Brasília: a epopéia da construção

A primeira pista 

O engenheiro Atahualpa Shimtz Prego chegou ao planalto central no final de outubro de 1956, poucos dias após a primeira visita de Kubitschek ao local, como engenheiro responsável pela construção da pista do aeroporto internacional.

“Em 16 de outubro de 1956, a Companhia Metropolitana de Construção [especializada em obras de terraplenagem e pavimentação, com sede no Rio de Janeiro] me contou que o governo federal tinha convocado a firma para um importante serviço em uma área inóspita e distante do litoral e queriam saber se eu me interessava no trabalho”, contou. “Dois antigos engenheiros da firma já haviam recusado a proposta. Falei: Temos que ir amanhã, porque depois de amanhã eu já desisto.

Havia apenas uma pista de terra batida no Aeroporto de Vera Cruz, onde se localiza, atualmente, a Estação Rodoferroviária de Brasília e uma pequena pista de pouso na Fazenda do Gama. “A viagem de carro entre Anápolis e Brasília [140 km], por exemplo, podia durar até 30 horas”, conta. Ao ver Brasília atualmente, Prego relembra o cenário há 54 anos. “O que hoje é o Eixo Rodoviário tinha um monte de boi. Tinha perdiz e codorna”, destacou. “A gente olhava para um lado, olhava para o outro e era tudo igual”, avaliou.

Os trabalhadores não sabiam se podiam mesmo acreditar na promessa da capital. “A gente não acreditava nisso, eu sentia que a turma estava desconfiada. Achávamos que ao terminarmos a obra, iriam abandoná-la”, recorda. Em 1968, no entanto, o jovem engenheiro teve que deixar a cidade. ”Gostaria muito de ter continuado aqui. Eu acho fantástico ter participado da construção da capital”, diz.

Batismo espiritual

Para celebrar simbolicamente o início das obras, o presidente JK convidou a população para uma missa campal na cidade. Em três de maio de 1957, cerca de 1,5 mil pessoas ouviam as bênçãos proferidas por dom Carlos Carmelo de Vasconcelos. “Este é o batismo espiritual da construção da nova Capital do Brasil”, disse JK após as palavras do sacerdote.

O jornalista Adirson Vanconcelos tinha chegado à cidade pela primeira vez naquele dia, aos 18 anos, para fazer a cobertura da missa para o jornal Correio do Povo de Recife (PE). “Fiquei muito entusiasmado. Empolguei com o que não existia, com o nada. Como que aquilo viria a ser a capital”, afirma Vasconcelos. “Aqui só tinha um céu e sol lindo. E o horizonte…” No final de 1957, Vasconcelos mudou-se para a cidade para mandar notícias sobre o andamento das obras. “Era uma dificuldade mandar essas notícias, eu tinha que enviá-las por telégrafo.”

O clima de cordialidade entre os pioneiros ficou guardado nas lembranças do jornalista. “Todo mundo tinha o mesmo objetivo: o desafio de entregar a capital em 1960. Todo mundo fazia seu trabalho devido ao idealismo de cumprir essa meta. As pessoas eram muito solidárias umas com as outras. Elas tinham fé e ânimo. Íamos andando sem fazer previsões do futuro”, destaca .
Vasconcelos já escreveu cerca de 30 livros relacionados a Brasília e acredita ter sido um “escolhido”. “Nós, pioneiros, fomos vocacionados e predestinados por Deus,” disse.

Primeira turna de candanguinhos

Natanry Osório foi responsável por alfabetizar a primeira turma de candanginhos (como eram conhecidos os filhos dos pioneiros que vieram para Brasília durante a sua construção, chamados de candangos). Em 1959, ela era uma das poucas mulheres na cidade. “Como quase não tinha mulher naquela época, os homens viam a gente andando na rua e viravam para olhar”, conta.

A professora é casada com Carlos Antônio Osório, primeiro advogado a montar um escritório na Cidade Livre, atual Núcleo Bandeirante. Natanry era professora provisória, mas teve seu contrato definitivo assinado no dia da inauguração da nova Capital, em 21 de abril de 1960. “Eu nem lembrava mais disso. Acho que eu já estava predestinada a viver aqui. Confesso que me emocionei ao ver o contrato assinado com a data da inauguração”, disse Natanry.

Natanry não tem dúvidas sobre a importância das pioneiras na história da cidade. “Eram verdadeiras guerreiras, altruístas, apaixonadas. A maioria dos políticos não teve as companheiras ao lado. Até meu marido me pediu para ficar em Goiânia, mas eu recusei. Era algo histórico, momento único e eu queria participar.”

“Juscelino nos passava uma grande certeza e um entusiasmo. Apesar de não termos um contato direto com o presidente. O importante é que todos tinham esse espírito. É claro que existiam dificuldades, mas o sentimento de esperança era tão grande que a gente não se incomodava com os problemas” contou a professora Natanry.


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Autor: G1 e You Tube