No dia 19 de março, o engenheiro Russell Fleming, presidente da National Fire Sprinkler Association (NFSA), proferiu a palestra “As lições aprendidas com o incêndio da Boate Station”, ocorrido em 2003 no estado de Rhode Island, nos EUA, na sede do Instituto de Engenharia.
O engenheiro começou sua apresentação dizendo que as boates são conhecidas por representarem perigo, são locais cheios de pessoas, escuros, possuem questões de segurança que limitam as saídas, além de o álcool afetar a capacidade de raciocínio das pessoas que frequentam as casas noturnas. Em função disso já ocorreram diversas tragédias em muitas boates no mundo todo.
Russel Fleming falou especificamente sobre os incêndios que aconteceram nas boates Station no estado de Rhode Island, nos EUA, no dia 20 de fevereiro de 2003, e Kiss que aconteceu na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria-Rio Grande do Sul. Na Boate Station 100 pessoas foram mortas e na Boate Kiss 241 pessoas morreram e 123 ficaram feridas.
“Os dois incêndios têm aspectos muito parecidos, por exemplo, eles foram causados devido ao uso de um sinalizador em um show pirotécnico que foi feito pelos integrantes das bandas que se apresentavam nessas boates e em ambos os casos houve uma disseminação muito rápida do fogo em função do uso da espuma de poliuretano usada para o isolamento acústico dos locais, além de não ter portas para saídas de emergência, todos precisavam sair pela porta de entrada. A característica semelhante entre os dois casos é na verdade a falta de uso de sprinklers” explanou Fleming.
Outro ponto citado foram as medidas que os EUA tomaram depois do incêndio da Boate Station. Nos EUA, assim como no Brasil, a legislação contra incêndio não é elaborada a nível Federal e, sim, a nível Municipal e Estadual. Da mesma forma como o código é usado aqui em São Paulo como a legislação nós temos também a nossa própria legislação. Uma das instituições mais conhecidas e que escreve justamente esses códigos modelos é a Associação de Proteção Contra Incêndios, a nível nacional, National Fire Protection Association – NFPA. Este é um código amplamente, aceito, conhecido como Código de Proteção da Vida. Após o trágico incêndio que aconteceu em Rhode Island essa instituição fez várias reuniões especiais e juntou todo seu conselho para analisar o caso e essas audiências públicas levaram a aprovação de mudanças ao Código de Proteção da Vida.
Neste código, há um requisito, por exemplo, no qual diz que todas as novas boates que tenham um número acima de 50 frequentadores têm que ter um sistema de sprinkler, e outro requisito, é que um sistema automático de sprinklers seja instalado em boates já existentes com ocupação acima de 100 pessoas. Essas medidas já foram adotadas em todos os estados americanos. Além disso, mais três estados também adotaram como obrigatório o uso de sprinklers em boates já existentes com capacidade acima de 100 pessoas.
Fleming explicou como funciona o sistema automático de sprinklers, “sistemas de sprinklers contém água pressurizada, geralmente contida por ampolas de vidro cheias de líquido em cada sprinkler. O calor do incêndio expande o líquido até que a ampola de vidro se quebre, liberando o acesso da água e distribuindo-a sobre o fogo. O calor só aciona os sprinklers mais próximos ao fogo, extinguindo o incêndio ou controlando-o. Esse sistema pode ser abastecido pelo sistema público de abastecimento de água ou a partir de tanques externos, tanques elevados, caixas d´água, tanques de pressão ou pressurizados, no caso”.
“Devemos utilizar esses sistemas de sprinklers, porque este é o melhor dispositivo contra incêndios, na realidade ele preenche as lacunas dos outros sistemas de proteção a incêndios. Com o passar do tempo aprendemos que as pessoas não morrem se elas estiverem em um local que tenha os sistemas automáticos de sprinklers. As mortes ocorrem onde não há esse sistema e os incêndios acontecem muitas vezes por causa de problemas com materiais inflamáveis, problemas com pessoas que fazem algum show pirotécnico, usam fogos de artifício ou algum dispositivo ilegal, mesmo sabendo que isso pode causar mortes”, afirmou.
No incêndio da Boate Station o NIST –Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia – foi o responsável pela investigação para saber como o sistema de sprinklers teriam evitado o incêndio. A NIST reconstruiu parte do palco e vários ensaios foram realizados buscando simular ao máximo o incêndio real que havia sido filmado por uma equipe de televisão na noite da tragédia. As luzes foram apagadas e teve um show de fogos em cima do palco. A meia-noite foi quando o fogo começou a se alastrar. Onze segundos após a ignição, os membros da banda que estavam no palco começou a correr, o teto começou a pegar fogo e os alarmes começaram a tocar. Fumaça negra e espessa começou a sair da boate. As pessoas estavam amontoadas na porta, os bombeiros chegaram em cinco minutos e levaram mais cinco minutos para jogarem água.
Reconstruíram o palco e a parte onde o baterista tocava. Foram conservadores ao usar espuma, sabiam que havia espuma nas paredes e na parte do baterista e o carpete do palco era de nylon. Começou a pegar fogo pelas laterais da porta e a ausência de sprinklers fez o fogo se alastrar rapidamente, noventa segundos depois a boate estava com fumaça tóxica. A simulação foi feita com imagens de uma emissora de TV.
De acordo com Russel Fleming “deveriam ter sido instalados sistemas automáticos de sprinklers, na parte onde estava o baterista e outros nas portas. A boate passou a ser letal em 90 segundos, com o sistema a boate nunca seria um local letal e essas mortes não teriam acontecido. Segundo o NIST os testes conduzidos conseguiram conter o incêndio em um período de cinco segundos e sem os sprinklers foi fatal em um minuto”, afirmou.
Fleming também deu como exemplo um acidente que aconteceu na casa noturna O Fine Line Music Café, em Minneapolis, estado de Minnesota, EUA, três dias antes do incêndio na Boate Station. “O incêndio também foi causado pelos fogos de artifício e causaram a ignição de espuma de poliuretano, mas o incêndio foi controlado pelo sistema de sprinklers, 120 pessoas conseguiram sair e não houve perda de vidas. O estabelecimento foi reparado e reaberto em poucos dias”, concluiu.
A mesa de abertura da palestra contou com a participação de Aluizio de Barros Fagundes, presidente licenciado do Instituto de Engenharia; Salomão de Almeida Neto, presidente da Associação Brasileira de Sprinklers (ABSpk); Jefferson Teixeira da Costa, coordenador da Divisão Técnica de Segurança do Trabalho do Instituto de Engenharia; Theóphilo Guimarães, vice-coordenador da Divisão Técnica de Segurança do Trabalho do Instituto de Engenharia e o palestrante Russell Fleming, presidente da National Fire Sprinkler Association (NFSA), dos EUA.
Autor: Marília Ravasio