Telescópio terrestre ganha qualidade espacial com espelho deformável

Terrestre ou espacial?

“Se você quer aproveitar ao máximo o potencial de um telescópio, leve-o para o espaço.”

Esta “verdade”, apregoada durante séculos, sustenta-se no fato inegável de que a atmosfera terrestre interfere com a luz das estrelas, borrando as imagens.

Mas ela passou a ser uma verdade relativa com o advento da óptica adaptativa, que está permitindo que telescópios terrestres produzam imagens melhores do que as imagens captadas pelo telescópio espacial Hubble.

Agora a vantagem dos telescópios espaciais parece estar caindo por terra de vez, graças ao trabalho do astrônomo holandês Roger Hamelinck, da Universidade de Eindhoven.

Espelho deformável

A atmosfera contém “bolhas” de ar quente e ar frio, cada uma com seu próprio índice de refração, causando distorção na imagem. O resultado é que a luz que chega até os telescópios terrestres é distorcida.

Hamelinck criou um novo tipo de espelho deformável para telescópios que é capaz de corrigir rapidamente a imagem, substituindo a necessidade de amostragens da mesma imagem exigida pela óptica adaptativa tradicional.

Sob um espelho ultrafino, são colocados atuadores mecânicos que, sempre que necessário, criam rapidamente saliências e ondulações no espelho. Essas saliências e ondulações corrigem a distorção criada pela atmosfera, distorção esta que também se altera a cada instante.

A técnica terá uma importância crucial particularmente para a nova geração de grandes telescópios que estão sendo projetados – mas também poderá permitir um upgrade nos telescópios terrestres já instalados.

Hamelinck explica que, “em princípio, telescópios maiores também têm uma resolução mais alta, mas alcançar uma qualidade óptica ótima tem na atmosfera um grande empecilho. Por isso é absolutamente necessário fazer essas correções.”

Espelho deformável adaptativo

O princípio de um “espelho deformável adaptativo” não é novo, e a implementação da ideia vem ocupando astrônomos há mais de cinquenta anos. Mas a adoção do conceito em todo o seu potencial vinha esbarrando na tecnologia disponível.

Por exemplo, os atuadores usados nos espelhos deformáveis anteriores geravam muito calor, fazendo com que os próprios sistemas de correção se transformassem em uma fonte de distorção.

“Ao contrário dos sistemas anteriores, este novo sistema tem um espelho ultrafino, exigindo pouca energia para a sua deformação”, explica Hamelinck. “Isto, juntamente com o uso de atuadores eletromagnéticos de alta eficiência, reduz a geração de calor do sistema a um nível muito baixo. Graças a isso, não é necessário nem mesmo fazer uma refrigeração ativa.”

O protótipo de espelho deformável adaptativo construído por Hamelinck tem um diâmetro de apenas cinco centímetros.

Mas o design é escalável e expansível usando múltiplos módulos, tornando a solução adequada para telescópios de grandes dimensões, como o futuro E-ELT (European Extra Large Telescope), que terá um espelho de 42 metros. 

A solução apresentada por Hamerlinck entusiasmou tanto os astrônomos que seu espelho deformável adaptativo começará a ser comercializado imediatamente.[Imagem: Roger Hamelinck]


Óculos novos

A solução apresentada por Hamerlinck entusiasmou tanto os astrônomos que seu espelho adaptativo começará a ser comercializado imediatamente. A universidade onde o pesquisador trabalha percebeu uma grande oportunidade para o chamado retrofitting – uma atualização tecnológica – dos telescópios atuais.

“[O sistema] pode ser incluído em qualquer telescópio do mundo,” afirma Ben Braam, desenvolvedor de negócios da universidade. “Quando você liga o sistema, a imagem melhora instantaneamente. É como se você pusesse óculos novos.”

Quanto ao preço desses óculos adaptativos novos, Braam afirma acreditar que o sistema deve valer entre cinquenta e cem mil euros cada um.

Futuro para os telescópios espaciais

Mas, embora a solução possa questionar os custos econômicos do lançamento de novos telescópios espaciais, é bem sabido que ele também não corrige tudo. Nuvens, por exemplo, continuarão a ser um problema.

Consequentemente, ainda que não seja o espaço, os telescópios de grande precisão continuarão exigindo lugares especiais. As altas montanhas do Chile parecem talhadas para a tarefa, com seu céu limpo e baixa umidade.

E esta discussão contempla basicamente os telescópios na faixa visível do espectro eletromagnético. Telescópios de outras frequências, como o Herschel e Planck, com suas exigências de sensores resfriados até próximo ao zero absoluto, continuarão a abrir novas fronteiras no espaço.

Quando chegarmos à Lua, a melhor solução para um telescópio lunar provavelmente utilizará espelhos líquidos.

Por outro lado, os caminhos para os telescópios terrestres realmente do futuro já estão sendo traçados pela astrofotônica.

Autor: Inovação Tecnológica