“Todo mundo pergunta, e eu sempre respondo: não tem nada a ver com agricultura!”, conta Nicole Fonseca, 18 anos, uma dos 35 alunos da primeira turma da graduação em Engenharia de Agrimensura e Cartográfica da Universidade Federal da Bahia (Ufba). As diretrizes do curso recém-lançado pela instituição definem o ramo de Engenharia de Agrimensura e Cartográfica como responsável pela aquisição, processamento, análise e representação de dados da superfície da Terra, tanto nas formas analógicas, como nas formas digitais.
Desconhecimento, baixa procura e escassez de cursos superiores na área fazem com que o salário do engenheiro agrimensor gire em torno de R$3,5 mil para recém-formados e R$7 mil para profissionais com cinco anos de mercado, segundo Vivian Fernandes, coordenadora da graduação na Ufba. Apesar do atrativo, a professora alerta para a dificuldade das disciplinas da graduação. “Antes de fazer a escolha, o jovem deve estudar muito e trabalhar suas dificuldades nas áreas de física e matemática. Caso contrário, ele pode até ser aprovado nos vestibulares que tenham concorrência baixa, mas não terão base suficiente para continuar no curso” destaca.
“É bastante puxado, mas dá para acompanhar”, comenta Nicole. Para a estudante, a promessa de bons salários pesou na decisão, porém não foi o fator primordial. “Salário sempre conta, mas é a amplitude do mercado de trabalho e as diversas opções de área de atuação que me motivam”, revela a jovem, que chegou a cursar um semestre de Arquitetura em uma faculdade particular, mas acabou desistindo. “Não me adaptei, não tinha precisão para desenho”, diz, aos risos.
Para a professora Vivian Fernandes, o mercado de trabalho de Engenharia de Agrimensura está aquecido, sobretudo no campo das tecnologias digitais. “Principalmente com o surgimento recente de novas ferramentas, como as tecnologias de Sistema de Posicionamento Global (GPS) e a popularização de sistemas como o Google Earth”, analisa Fernandes. A professora enumera entre as atividades possíveis do profissional o levantamento e interpretação de imagens de satélite e programação e desenvolvimento de novos aplicativos, através de estreita ligação com a área de Engenharia de Software.
A nova graduação da Ufba foi criada no final do ano passado por meio de estímulo do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). “Já contemplávamos todas as áreas reconhecidas pelo Crea-BA [Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia da Bahia], mas ainda não tínhamos nenhuma formação nessa parte de levantamento e medições”, explica a coordenadora Vivian Fernandes. Até então, apenas a Escola de Engenharia Eletro-Mecânica da Bahia (EEEMBA) oferecia o curso superior em Engenharia de Agrimensura em Salvador. No total, são apenas dez cursos de graduação na área reconhecidos pela Federação Nacional dos Engenheiros Agrimensores (Fenea)
Tradicionais – Além da ênfase no campo das tecnologias digitais, a graduação também capacita o estudante nas demais áreas da Engenharia de Agrimensura, como geodésia, cartografia, fotogrametria, astronomia, sensoriamento remoto e topografia. “Toda obra precisa de um planejamento do terreno, com levantamento de dados sobre toda a área, seja para construção de estradas, obras hidráulicas, sistemas de saneamento e irrigação, além de edificações e definição de loteamentos imobiliários”, detalha Fernandes. Neste sentido, é função do engenheiro agrimensor descrever a área de realização da obra, definir o posicionamento de sua implantação e monitorar sua dinâmica.
Por sua vez, a Engenharia Cartográfica se ocupa da representação e reprodução de mapas e demais documentos cartográficos, incluindo as etapas de aquisição, processamento e análise das informações geográficas e topográficas. “É outra vantagem do curso, são duas formações em uma”, avalia Nicole, que já atua com pesquisas relacionadas a imagens de satélite e de GPS no Laboratório de Geomensura Theodoro Sampaio, no Departamento de Transportes da Escola Politécnica da Ufba. A jovem pretende se especializar na área de Metereologia, mas descarta a possibilidade de seguir carreira acadêmica.
Mercado – Para o coordenador da Câmara de Engenharia de Agrimensura do Crea-BA, Pedro Cardoso, o mercado de trabalho na área é amplo e o número reduzido de instituições de ensino que oferecem graduação em Engenharia de Agrimensura contribui para que os formandos sejam logo requisitados. “No Norte e Nordeste do País, são apenas quatro cursos de graduação em Engenharia de Agrimensura. Hoje é difícil encontrar um profissional maduro que não esteja bastante atribulado”, avalia. Além das obras de infraestrutura que vêm sendo realizadas no País, Cardoso aponta que muitas empresas brasileiras têm levado profissionais para projetos no exterior, em países como Angola e Iraque.
A informação ganha reforço da professora Vivian Fernandes. “Um projeto grande de mapeamento está sendo realizado aqui na Bahia e foi necessário chamar profissionais de outros lugares do Brasil”, revela. O levantamento realizado pela Ufba para elaboração das diretrizes do curso indica que empresas estatais vêm abrindo vagas para engenheiros agrimensores e cartográficos em editais de concursos públicos, algumas vezes sem candidatos. O déficit atinge também a área acadêmica. “Tivemos uma vaga para professor com doutorado que não foi preenchida por falta de candidato qualificado”, conta Vivian Fernandes.
Autor: A Tarde