País precisa investir no isolamento de panes elétricas, dizem engenheiros

Sistema de energia no país é interligado e suscetível a falhas, afirmam.
Isolamento já existe, mas pode ter falhado no apagão, diz Eletrobrás 

Embora seja apontada como a melhor opção para o país, a interligação do sistema elétrico nacional é sujeita a falhas, na avaliação de engenheiros e físicos ouvidos pelo G1. Para que o sistema funcione melhor, apontam os especialistas, o governo precisa incrementar a capacidade do sistema de isolar áreas que apresentem problemas, e assim evitar com que uma falha pequena acabe tomando grandes proporções.

Na terça-feira (10), um blecaute deixou 18 estados brasileiros sem luz após uma falha nas linhas de transmissão da usina de Itaipu para Itaberá (SP). De acordo com o governo, 40% dos consumidores do país ficaram sem energia elétrica. Foi o maior apagão dos últimos 10 anos – em 1999, um blecaute deixou 10 estados no escuro.

Na quarta (11), o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, atribuiu o incidente a fenômenos naturais, como raios, chuva e vento. No mesmo dia, o presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz, levantou a possibilidade de ter ocorrido falha no isolamento do problema.

“Deveria ter acontecido o ilhamento do problema para possibilitar o religamento do sistema. Mas como isso não aconteceu, aí o problema se estendeu para as duas linhas de corrente contínua que liga Itaipu a São Paulo. O que é preciso levantar é porque não entrou em operação o sistema chamado Erat, que existe exatamente para levar ao ilhamento”, disse Muniz de acordo com a Agência Brasil.

Na avaliação do diretor de energia do Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo (Seesp), Carlos Augusto Ramos Kirchner, engenheiro aposentado da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e ex-funcionário da TermoRio, a interligação é positiva porque as desvantagens podem ser “tecnologicamente superadas”.

“A desvantagem, que é a propagação do problema, pode ser tecnologicamente superada. Até porque a questão da inteligência dos sistemas vai sempre se superando. Já houve avanços em relação ao ilhamento, para provocar miniapagões em vez de prejudicar o sistema todo”, afirma Kirchner, que defende o investimento constante na modernização do isolamento de panes no sistema elétrico.

Segundo Kirchner, o sistema de ilhamento inibe a propagação da sobrecarga. “São equipamentos inteligentes que percebem quando tem sobrecarga e geram apagões locais para evitar propagação. (…) É inteligência de computador que detecta o problema antes que aconteça.”

O engenheiro afirmou que a explicação do governo para o blecaute da última terça é “genérica” e que ainda há muito para ser informado sobre o ocorrido. “Ainda tem muita coisa para ser entendida nessa questão. A gente fica na tentação de chutar para descobrir as causas, mas temos que aguardar, porque o governo é quem dispõe dos dados.”

Em 1999, Kirchner atuou em uma comissão do Conselho Regional de Engenharia do estado de São Paulo (CREA-SP) que investigou as causas do apagão que atingiu dez estados. Segundo ele, os engenheiros identificaram que um raio atingiu um cabo a 90 km da subestação de Bauru, e o equipamento de para-raio não conteve a sobretensão, o que causou curto-circuito no local e derrubou a energia em efeito cascata. Para o engenheiro, algo parecido pode ter ocorrido na terça. “Ali, parece que o problema foi na subestação.”

O diretor do Seesp defende que o governo realize uma “análise séria” para verificar se Itaberá é um ponto “nevrálgico” do sistema de energia e realize reformas, se necessário.

O professor Carlos Alberto de Castro Júnior, do Departamento de Sistemas de Energia Elétrica da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), avalia que o sistema integrado de energia “é mundialmente aceito” e tem mais benefícios do que desvantagens. 

Alto custo

Para o engenheiro, porém, a segurança do sistema de isolamento das panes depende de investimentos, o que pode encarecer o produto final: a energia elétrica.

“Quando se deseja que um sistema elétrico de potência funcione de maneira segura, tem que realizar investimentos nessa rede que não são realistas. Quanto mais investe, mais cara fica a operação. Existe um dilema entre a segurança e a economia.”

Castro Júnior considera ainda “inevitáveis” incidentes como o registrado na terça. “Locais ou de maior intensidade, isso é inevitável. Sempre vai acontecer e um fator importante é saber lidar com essas ocorrências.”

O professor afirmou que não poderia comentar se uma falha no sistema de ilhamento do problema colaborou para o apagão.

Na quarta, em entrevista ao “Bom Dia Brasil”, da TV Globo, o físico Luiz Pinguelli Rosa, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), disse que o sistema de interligação é “necessário”, mas que precisa de “gestão melhor”.

“O sistema de interligação é necessário em um país que usa muitas hidrelétricas, mas precisa ter uma gestão melhor”, disse. “Não tivemos problema de energia, nós temos água, temos hidrelétricas disponíveis e o combustível para elas. O que tivemos foi um problema elétrico.”

Procurado pelo G1, o Ministério de Minas e Energia não quis comentar sobre eventuais falhas no isolamento de problemas na rede elétrica. O G1 também pediu informações ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), mas não obteve resposta.

Autor: G1