TAV movimenta a infraestrutura do País

A participação de empresas brasileiras na construção e operação do trem de alta velocidade (TAV), que vai ligar Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro, está movimentando o setor de infraestrutura do País, mas a adesão aos consórcios internacionais ainda é uma informação estratégica de cada empresa e, por isso, mantida sob sigilo. 

Até agora, apenas o Grupo Bertin declarou adesão ao TAV, associando-se aos sul-coreanos. Empresas como a Odebrecht e a Andrade Gutierrez — que integram o consórcio português vencedor, no final do ano passado, da licitação para construir o primeiro TAV de Portugal —, além da Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR) e da Fundação dos Economiários Federais (Funcef), manifestaram intenção em disputar a licitação, mas sem definir ainda em qual grupo. 

A indústria ferroviária brasileira está negociando a participação direta na produção de itens ferroviários do TAV, mirando uma substancial injeção de receita em seu orçamento anual. “Podemos ter R$ 4,2 bilhões de receitas potencialmente feitas no Brasil, em quatro ou cinco anos, se tivermos 60% de conteúdo nacional na fabricação dos itens ferroviários”, afirmou o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate. 

A associação também não tem informações sobre as negociações, por ser assunto estratégico de cada empresa. “Nós estamos atuando na defesa de um índice de 60% de nacionalização porque a indústria ferroviária brasileira possui capacidade instalada para atender a fabricação do TAV e um corpo técnico altamente especializado”, afirmou Abate. “O TAV irá gerar para a indústria uma receita adicional importantíssima. É um grande projeto para o setor.” 

Com um custo de implantação estimado em R$ 36,4 bilhões, o TAV vai consumir 71% em obras civis, o que leva as grandes empresas da construção civil a buscar parceiros internacionais para a empreitada. “Está todo mundo conversando com todo mundo, mas a conversa só vai ter resultado depois que o edital de licitação for publicado”, disse o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e presidente do Grupo Advento Engenharia e Infraestrutura, Juan Quirós. 

O problema, segundo Quirós, é que o governo exige que quem construir o TAV também se encarregue da operação, atribuição que as construtoras brasileiras não desejam. “As empresas estrangeiras que fabricam o trem têm interesse em fornecer equipamentos e na gestão, mas com alguma empresa nacional”, afirmou. Ele disse que as empresas da região precisarão se aliar aos prefeitos para a necessária pressão política que leve o consórcio vencedor a contratar empresas locais para fornecimento de máquinas, tecnologia, materiais e mão de obra nos contratos globais. “As empresas locais têm que ter prioridade de fornecimento”, disse.
R$ 20,8 bilhões 

Quirós identificou que o TAV irá requerer investimentos de R$ 20,8 bilhões na região em construção civil, especialmente em empreendimentos hoteleiros, imobiliários e de estrutura para atender os passageiros e também em infraestrutura das cidades, para criar acessos do consumidor ao TAV, onde entram investimentos em estradas, logística, saneamento básico e formação de mão de obra. 

“Estamos conversando muito com empresas brasileiras, negociando a participação, mas os consórcios só serão formados de fato quando for publicado o edital de licitação. Só aí saberemos se o governo estará disposto a compartilhar os riscos de demanda e os cambiais e quais empresas brasileiras serão nossas parceiras”, afirmou o diretor-presidente da Asian Trade Link (ATL), Marco Polo Moreira Leite, que assessora o consórcio chinês no projeto do TAV. 

Os chineses decidiram entrar na licitação depois de terem ganho contratos para fornecer veículos à Supervia, concessionária de trens urbanos da região metropolitana do Rio, e novos carros de passageiros para o metrô do Rio de Janeiro. 

Os espanhóis também não informam como está a montagem do consórcio. Chegaram a anunciar que disputariam a licitação com dois grupos, um liderado pela fabricante de trens Talgo e mais seis empresas de construção civil, sinalização, eletrificação e consultoria. O outro, formado pela Siemens espanhola, a OHL (construtora e concessionária de rodovias atuante no Brasil), o banco Santander e outros três grupos de sinalização e sistemas elétricos. Mas estão fundindo os dois grupos e negociando a participação de empresas brasileiras. 

O diretor da Ineco no Brasil, empresa espanhola especializada em estudos e projetos de transportes e telecomunicações, José Batlles, informa apenas que há conversações com várias empresas, mas não diz com quais. “Assim que sair a licitação, as conversas ganharão mais substância”, disse.
Europeus mantêm silêncio sobre negócios 

A França não abre com quem negocia no Brasil. O consórcio é liderado pela Alstom, fabricante do TGV e a Société Nacionale des Chemins de Fer Français (SNC), operadora dos trens de alta velocidade franceses. Mas deverá ter também a presença de bancos como o PNB Paribas e o Société Générale, além da Agência Francesa de Desenvolvimento, que estiveram no Brasil no final do ano passado para conhecer de perto o projeto nacional. A Alemanha chega na disputa sob a liderança da Siemens, mas não divulga como está a montagem do consórcio. Em outros projetos, a Siemens contou com a parceria de outras empresas alemãs, como a MAN Ferrostaal, a ThyssenKrupp, a SKF e a Hochtief. Já a Itália montou um grupo para disputar a licitação com a Ferrovie dello Stato (FS) Enzo Marzili, a empreiteira Impregilo, controladora da Ecovias no Brasil e concessionária das rodovias Ayrton Senna e dos Imigrantes, entre outras; e pelas duas Ansaldos, a AnsaldoSTS, de sinalização, que está reformando a sinalização do metrô de São Paulo, e a Ansaldo Breda, que está fornecendo 12 trens para o Metrô de Fortaleza (Metrofor). 

Asiáticos já iniciaram as conversas 

Sul-coreanos e japoneses estão animados e têm boas relações no Brasil
Os sul-coreanos, que se associaram ao Grupo Bertin — que atua na área de infraestrutura por meio da construtora Contern —, têm um consórcio com 32 empresas — entre elas Samsung, Hyundai, GS, Daewoo e SK — e continuam conversando com mais grupos brasileiros. De acordo com Selma Strublic, da Trends Engenharia, que atua como coordenadora local do projeto do trem-bala, o grupo está bastante animado. “Montamos um escritório independente, temos feito várias reuniões com o governo e empresários”, afirmou. 

Os sul-coreanos devem apresentar uma nova proposta de traçado, mais barata, e unir o investimento à exploração imobiliária nas regiões das estações do TAV. Os empreendimentos ao longo da linha incluiriam um misto de comércio, residências e shoppings. “Esse modelo de negócio garante o retorno econômico do trem caso a demanda de passageiros não atinja as expectativas”, disse Paulo Benettis, diretor da Trends. 

Os japoneses, primeiros a implantar o TAV no mundo, também estão conversando. Um executivo de uma das empresas que integram o consórcio disse que nos próximos dias — na verdade, o grupo irá esperar a divulgação do edital de licitação, ainda sem data definida — irá anunciar a adesão de uma grande empreiteira brasileira. Hoje, estão no grupo a Mitsubishi (que ficaria com a gestão do TAV caso os japoneses vençam a licitação), a Toshiba (com a alimentação elétrica do sistema), a Hitachi (que construiria o material rodante) e a Mitsui (papel comercial e financeiro).

Autor: Correio Popular