O fraco desempenho da economia brasileira em 2013 e as projeções pouco animadoras com relação a 2014 estancaram o risco de haver uma piora da escassez de bons engenheiros nos próximos anos. A conclusão faz parte de um estudo elaborado no fim do ano passado pela Universidade de São Paulo (USP) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que considerou diferentes cenários de crescimento com base na oferta de engenheiros com melhor qualificação vindos das faculdades.
De acordo com o estudo, a situação seria inevitável caso o Brasil mantivesse seu crescimento na média de 4,4% ao ano, conforme ocorreu entre 2004 e 2010, o que gerou no período uma demanda maior pelos cursos de engenharia, a ponto de em 2011 o número de ingressos ter superado, pela primeira vez na história, o de calouros em direito, revertendo uma tendência de acentuada queda no interesse pela profissão, que vinha desde a década de 90.
Segundo Aguinaldo Maciente, técnico de planejamento de pesquisa do Ipea, essa futura fornada de novos engenheiros nos próximos anos não implica necessariamente em um ganho de qualidade na mão de obra ofertada, já que a maioria dos formandos virá de faculdades particulares, que não possuem o mesmo nível de excelência das públicas. Hoje, diz, o gargalo está exatamente na falta de engenheiros qualificados para cargos de gerência e diretoria.
“A desvalorização da profissão nos anos 80 e 90 gerou uma oferta reduzida de engenheiros na faixa entre 35 anos e 59 anos. Muitos profissionais abandonaram a profissão ou ingressaram no serviço público”, afirma. Esse vácuo de lideranças atinge diretamente os setores da engenharia que mais se destacaram nos últimos anos, com os de óleo & gás e mineração, principalmente em cargos mais técnicos, como os de diretor industrial. Segundo informações de mercado, os salários médios desses setores podem partir de R$ 18 mil (nível gerencial) até R$ 90 mil, para cargos de diretoria.
Além do descompasso gerado pelo sistema educacional, o mercado de trabalho reage conforme fatores imprevistos, como foi o caso da crise da OGX, do empresário Eike Batista, no ano passado, que ocasionou a demissão de centenas de engenheiros e técnicos do ramo de óleo&gás. “As demissões geraram um desconforto no setor mas podemos afirmar que há profissionais competentes disponíveis no mercado”, afirma Bruno Stefani, gerente para óleo & gás da Michael Page.
Segundo Stefani, até 2011 as empresas do setor apostavam principalmente na contratação de novos talentos que já atuavam no mercado. “A partir do ano passado, notamos que os processos seletivos que demoravam 45 dias estenderam-se para até 120 dias, o que revela um processo de contratação mais criterioso, principalmente nas áreas mais técnicas, como perfurações e geofísica”, diz.
Stefani acredita em uma retomada nas contratações após 2015, mas receia que em algumas áreas mais técnicas, não necessariamente ligadas à engenharia, haverá necessidade de absorção de profissionais estrangeiros.
Há quase meio século na profissão, o engenheiro Aluizio de Barros Fagundes, conselheiro do Instituto de Engenharia de São Paulo, descarta a possibilidade de um “apagão” no setor e vê com bons olhos o mercado de trabalho para os próximos anos. “Há uma tendência em buscar engenheiros com formação mais generalista, que possam atuar de forma integrada dentro de uma empresa.”
Para o Mauro de Mesquita Spinola, presidente da direção executiva da Fundação Vanzolini, o ramo de civil deverá ser o carro-chefe da profissão nos próximos anos. “Há uma carência na formação de engenheiros navais e de óleo & gás, mas acredito que cursos de especialização possam suprir esta lacuna”, afirma. Por ser uma entidade criada e mantida por professores da Poli-USP, a Fundação Vanzolini oferece diversos cursos voltados para engenharia de produção e de especialização em áreas administrativas e de gestão, inclusive MBA em gestão de operações, produtos e serviços. Para Spinola, independentemente do ramo da engenharia, o sucesso na profissão passa por um permanente processo de educação continuada.
Autor: Valor Econômico