Como a tecnologia pode ajudar a bicicleta ser mais viável nas metrópoles

Esta semana, como vocês devem saber, foi o dia mundial sem carro. Aproveitei para ao menos voltar do trabalho de bicicleta e testar o recém-lançado Yahoo Social Bike, interessante aplicativo brasileiro para iPhone que quer estimular o uso da magrela. Foram 11 km em duas rotas para tentar descobrir se é viável usá-la como meio de transporte em São Paulo – nunca tive carro aqui e tenho me virado com transporte público, pé e táxi. A resposta: é possível, mas com muitos poréns. Aqui está um guia resumido de como a tecnologia pode ajudar a mudar o quadro:

Rotas de bicicleta:

Em várias cidades dos EUA, o Googlemaps tem um outro símbolo quando você traça uma rota, além de carro, transporte público e pedestre: bicicleta. A ideia é que você, quando pegar a bike para andar pela cidade, saiba o melhor caminho a usar, que pode ser bastante diferente do recomendado para pessoas motorizadas ou não: algumas vias são extremamente hostis às bicicletas (e seres humanos em geral), então é melhor andar pela ciclovia, onde elas existem, ruas menos movimentadas ou mesmo na calçada. Em Curitiba, por exemplo, o pessoal fez um projeto em cima do Google Maps que mapeia os lugares mais tranquilos e menos problemáticos aqui. Alguém precisa juntar esses dados e deixá-los mais facilmente acessíveis.

Para quem gosta de pedalar de maneira mais séria, existe o Bikely, onde os ciclistas trocam informações sobre rotas bacanas ao redor do mundo. Há informações sobre várias cidades do Brasil no site, como São Paulo. 

É bem comum achar bicicletas em Berlim com um telefone e instruções em várias línguas. Achou uma e quer andar pela cidade? Ligue para o número, forneça o cartão e eles darão a senha que vai destravar a bicicleta. Pedale e, na hora de trancá-la, escolha se vai ser uma parada temporária ou se vai “devolver” a bicicleta. Por devolvar entenda simplesmente deixá-la fechada em algum lugar da área de cobertura: o seu cartão será descontado dependendo do período que você andou. Mais simples que isso, ímpossível. O único problema desse esquema era achar as bicicletas para alugar.

Não mais. A Callbike, principal empresa do filão, desenvolveu um aplicativo em que fica fácil achar uma bicicleta próxima e já fazer toda a operação de desbloqueio sem necessidade de falar com alguém no telefone. Enquanto não chegam sistemas grandes de aluguel de bicicleta como transporte público, isso quebra um bom galho. E, para quem ainda está inseguro sobre a viabilidade de uma bicicleta na metrópole, alugar uma é um bom primeiro passo.

Apps bacanas que te desafiam:

O Nike+ deu uma boa mexida na maneira com que as pessoas treinam, divulgam e se motivam para correr. De rotas detalhadas com cores mostrando seu ritmo a recordes e competição com amigos, este é o exemplo a ser seguido. O Yahoo Social Bike tenta isso (lá no alto está o caminho que eu fiz), acrescentando fotos na sua rota e possibilidade de mostrar automaticamente pra todo mundo no Twitter por onde você andou, mas faltam conquistas e uma parte técnica mais refinada. Um bom caminho nessa direção é o Liverider, que mistura aplicativo com hardware para medir a quantidade e força das pedaladas: 

Do que adianta eu ficar mais saudável, diminuir os engarrafamentos e a poluição se eu não ganho um achievement por isso? Tem de ver isso aí…

Sites de ciclismo social:

Sim, o Yahoo Social Bike é algo nesse sentido, como o nome aponta. Mas a ideia aqui seria marcar o que os ciclistas chamam de bondes: uma aglomeração de pessoas de bike indo de A a B. Ontem, durante minha aventura, me senti mais seguro andando atrás de um skatista e 4 outros ciclistas. Mais bikes podem ocupar mais espaço e os motoristas passam mais longe. E mais gente é geralmente mais legal. Conversando com alguns cicloativistas, vi que a organização dos bondes é feita em fóruns e listas de discussão. Algum site ou aplicativo que centralizasse isso seria ótimo melhor. 

A  parte menos tecnológica:

A tecnologia pode ajudar muita gente a se interessar a andar de bicicleta, o que é ótimo. Mas a adoção das bikes como transporte público depende da vontade das pessoas e dos governos. Talvez seja pedir demais que apareça a curto prazo um sistema amplo de aluguel de bicicleta subsidiado como em várias cidades da Europa ou os estacionamentos de bike por todos os lados de Tóquio. Mas ao menos adaptar as cidades com ciclovias é um passo que me parece necessário – e urgente. Sejamos realistas: dificilmente teremos no curto prazo um respeito maior de nossos motoristas (estressados e violentos, como apontam as estatísticas) em relação aos ciclistas. Por isso eu acho que nosso código de trânsito, que mais ou menos obriga a bicicleta a dividir o espaço com os carros, nas ruas, é errado. Nas cidades, lugar de bicicleta é na calçada e ciclovia, na minha humilde opinião, baseada em observações de cidades europeias e Japão. Como relatei aqui quando falei do Bicing, o genial sistema de Barcelona:

Não é em toda cidade que é possível instalar quilômetros de ciclovias. Barcelona era um desses casos: uma cidade que tinha calçadas e pistas. E, a bem da verdade, não foram instaladas ciclovias de fato. Na maior parte da cidade, a ciclovia é na verdade um pedaço da calçada pintado com uma faixa. E só. Por lá não há nada dessa obrigação praticamente impossível de se concretizar do Brasil, onde a bicicleta tem de andar na pista com os carros em alta velocidade.

A bem da verdade, imaginava-se que a convivência entre ciclistas e carros seria tranquila nas ruas de Barcelona quando o Bicing foi lançado. Mas, pelo relato das pessoas com quem conversei lá, o início do projeto foi marcado por muitos acidentes e discussões entre ciclistas e motoristas, especialmente porque Barcelona não tinha muito a cultura de bicicletas e muita gente que nunca havia arriscado pedaladas passou a andar pelas ruas. Rapidamente, a prefeitura se mobilizou: a lei foi modificada também para proteger o ciclista dos carros em caso de acidentes (eles têm preferência), assim como os pedestres dos ciclistas.

Durante o lançamento do Yahoo social Bike, haviam vários cicloativistas importantes. Senti em alguns deles um antagonismo muito grande em relação às pessoas que andam de carro. O discurso de alguns faz parecer que o carro é um câncer. Ele é, ok, sob vários pontos de vista, mas as pessoas que estão nele às vezes não vêem – ou não têm mesmo – outra opção. O sentimento de raiva e enfrentamento não vai ajudar em nada. Tecnologia e alguma conscientização – inclusive dos ciclistas – sim.

 

Autor: GizModo