O Governo Municipal vem anunciando a intenção de construir mais duas rodoviárias: Itaquera e Vila Sônia, que operariam em conjunto com os atuais terminais do Tietê, Barra Funda e Jabaquara. A proposta tem sua origem na revisão de 2004 do PITERP – Plano Integrado de Terminais Rodoviários de Passageiros de São Paulo, cuja primeira versão, de 1978, determinou cinco áreas de macro-localização para os terminais rodoviários. A atual estrutura (três terminais) foi gerada após as revisões de 1980 e 1984.
Durante anos, morando em São José dos Campos e trabalhando em São Paulo, fui cliente diário do Terminal do Tietê. Agora cliente não-freqüente, procurei entender porque minhas idas e vindas ao Vale do Paraíba passariam a ser feitas do futuro Terminal Itaquera.
Pensei na limitação da capacidade, mas este não é o problema. No ano passado embarcaram pouco mais de 11 milhões de passageiros no Terminal Tietê. Se forem adotados parâmetros típicos do dimensionamento deste terminal de transporte chega-se a uma capacidade anual da ordem de 49 milhões de passageiros. Estes números indicam que a rodoviária opera com 22,5 % de seu potencial!
E tampouco se vislumbra a possibilidade de congestionamento. Desde 1989 o número de embarques vem caindo constantemente. De 2002 em diante os embarques anuais oscilam em torno dos 11 milhões, e nada sugere uma retomada do transporte rodoviário de passageiros.
Não sendo um problema de capacidade, a razão dos novos terminais poderia ser os ganhos dos clientes por uma redução de custo ou pela melhoria na acessibilidade aos demais pontos de São Paulo. Também sob este aspecto não há justificativa. Se as linhas mudam do Tietê para Itaquera, as empresas aumentarão a quilometragem ociosa, já que têm hoje suas instalações de apoio na região do Tietê. Ou construirão novas instalações. Em ambos os casos, há uma pressão sobre os custos que vai recair sobre os clientes. Igualmente preocupante é a questão da acessibilidade do passageiro a outros locais da cidade. A posição do terminal Tietê é singular quando se avalia a disponibilidade de oportunidades de conexões: no trecho menos carregado da linha 1 – azul (norte-sul) e a apenas duas paradas da estação Luz e quatro da estação Sé, a partir das quais se tem acesso, por metrô ou trem, a qualquer ponto da região metropolitana. Já um terminal rodoviário em Itaquera vai obrigar os clientes que fazem o acesso pelo metrô (a maioria) a utilizarem a linha 3 – vermelha, a mais superlotada do sistema e com oportunidades de conexão com outras linhas de metrô ou trem muito mais distantes (há onze estações entre a Sé e Itaquera).
Não sendo por restrições de capacidade, ou para o benefício dos clientes, a motivação para os novos terminais poderia ser uma externalidade. Sistemas de transportes apresentam três externalidades negativas: acidentes, poluição e congestionamentos. Cabível, no caso, uma avaliação dos impactos da operação do terminal rodoviário do Tietê nos congestionamentos da Marginal. Atualmente circulam, na Marginal Tietê, 450 mil veículos por dia. E o terminal rodoviário do Tietê contribui, nos dias úteis, com 2.428 operações (chegadas e partidas), equivalentes a 0,5 % do fluxo diário na via! Também não há como justificar a construção de novas rodoviárias com base no desafogo das Marginais.
Assim, tem-se uma proposta de investimento de R$ 500 milhões para construir duas novas rodoviárias que: (1) não são necessárias, pois há capacidade disponível no sistema existente; (2) não trarão benefícios aos passageiros e empresas; e (3) não contribuirão para a redução dos congestionamentos. Pelo contrário, a multiplicação injustificada de terminais só tende a agravar o já degradado cenário de mobilidade na cidade. No limite, estamos a contribuir para que, no lugar de 2400 ônibus, trafeguem mais 100 mil automóveis particulares em São Paulo. Não é deste tipo de idéia que a cidade precisa…