O “imbróglio” em que se transformou o licenciamento ambiental das hidroelétricas do Rio Madeira tem mais a ver com a desarticulação generalizada da administração federal do que, propriamente, com as dificuldades técnicas reais.
Não existe a menor dúvida que a expansão necessária do sistema gerador de eletricidade no país precisa ser feita, prioritariamente, ao longo da rota hidroelétrica. Geração termoelétrica à carvão, gás natural e energia nuclear poderão complementar, mas muito dificilmente ocuparão um papel central no panorama elétrico do país. Elas ou são caras (por causa do custo do gás natural), muito poluentes (como carvão) ou problemáticas – por diversas razões – como as nucleares, que envolvem enriquecimento de urânio (cujo custo é minimizado pelo governo) e suas complicações com proliferação nuclear.
As hidroelétricas do Rio Madeira não são as únicas a serem consideradas porque existem cerca de 10 mil megawatts em usinas licenciadas em todo o Brasil (incluindo pequenas centrais) que estão semi-paralisadas ou atrasadas devido a problemas não ambientais. O governo deveria se esforçar mais para “destravá-las”.
Apesar disso, as hidroelétricas do Rio Madeira são viáveis e, a nosso ver, licenciáveis do ponto de vista ambiental e, isto já não ocorreu porque os empreendedores (Eletronorte, Eletrobrás e os empreiteiros) e o próprio Ibama não fizeram as “lições de casa”.
O projeto original que foi apresentado no Conselho Superior de Política Energética (no qual eu representava a sociedade civil) há vários anos, tinha muitos problemas, inclusive não se levando em conta, adequadamente, os custos das linhas de transmissão.
Ao que fui informado, o projeto melhorou, mas o Ibama se queixou, até recentemente, que o projeto não estava suficientemente bem instruído para permitir a apreciação do EIA/RIMA (Relatório de Impacto Ambiental). Em suma, era preciso mais trabalho e ele não foi feito em tempo hábil. A legislação ambiental é complicada e existem “fundamentalistas” no sistema licenciador. Não são órgãos públicos, em greves semi-permanentes, que podem resolver estes problemas. Por outro lado, empreendedores e os órgãos de planejamento (como a Empresa de Planejamento Energético) parecem não entender estas complicações e insistem em obter licenças rapidamente (ou construir sem licenças), como ocorria no passado.
Uma solução simplista proposta por Jeison Kellman, presidente da Aneel, é a de que o Ibama faça a análise ambiental, mas que a decisão final seja feita pelo Conselho de Defesa Nacional, órgão que assessora o presidente da República. Ela certamente vai provocar reações dos ambientalistas e para adotá-la seria preciso mudar a legislação ambiental que estabelece que o EIA/RIMA deve pautar a decisão final pesando inclusive os aspectos positivos e negativos dos empreendimentos (não só os ambientais como também os sociais).
José Goldemberg, professor do Instituto de eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo, foi secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
Autor: José Goldemberg