Em um trabalho seminal de 2008, o Prof. Marcos Cintra estimou que, em São Paulo, os congestionamentos acarretam um custo anual de R$ 33,5 bilhões, valor que estaria chegando à casa dos R$ 40 bilhões, considerando-se o contínuo agravamento das condições de circulação verificado nos últimos anos. Para uma cidade cujo PIB é da ordem de R$ 450 bilhões, tem-se um comprometimento de praticamente 10 % da soma da riqueza local apenas devido aos constantes congestionamentos do sistema viário.
Quando se analisa o crescimento da frota, a velocidade de expansão do sistema viário e da rede de transporte coletivo, as perspectivas não são alentadoras. Em um cenário como este, é inevitável a adoção de medidas de peso – no caso, o pedágio urbano.
A percepção comum do pedágio urbano é que se trata de uma solução genérica para os congestionamentos. Uma conceituação mais rigorosa indica que se trata de um sistema de cobranças para se transitar em vias ou áreas congestionadas. A literatura técnica em inglês se refere a este encargo como congestion charging. As congestion charges asseguram uma contribuição financeira de quem utiliza o sistema viário congestionado. Além de inibir viagens não essenciais, com os recursos arrecadados pode-se melhorar o sistema de transporte coletivo e implementar políticas de estímulo ao transporte não motorizado.
Num ano de eleição municipal a discussão do tema é reavivada. Aqui em São Paulo a controvérsia foi alimentada pelos recentes artigos e editoriais do jornal Folha de São Paulo, com o apoio de uma extensa reportagem da ”Veja São Paulo” da semana de 20 de junho.
Ocorre que nem sempre o assunto é tratado com o devido cuidado, e muitas vezes o que assistimos é um verdadeiro “Fla-Flu” da mobilidade urbana; um festival de imediatismo, oportunismo e discurso eleitoreiro.
Alguns opositores (em especial aqueles que almejam um cargo eletivo tentando agradar a todos) enchem a boca e afirmam que “primeiro é preciso melhorar o transporte coletivo, depois discutiremos o pedágio urbano”. É um argumento preguiçoso. Não olha o problema como um todo. Apenas para dar um exemplo da falácia – a cidade de Londres tem a maior rede de metrô do mundo, complementada por um sistema de transporte coletivo por ônibus, e lá foi implantado o modelo hoje mais emblemático de pedágio urbano do mundo.
Não é razoável esperar a rede do metrô passar dos atuais 70,6 km para os 184,2 previstos para 2020 para então pensar em uma medida de restrição para o transporte individual. A frota de veículos particulares não vai esperar, e as perdas anuais com os congestionamentos apenas tendem a aumentar.
Mesmo que se inicie agora, a discussão séria do pedágio urbano em São Paulo já começa tarde. Em Londres, onde o pedágio urbano entrou em operação no dia 17 de fevereiro de 2003, os primeiros estudos sobre o mecanismo datam de 1962, quando o Ministério dos Transportes do Reino Unido instalou um comitê para estudar, do ponto de vista técnico e econômico, a implementação de um pedágio urbano no centro de Londres. O Smeed Report (como ficou conhecido o relatório final dos estudos) concluiu que a melhor solução seria cobrar diretamente do usuário pelo uso da via.
Claro que as experiências como as de Londres, Estocolmo, Cingapura permitem que hoje, o tempo de maturação do processo seja muito menor. Mas não há como fazê-lo no calor de uma disputa eleitoral, sem correr o sério risco de comprometer a idéia.
O pedágio urbano é uma medida radical (inevitável, o meu ver), cuja implantação requer, além de um firme compromisso político, embasamento técnico e uma ampla e séria discussão. Estou seguro de que não haveria lugar mais adequado para a condução deste processo que o nosso Instituto de Engenharia.