O Brasil vem enfrentando um complexo cenário social e econômico: recessão da economia por dois anos seguidos resultando em perda considerável de postos de trabalho e de arrecadação de impostos, recrudescimento da inflação, restrições ao crédito das empresas com a perda do grau de investimento do Brasil.
Como consequência, o desequilíbrio do câmbio demonstra-se propício à aquisição de empresas nacionais por investidores transnacionais, transferindo-se o comando de empresas brasileiras que foram o esteio do desenvolvimento nacional por várias décadas a empresas estrangeiras, numa magnitude jamais vista na história de nossa nação.
Percebe-se que um cenário já tão desafiador per si, ainda enfrenta a paralisia decorrente das denúncias de corrupção junto aos poderes executivo e legislativo, num quadro de incertezas que atinge toda a sociedade.
O momento exige a reflexão da sociedade, para que os investimentos necessários e obrigatórios para o desenvolvimento nacional não sejam tolhidos pela paralisia da política, pela monstruosa burocracia estatal, e nem pelas denúncias de corrupção.
Estampa-se nos jornais notícias deque servidores municipais de São Paulo fizeram fortunas falseando dados de recolhimento do ISS em obras de construção civil do setor de incorporação de edifícios. Na justiça Federal do Paraná, estão sendo julgados casos de empresas que detêm o mais profundo conhecimento de obras de engenharia pesada, uma expertise que, por motivo algum, pode ser perdida sob pena de ser contratada, no futuro próximo, com pagamentos em moeda estrangeira.
Assim, este artigo considera que não é crível, dada a sua dimensão nacional, e verificada por fatos que atingem todas as esferas do poder executivo, em qualquer nível de governo e por todo o País, que sejam decorrentes apenas de poucos servidores mal-intencionados em conluio com empresários corruptores.
O mote comum a todas elas, e às demais que pululam nos noticiários, refere-se a episódios de corrupção diretamente ligados a duas das etapas de uma obra de construção: na análise dos documentos que compõem as licenças para o início de uma construção, ou durante o andamento das obras de construção, para o recebimento dos valores decorrentes das medições dessas obras.
No caso das medições, o poder contratante detém o direito de glosar o pagamento de quantia considerável devida à empresa responsável pela obra, seja pelo motivo que for pondo em risco a sustentabilidade financeira da empresa executora das obras de construção.
No caso das licenças e licitações, o rol de documentos necessários obriga que as empresas interessadas mantenham ou contratem escritórios específicos com fins de colher a documentação, fator que limita a participação da grande maioria das empresas, por ser insuportável sua manutenção.
No âmbito das licenças ambientais, é risível a quantidade de documentos necessários, cuja extraordinária dimensão faz perder o sentido da análise. Basta dizer que no desastre da barragem de rejeitos de Mariana, as licenças estavam rigorosamente em dia, e nenhum dado que nelas consta apontou para qualquer tipo de alerta do desastre vindouro.
No dramático episódio ocorrido em Santa Maria, servidores do corpo de bombeiros aprovaram regularmente os mecanismos de segurança e de rota de fuga da Boate Kiss. A pergunta que se impõe é: qual a necessidade dessa profusão de informações das licenças ambientais e alvarás de funcionamento/construção, se o resultado não é aquele que a sociedade espera dos órgãos técnicos?
Assim, o Autor tem a profunda convicção de que a atual corrupção nas obras de construção não é uma questão de engenharia, mas sim o elemento que faz girar uma engrenagem há muito necrosada, que a sociedade não consegue, e os poderes executivos não demonstram, interesse em alterar tal engrenagem. Basta dizer que os métodos das aprovações e licitações dos casos mencionados não sofreram qualquer alteração, a despeito de sua ampla ressonância na sociedade.