Todos aqueles que dirigem automóvel na cidade de São Paulo vem se defrontando com contínuos aumentos de congestionamentos e de tempos de viagem em seus deslocamentos. Provavelmente esses motoristas já terão se perguntado: “por que isso está ocorrendo”? e “o que dá prá fazer para resolver esse problema”?
A resposta à primeira pergunta é curta: décadas de omissão e descaso da sociedade e dos governantes, com o planejamento urbano e suas interfaces com o transporte e o trânsito.
Assim, São Paulo transformou-se na cidade “onde se ganha dinheiro, mas não se vive”. A cidade do vale-tudo, onde o aeroporto de Congonhas é o exemplo mais emblemático.
O automóvel tornou-se um bem de consumo durável acessível à grande parcela da população. Taxas de motorização (número de autos por habitante) aproximaram-se das dos países desenvolvidos, sem dispor dos mesmos serviços e infra-estrutura. A mudança da estrutura econômica da cidade (de industrial para serviços) e do mercado de trabalho (com terceirização e informalidade) engendrou uma multiplicidade de locais de interesse e a necessidade de um maior número de deslocamentos, em grande parte viabilizados pelo automóvel, dada a precariedade dos serviços de transporte público, com exceção do metrô.
Esta é a cidade que construímos. Apesar da sua grandeza, vantagens e facilidades, transforma-se, a cada dia que passa, num ambiente mais conturbado e hostil.
Quanto à segunda pergunta: e “o que dá prá fazer para resolver este problema”?
No curto prazo, muito pouco. As alternativas disponíveis são restritas e amargas: ampliar o rodízio municipal de veículos para o dia inteiro (ao invés das atuais 6 horas) ou, ainda mais drástico, ampliar de dois para quatro os finais de placa proibidos de circular num dia útil.
Há, ainda, o pedágio urbano (pagar para circular em determinada área da cidade em determinado horário). Trata-se de mais uma alternativa de alcance limitado, dado que impacta menos aos usuários de maior renda, que são aqueles que realizam maior número de deslocamentos.
Não há dúvida que a melhor opção possível para a cidade é o investimento contínuo e crescente no desenvolvimento do transporte público.
Nos últimos dez anos, o Governo do Estado e mais recentemente a Prefeitura do Município passaram a investir consistentemente no setor, tendo, através do Bilhete Único, ampliado o acesso das pessoas aos serviços e criado um sistema intermodal verdadeiramente integrado. A construção da Linha 4 do Metrô e expansão das Linhas 2 e 5, a reforma e modernização do sistema de trens da CPTM e a implantação de novos corredores estruturais da EMTU e SPTRANS farão sentir seus efeitos nos próximos anos, provavelmente após 2010, permitindo que as condições de circulação na cidade deixem de deteriorar-se e, eventualmente, melhorem.
Isso, no entanto, por sí só não será suficiente. Há que, antes de tudo, mudar comportamentos. Não é possível continuar a queimar combustíveis (escassos e caros) em infindáveis congestionamentos e ainda emitir toneladas de poluentes nem ter 1,2 ocupante por automóvel em circulação na cidade ou construir grandes equipamentos urbanos (estádios, universidades, hipermercados) que não sejam acessíveis por transporte público.
É necessário “domesticar” o uso do automóvel e seu usuário. É necessário que as pessoas se convençam ou sejam convencidas a trocar o automóvel pelo transporte público de qualidade e que assim possam contribuir, diretamente, para a construção de um novo projeto de cidade.
Jaime Waisman é professor da Escola Politécnica da USP e diretor da Sistran Engenharia.
Autor: Jaime Waisman