Em março próximo, se a bola for mesmo nossa, a FIFA (Federação Internacional de Futebol) decidirá quais serão as doze cidades, dentre as 18 candidatas, que receberão os jogos da Copa do Mundo 2014, e também quais abrigarão as cerimônias de abertura e encerramento. Das 18 cidades que se candidataram ao posto, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo se destacam das demais. Mas isso não significa dizer que essas cidades não possuam problemas graves de infraestrutura urbana e de turismo necessária para receber os 800 mil visitantes estrangeiros esperados.
Se conseguir se preparar adequadamente, o Brasil tem uma grande oportunidade não só de fazer bonito num evento midiático que deve atingir 40 bilhões de telespectadores (estimativa que leva em conta o número de vezes que a mesma pessoa assistirá a diversos jogos), como também de se modernizar e se desenvolver. Caso contrário, perderá o que deve ser a sua melhor oportunidade do século. Quem afirma é o presidente do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva), José Roberto Bernasconi, que conversou com o Portal Obra24horas sobre os desafios que o país terá de enfrentar para a Copa do Mundo de 2014.
Portal Obra24horas: O maior desafio para o país hoje diz respeito a infraestrutura das 18 cidades candidatas a sediar os jogos da Copa de 2014. Qual a situação atual dessas cidades?
José Roberto Bernasconi: Assim como não possuímos nenhum estádio de futebol preparado para sediar os jogos da Copa do Mundo, nenhuma das cidades candidatas possui infraestrutura adequada para hospedar a quantidade de turistas esperados. A expectativa é que o país deva receber mais de 800 mil visitantes estrangeiros, cerca de 25 mil profissionais só de mídia, sem contar os próprios brasileiros que viajarão acompanhando a seleção brasileira nos jogos disputados.
Todas as cidades já possuem planejamentos, mas é preciso estabelecer prioridades. De fato muita coisa precisa ser melhorada como, por exemplo, a capacidade e a qualidade de infraestrutura de portos, aeroportos, mobilidade urbana, acesso ao parque hoteleiro, lazer, gastronomia, energia, telecomunicações, hospitais, saneamento básico e segurança. Tudo isso deve ser muito bem pensado para que possamos mostrar ao mundo o que Brasil possui de melhor. Será um grande desafio, mas também a melhor oportunidade do século para melhorar nossas cidades nos prepararmos para atrairmos visitantes do mundo inteiro.
Portal Obra24horas: Por que a Copa de 2014 é uma grande oportunidade para o Brasil?
José Roberto Bernasconi: A Copa do Mundo é o maior evento do planeta. Não há nada que se compare a isso. No último mundial, realizado na Alemanha, 3,4 milhões de pessoas assistiram aos 64 jogos nos estádios. Além disso, a FIFA criou o FunFest, que eram lugares públicos, com um certo conforto, infraestrutura e segurança, com telão, nos quais assistiram mais 18 milhões. Pela TV, foram quase 27 bilhões em 214 países.
Podemos até fazer uma brincadeira: se o número de países-membros fosse um critério de classificação de organizações, a FIFA seria mais representativa que a ONU (Organização das Nações Unidas), porque são 205 contra 191. Futebol não é simplesmente um esporte ou uma brincadeira, mas um grande negócio.
É um evento de mídia e a FIFA fatura, especialmente pelos tempos de televisão. Em função disso, o País que sedia uma Copa tem a oportunidade de se mostrar ao mundo, apresentando sua cultura, culinária, pontos turísticos, etc. Essa exposição mundial não pode ser desperdiçada, mas é preciso planejarmos melhor, para que possamos colher os frutos depois.
Portal Obra24horas: O Brasil corre algum risco de não conseguir sediar a Copa do Mundo?
José Roberto Bernasconi: Não. A Copa de 2014 será mesmo no Brasil independente de qualquer coisa e será um sucesso mesmo que muitos dos projetos não sejam concretizados.
Portal Obra24horas: De que forma a crise financeira mundial tem repercutido na organização do evento?
José Roberto Bernasconi: A crise gerou desconfiança no setor financeiro de todo o mundo. O crédito evaporou-se e deverá ficar bem mais difícil para os clubes – que estão projetando arenas super modernas – conseguir os financiamentos, no Brasil ou no exterior, para sua construção. Em outros países não têm sido diferente.
A Inglaterra, por exemplo, já enfrenta dificuldade para conseguir investimento para a Olimpíada que sediará em 2012, o que pode levar à nacionalização de parte do Parque Olímpico, como a Vila Olímpica e o centro de imprensa. As obras custariam ao contribuinte britânico quase 900 milhões de libras extras (cerca de 3,2 bilhões de reais).
No Brasil, seguindo as exigências da FIFA, são estimados investimentos totais no montante de R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões, sendo que os estádios e arenas multiuso demandarão entre 10 e 15% do total a ser investido. Como parece improvável uma solução positiva para a crise financeira num curto prazo, os recursos para investimentos não estarão disponíveis da forma como estavam em agosto de 2008, quando sobrava dinheiro no país.
Portal Obra24horas: O senhor tem mencionado sempre um “Plano B” para driblar os efeitos da crise. Do que se trata esse plano?
José Roberto Bernasconi: O Plano B é uma carta na manga que o país precisa ter caso não consiga viabilizar com investimentos privados todas as reformas e construção de estádios novos. Mesmo em épocas de escassez e crise, as oportunidades nunca deixarão de existir, mas somente os que se preparam melhor conseguem sair na frente e aproveitá-las.
A conquista de investidores, nacionais e internacionais, cada vez mais ariscos e desconfiados, exige projetos bem elaborados, de elevada qualidade, que confirmem a seriedade e viabilidade técnica e econômica dos empreendimentos.
O planejamento das arenas e da infraestrutura requerida para as cidades-sedes passa necessariamente pela contratação de projetos com tempo adequado para sua elaboração, visando a qualidade das obras, a fim de que tanto os empreendimentos privados (arenas), como os públicos (infraestrutura) ofereçam garantias consistentes aos investidores de que apresentam elevada confiabilidade e taxas de retorno capazes de remunerar essas inversões de porte respeitável.
E se, mesmo assim, não conseguirmos atrair os investidores, teremos que fazer com o que temos disponível. Temos grana para isso tudo? Não, então uma parte vai ser com dinheiro público, outra, com iniciativa privada por meio de concessão, PPP (Parceria Público-Privada). Vamos fazer o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) da Copa, com as obras de infraestrutura essenciais. Tão importante quanto ganhar o caneco será o Brasil renovado de 2015. O legado que a Copa, pelas providências tomadas, deixará à sociedade brasileira.
Portal Obra24horas: Mas será que conseguiremos fazer tudo isso até 2014?
José Roberto Bernasconi: Já deveríamos estar fazendo e temos que começar logo. Claro que o dinheiro está curto hoje, mas ele vem com bons projetos. Pensando-se no PAC, que é um pacote de R$ 504 bilhões, é uma escala que o Brasil pode praticar. Não são os recursos que limitam as decisões, mas as decisões que limitam os recursos. Se a gente tomar a boa decisão, vai buscar recursos, inventa e barateia.
Portal Obra24horas: Conseguir o dinheiro então pode ser mais fácil do que projetar e executar as obras?
José Roberto Bernasconi: Sim, e não é simplesmente sair construindo, o dinheiro tem que ter retorno. Não podemos fazer o que fizemos nos Jogos Pan-Americanos, que tivemos orçamento de menos de R$ 500 milhões e acabaram custando R$ 4 bilhões.
Se a competência, a seriedade e a responsabilidade dos brasileiros entrarem em campo, nós teremos o desafio resolvido. Se não, a coisa vai ficar feia para nós. Essa é a melhor oportunidade do século para o Brasil, será difícil passar outro burrico tão bem arriado.
Autor: Obras 24 horas