelos, 3 do Conselho Intermunicipal Oeste e 3 de empresas do Governo de São Paulo (CPTM, Metrô e EMTU). 

O Caderno de Propostas está sendo apresentado nas “audiências mobilizadoras” e nas “oficinas regionais” compactando as propostas em três blocos temáticos:
• Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Sanemento, com sessenta e cinco (65) propostas;
• Desenvolvimento Urbano, Econômico e Habitação, com quarenta e uma (41) propostas;
• Transporte e Logística, com trinta e oito (38) propostas. 

Uma leitura, “em diagonal”, do conjunto das 38 propostas de Transportes e Logística, evidencia que a maioria das prefeituras defende intervenções regionalizadas e a implantação de infraestruturas “perimetrais”. Busca-se configurar um novo modelo para a Metrópole, não mais dentro da concepção radio-concêntrica, ainda presente em muitos programas de transporte. 

Os municípios de Mogi das Cruzes e São Paulo apresentaram a maioria das propostas sobre transporte (55% do total). São Paulo, visando uma estruturação metropolitana para o transporte rodoviário de passageiros e Mogi uma série de intervenções rodoviárias intermunicipais de interesse ao Consórcio de Desenvolvimento dos Municípios do Alto Tietê. No segmento transporte de passageiros, Mogi defende a instalação de uma linha de VLT entre Mogi e Itaquaquecetuba. As propostas do Consórcio evidenciam a tendência “centrifugadora” da região leste da Metrópole, mais em direção ao Vale do Paraíba do que à cidade de São Paulo.

Face à defesa de intervenções descentralizadoras, é de se estranhar a ausência de propostas do Governo do Estado relativas aos projetos de “trens regionais”, já em fase de estudos, tanto pela CPTM como pela Dersa, ligando São Paulo a São Jose dos Campos, Sorocaba, Campinas e Santos. Nenhuma proposta, também, para a inclusão de mobilidade universal nos trechos urbanos das rodovias, objeto de leis estaduais desde 1998. 

Ainda sobre a região leste da RMSP é importante registrar o antigo interesse regional em implantar trens de passageiros na linha, desativada, da RFFSA entre Mogi e São Jose dos Campos. Durante a gestão da prefeita Ângela Guadagnin (1993/1996) em São Jose dos Campos, registrou-se a criação de uma empresa de transportes na cidade de São Jose dos Campos, que detinha “concessão” da então RFFSA para implantar o que se chamou na época de Trem do Vale – um sistema de transporte suburbano de passageiros entre Taubaté e Mogi das Cruzes. O projeto previa o aproveitamento do trecho desativado. Pretendia-se orientar a expansão urbana das cidades do Vale ao longo da ferrovia, evitando a previsível atração que a abertura da rodovia Carvalho Pinto para as áreas da Serra do Mar.

PORTO SECO RODOFERROVIÁRIO
Dentre as propostas da Sociedade Civil merece destaque uma formulada por uma Entidade de Classe de Itapecerica da Serra, propondo a implantação de um porto seco rodoferroviário na confluência da linha da ALL com a BR 116 e o Rodoanel. 

Resgata o trabalho desenvolvido pela Secretaria de Transportes do Estado para os terminais intermodais de carga na Macrometrópole, desenvolvido no início dos anos 90. Há um pátio ferroviário no ponto de cruzamento da ferrovia com a BR 116 – pátio de Aldeinha; foi um dos locais estudados no citado programa. Segue o texto da proposta. 

Implantação de porto seco rodoviário e ferroviário integrado, em área na divisa entre os municípios de Itapecerica da Serra e São Lourenço da Serra, em ponto contíguo a Rodovia Regis Bittencourt – BR 116, local com caracterização de uso já definido pelos planos diretores de ambos os municípios como corredor de desenvolvimento estratégico. A localização da área em questão – exatamente no entroncamento da BR 116, que liga o sul do Brasil com as demais regiões brasileiras, passando pela RMSP, ao lado do Rodoanel Mario Covas e da ferrovia Campinas – Santos ( América Latina Logística-ALL/RUMO), percorrendo os municípios de Campinas, Indaiatuba, Salto, Itu, Mairinque, Alumínio, São Roque, Cotia, Itapecerica da Serra, Embu-Guaçu, São Paulo, São Vicente, S. Lourenço Serra, Praia Grande, Cubatão, Santos, torna a estratégia deste Porto Seco – Sudoeste, de fundamental importância logística de transporte, de armazenamento, carga e descarga de mercadorias,sem onerar o transito da capital paulista.

CONSIDERAÇÕES CRÍTICAS DAS PROPOSTAS DA STM – SECRETARIA DE TRANSPORTES METROPOLITANOS DO GOVERNO DO ESTADO 

“Acho que, nos dias de hoje, a cidade não tem nada a ver com a cidade de 30 anos atrás. No meu modo de ver, a cidade é um campo de forças. Como todo território ela é um campo de forças, é o lugar primordial da contradição com que o mundo se debate hoje. Deve ser vista assim, se a gente quer ter uma visão progressista, se a gente quer pensar o futuro. O futuro é a escolha de caminhos para enfrentar as contradições. O fenômeno urbano não pode ser estudado fora do território. Sem dúvida, há especificidade de cada organismo urbano. O problema central que eu vejo é que a questão das cidades é tratada fora do território. Aí acrescentam o discurso da pobreza, da desigualdade, mas o que não é intrínseco, é o chantilly e a cereja em cima do bolo já feito. Isso, quando a questão é o próprio bolo. Se rompêssemos com essa visão de cidade como um dado independente da dinâmica territorial, isso nos levaria a uma outra visão dos problemas, inclusive da construção da política e da federação. A federação atual é hostil a soluções urbanas, não urbanísticas. As questões urbanísticas se fazem independentes, tanto que os modelos atuais, hegemônicos são estrangeiros, de um modo geral. São importados, assim como são importados os pensadores estrangeiros que vêm aqui dizer que devemos fazer assim, que devemos fazer assado. O planejamento estratégico de cidades ninguém sabe o que é!… Ele não é estratégico se não corresponde à verdadeira dinâmica, que é a do território nacional”.
Milton Santos – Le Monde Diplomatique / 2001

Já vivemos a fase da “febre” de elaboração dos antigos Planos Diretores e dos recentes Planos de Mobilidade urbanos, com os resultados já muito conhecidos por todos. Parte-se dos termos de uma imposição legal, federal, tornando obrigatória a elaboração destes planos a todas as cidades do país a partir de um valor populacional escolhido. Se questionável que o mesmo modelo “teórico” possa estruturar a urbanização e a mobilidade de cidades de mesmo porte em diferentes regiões geográficas, mais questionável seria considerar que o mesmo modelo possa atender a cidades de porte diferente. 

O desafio que a RMSP deverá enfrentar na elaboração do PDUI pode ser antevista pela leitura do texto convocatória das Audiências Mobilizadoras; 

“O PDUI trata-se de um plano que contém não apenas diretrizes, mas a estruturação dos meios interfederativos para se implementar o desenvolvimento urbano integrado da Metrópole. Nesse sentido, a estrutura de governança interfederativa e o compartilhamento de dados e informações são considerados parte integrante do sistema de planejamento urbano integrado a ser proposto no Projeto de Lei. Faz parte desse sistema de gestão a constituição da Instância Colegiada Deliberativa, com participação da Sociedade Civil, que deverá aprovar o PDUI e, portanto, ser instaurada ao longo do processo participativo de debate e elaboração do Plano”. 

É também citado, do Estatuto da Metrópole:
“Criado (o Estatuto) com o objetivo de nortear a gestão e a ação das distintas entidades federativas que compõem uma governança interfederativa associada à participação da sociedade, a um conjunto de instrumentos urbanísticos e jurídicos de gestão e o sistema integrado de alocação de recursos a serem destinados em ações e políticas públicas de escala metropolitana”.

A questão da mobilidade aflora, para o PDUI como, talvez, o maior desafio. Apenas aos modos de transporte individuais – carros, motos, bicicletas – e ao sistema ferroviário suburbano (CPTM) reservam-se formas não penalizadas de viagens intermunicipais. O sistema rodoviário estadual (EMTU) por não ser uma rede coerente de transportes, mas um conjunto isolado de linhas de ônibus não permite sua configuração como um sistema metropolitano de transportes de passageiros. 

Duas propostas de se implantar um sistema de integração tarifária na RMSP constam do PDUI, com origem na SPTrans (Prefeitura de São Paulo) e na STM (Governo do Estado). Trazem de volta o mesmo embate que marcou a criação do Bilhete Único na cidade de São Paulo.

 Na época, duas propostas foram analisadas, o Bilhete Único, da Prefeitura de São Paulo e o Metropass, proposto pelo Governo do Estado. Não se chegou a um consenso, levando a prefeitura a implantar, unilateralmente, e apenas no sistema de ônibus da capital, o Bilhete Único. A adoção do bilhete nos sistemas ferroviários (Metro e CPTM) só se efetivou depois de algum tempo. A STM tem diversificado sua linha de bilhetes e de tarifas nos sistemas operados pelas empresas estaduais de forma bastante isolada. Apenas a CPTM, como transporte de alta capacidade, opera na grande maioria dos municípios da RMSP; seu sistema de integração com ônibus data dos anos 80, como implantado nas linhas suburbanas da Fepasa. O Metrô, ainda hoje, tem abrangência territorial contida no município de São Paulo. 

Apesar das duas citadas propostas versarem sobre o mesmo tema, apesar de com denominações diferentes – Bilhete Único Metropolitano para a Prefeitura e Bilhete de Integração Metropolitano, para a STM – o fato de terem sido apresentadas separadamente revela que as divergências originais entre o Bilhete Único e o Metropass ainda permanecem. A seguir, em resumo, o teor das duas propostas.

BILHETE METROPOLITANO
• Bilhete de Integração Metropolitano – BIM, proposta de implantação de um Bilhete Único Metropolitano, com unificação de hardware (cartão), desenvolvimento de software comum e estabelecimento de clearing house e de uma política tarifária unificada com os demais municípios da RMSP.
• Bilhete Único Metropolitano – Proposta de um único título para pagamento de tarifas em todos os modais que operam no âmbito da RMSP, respeitando a heterogeneidade das políticas tarifárias municipais e metropolitana, os benefícios e incentivos vigentes como a integração temporal e bilhetes com desconto, bem como as políticas de gratuidades adotadas.
Considero que a proposta do Bilhete Único foi mais realista ao destacar a existência dos diferentes descontos e gratuidades já presentes nas tarifas do transporte público, fato que pesa consideravelmente no modelo de privatização dos serviços de transporte público.

Integração gratuita no transporte público metropolitano
Há uma proposta da Prefeitura de São Paulo que também merece destaque, por seu provável impacto na questão das tarifas do transporte coletivo. Dela destaco apenas que se deva considerar que as diferentes as gratuidades, devem ser analisadas do ponto de vista de quem paga e de quem opera o transporte público. 

A proposta, em resumo, é:
Tornar gratuitas as principais integrações entre linhas EMTU, Metro e CPTM dentro da RMSP.

INVESTIMENTOS EM TRANSPORTE PÚBLICO
Finalmente, registro uma proposta do Metrô, que, a meu ver, defende uma forma de desenvolvimento urbano perverso, contribuindo para o avanço dos terríveis processos de gentrificação e de segregação social que temos presenciado, nestas últimas décadas na RMSP.
Deveria ser analisada sob o foco dos recentes programas de inclusão social e de fuga do modelo de “espraiamento suburbano”, característico da reurbanização das cidades brasileiras, desde a criação de Brasília.

Contribuição de Melhoria
Segue, em resumo. o teor da proposta.
Os órgãos públicos promotores de obras públicas que resultem em valorização imobiliária podem cobrar contribuição de melhoria dos proprietários de imóveis localizados na área de influência direta das infraestruturas de transporte de alta e média capacidade referente à valorização do seu imóvel provocada pela obra. Esse pagamento, definido como uma contribuição de melhoria, esta previsto no Código Tributário Nacional artigos 5, 81 e 82. A proposta apresentada é para que sejam desenvolvidos os estudos e análises para instituir e regulamentar a cobrança do tributo referente a essa contribuição de melhoria decorrente da valorização imobiliária gerada pela implantação de linhas de transporte de alta e média capacidade na RMSP.

Referências
Texto Síntese do Caderno de Propostas (ver em www.ie.org.br,)
PDUI disponível em www.pdui.sp.gov.br,
http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/marco-regulatorio/pdui/,