Na primeira semana de novembro, em São Carlos (SP), uma centena de estudantes brasileiros e estrangeiros terá a oportunidade de interagir com alguns dos principais especialistas do mundo em spintrônica e computação quântica – áreas emergentes que, além de já terem permitido uma revolução na capacidade de processamento e miniaturização de computadores, englobam um vasto número de questões na fronteira do conhecimento na física.
A Escola São Paulo de Ciência Avançada em Spintrônica e Computação Quântica será realizada entre os dias 1º e 5 de novembro pelo Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo e pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). O evento será organizado no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), modalidade lançada pela FAPESP em 2009.
Semicondutores e óptica quântica
De acordo com o coordenador do evento, José Carlos Egues, professor do Departamento de Física e Informática do IFSC-USP, participarão 50 alunos brasileiros e 50 estrangeiros, que passarão por um processo de seleção.
“Os temas da spintrônica e da computação quântica serão tratados em seu sentido mais amplo, englobando áreas que vão de semicondutores à óptica quântica. Teremos uma escola de altíssimo nível, com participação de alguns dos maiores expoentes nessas áreas”, disse à Agência FAPESP.
Além de Egues, participam do comitê organizador do evento os professores Guilherme Sipahi e Esmerindo Bernardes, também do IFSC-USP, e Adilson Aparecido de Oliveira e Yara Gobato, da UFSCar.
O que é spintrônica
A spintrônica é uma tecnologia emergente envolvida no aumento do poder de processamento e na miniaturização dos componentes computacionais nos últimos anos, ajudando, por exemplo, a contornar dificuldades relacionadas ao aquecimento e consumo de energia nesses dispositivos.
“Na eletrônica tradicional o funcionamento dos dispositivos é baseado na passagem ou não de corrente, que depende da carga dos elétrons. Já na spintrônica, em vez da carga elétrica é o spin, momento angular intrínseco do elétron (spin significa “giro” em inglês) que liga ou desliga os dispositivos. O uso do spin, ao contrário das cargas elétricas que colidem produzindo calor, gera menos energia. As consequências disso são enormes para os processadores”, explicou Egues.
A spintrônica nasceu em 1988, com a descoberta da tecnologia conhecida como magnetorresistência gigante (GMR, na sigla em inglês), que rendeu o prêmio Nobel de Física de 2007 ao francês Albert Fert e ao alemão Peter Grünberg.
A presença já confirmada de Grünberg será justamente um dos principais destaques da ESPCA, de acordo com Egues.
“A tecnologia GMR é responsável por termos hoje os discos rígidos de alta densidade. Certamente os estudantes terão muito a aprender com Grünberg durante o curso. Além dele, teremos a participação de Stuart Parkin, da IBM, que foi responsável por fazer com que a tecnologia GMR fosse transformada em produto. A descoberta foi feita em 1988 e em 1997 a tecnologia já estava nos computadores pessoais”, disse Egues.
Computadores quânticos
Além do armazenamento de dados, a spintrônica poderá ser aplicada aos semicondutores e à criação de processadores para computadores quânticos. Esse será outro dos amplos temas que estarão em foco durante o evento.
“Nossos computadores eletrônicos não têm nada de mecânica quântica em seu processamento. Se hoje temos os bits – cujos valores só podem ser 1 ou 0 -, com a computação quântica poderemos ter uma superposição na qual o 1 e o 0 poderiam aparecer ao mesmo tempo, como ocorre no mundo quântico. Evidentemente, essas máquinas não serão usadas em tarefas triviais, mas, por exemplo, em aplicações com a fatoração de números primos muito grandes, de importância para a criptografia”, explicou.
Fronteira do conhecimento
A ESPCA em spintrônica e computação quântica, segundo Egues, será organizada em minicursos, nos quais os especialistas apresentarão introduções básicas sobre os temas envolvidos. “Além dos minicursos, os especialistas brasileiros e estrangeiros apresentarão resultados de pesquisas de fronteira do conhecimento”, disse.
A escola contará ainda com plenárias nas quais os pesquisadores mais experientes discutirão os desafios e oportunidades abertos nas áreas de spintrônica e computação quântica.
“Queremos atrair gente que tenha interesse em migrar para essas áreas em busca de bons problemas de pesquisa. Diferentemente das áreas tradicionais, os jovens ainda têm condições de fazer contribuições significativas e de resolver problemas interessantes em spintrônica e computação quântica. Vamos concentrar esforços em apresentar a área de forma ampla a esses jovens, além de tentar atrair talentos do exterior para São Paulo”, disse Egues.
Óptica quântica
Entre as temáticas relacionadas à área de computação quântica um tópico importante será a óptica quântica. Para isso, a escola terá a participação de pesquisadores como Luis Davidovich, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Peter Zoller, da Universidade de Innsbruck (Áustria).
Outros participantes confirmados na escola são Vanderley Bagnato, professor do Departamento de Física e Ciência dos Materiais do IFSC-USP e coordenador do Centro de Óptica e Fotônica (Cepof) de São Carlos, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da FAPESP, Tito Bonagamba, do Departamento de Física e Informática do IFSC-USP, e Ivan da Cunha Lima, do Instituto de Física da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).
Entre os participantes estrangeiros estão confirmados Daniel Loss, da Universidade de Basileia (Suíça), Michael Flatté, da Universidade de Iowa (Estados Unidos), Guido Burkard, da Universidade de Konstaz (Alemanha), e John Schliemann, da Universidade de Regensburg (Alemanha).
A Escola São Paulo de Ciência Avançada em Spintrônica e Computação Quântica contará ainda com um evento paralelo, o workshop Meet the editors, que terá a participação dos editores Peter Adams, da Physical Review B, e de Daniel Ucko, da Physical Review Letters.
“A ideia é orientar os participantes a lidar com o processo de publicação científica. Já realizamos esse evento em São Carlos e ele foi muito bem recebido pela comunidade científica”, disse Egues.
Autor: Agência Fapesp