O efeito mais nefasto das décadas de crises intermitentes e dos esforços para recomposição das contas públicas, foi a transformação do Brasil em uma nação de pensamento tacanho e monocromático, voltada apenas à produção de resultados financeiros e superávits primários para saldar seus compromissos.
O foco (ou melhor, a sanha) na arrecadação de recursos tornou-se a única competência pública brasileira levada a excelência. Nosso país constrói hoje, verdadeiras máquinas de criação, instituição e cobrança de taxas, tarifas, empréstimos compulsórios, contribuições e impostos com eficiência inversamente proporcional à sua capacidade de gestão do dinheiro arrecadado.
O governo brasileiro, preocupado exclusivamente com os impostos não recolhidos pelos produtos que atravessam a Ponte da Amizade em Foz do Iguaçu, legaliza o contrabando, organizando um mecanismo de apuração e cobrança eletrônica de impostos digna de países de primeiro mundo. Por outro lado, ignora o consumidor, atravessa a legislação, abandona suas normas e padrões de produção e segurança, entregando à sociedade a tarefa de se proteger do risco oferecido pelos produtos de qualidade “alternativa”, agora legalizada.
Esta situação absurda repete-se na engenharia, expondo a sociedade a um risco ainda maior. Pois a fiscalização do recolhimento de tributos parece ter se tornado a maior função das autarquias, em detrimento da segurança dos cidadãos, que se vêem à mercê de situações como a não observação de normas técnicas, a prática ilegal da profissão ou a má formação profissional.
Um engenheiro trava hoje uma batalha quase perdida em seu exercício profissional. Com custos crescentes para sua atualização constante, honorários ou salários decrescentes pela concorrência predatória e a falta de representação institucional pela fragmentação das associações e sindicatos. Em resumo, se ganha pouco, se gasta muito e não se recebe sequer a contra partida devida em serviços públicos.
Há pouco foi anunciado o subsídio dado pelo CREA à ABNT, como uma iniciativa para reduzir o custo atual de aquisição do mais fundamental instrumento de trabalho do engenheiro, a Norma Técnica. Mas como é possível um país sequer aventar a possibilidade de desenvolvimento econômico, se a aplicação de normas técnicas depende da capacidade de investimento pessoal do profissional ou da empresa?
O financiamento da ABNT pela venda de Normas Técnicas é mais uma aberração brasileira. Seu subsídio (esmola, na verdade) pelo CREA é uma afronta à sociedade e aos engenheiros e arquitetos, cujo acesso gratuito e permanente às suas Normas Técnicas deveria ser custeado integralmente pelo governo e não objeto de pirataria e comércio ilegal na internet.
É preciso voltar a enxergar a engenharia brasileira com a seriedade que merece, como ferramenta para o desenvolvimento econômico, como ciência produtora de conhecimento, como motor da inovação tecnológica.
Não apenas como uma vaca leiteira sustentando um estado gordo, pesado e ineficiente.
Autor: Edemar de Souza Amorim